quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Coringa (Joker)

"Coringa" (2019) dirigido por Todd Phillips (Cães de Guerra - 2016) é uma obra-prima desconfortável e perturbadora inspirada num dos mais icônicos personagens da cultura pop, o supervilão Coringa, mas a abordagem se afasta completamente do universo de heróis e vilões e nos introduz a um estudo de personagem visceral e extremamente decadente.
Gotham City, 1981. Em meio a uma onda de violência e uma greve dos lixeiros que deixou a cidade imunda, o candidato Thomas Wayne (Brett Cullen) promete limpar a cidade na campanha para ser o novo prefeito. É neste cenário que Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) trabalha como palhaço para uma agência de talentos, com uma agente social o acompanhando de perto, devido aos seus conhecidos problemas mentais. Após ser demitido, Fleck reage mal à gozação de três homens de Wall Street em pleno metrô. A atitude inicia um movimento popular contra a elite de Gotham City, da qual Thomas Wayne é seu maior representante.
Ambientado na década de 80 numa Gotham melancólica e suja acompanhamos a derrocada psíquica de Arthur, um homem que vive a miséria na sua forma mais cruel, desajustado lida com uma patologia, ele ri incontrolavelmente quando na verdade o que sente é o oposto, seu maior sonho é ser um comediante e delira assistindo o programa de seu ídolo Murray (Robert De Niro) juntamente de sua doente mãe, essa que o chama de "happy", Arthur se sente deslocado até em meio de seus companheiros de trabalho, nas ruas apanha e é humilhado por conta de sua aparência frágil e sua condição que não é devidamente assistida, é sempre tratado com apatia ou descaso e quando os medicamentos e a assistência são cortadas por falta de verbas tudo começa a desmoronar de vez tanto dentro de si como externamente.
A narrativa se entrelaça brilhantemente entre a realidade e os delírios de Arthur, se mistura de forma harmoniosa e ao mesmo tempo chocante. O sofrimento gradual o transforma, é uma série de ações e tristezas que o levam a se tornar nesta figura que vê na violência uma saída, todas as vulnerabilidades e fragilidades se convertem em perversidades e desejo de caos. Impressionante, densa e primorosa a entrega de Joaquin Phoenix, não há um segundo sequer que ele não provoque desconforto com suas nuances e camadas expostas em cena, como sua sinistra e constrangedora risada compulsiva ou seus movimentos corporais elásticos, especialmente nas danças que sempre marcam momentos de mudanças.

"Você faz as mesmas perguntas todos os dias. ‘Como vai seu trabalho? Está tendo pensamentos negativos?’ Só o que eu tenho são pensamentos negativos."

O filme tem uma grande abertura para interpretações, atinge a cada um de uma maneira, particularmente senti muita tristeza, a melancolia que emana chegou tão forte em mim que não houve um instante da história que achasse graça, a dor e a humilhação constante de Arthur gera desespero e uma sensação de deslocamento com a própria existência, ele mesmo questionou durante toda a vida se realmente existia, são inúmeras frases pertinentes que ficam ecoando, como: "A pior parte de ter uma doença mental é que as pessoas esperam que você se comporte como se não a tivesse", por todo o tempo ele foi invisível, descartado e pisoteado pela sociedade e só é visto quando age pela violência, uma evidência clara do quão apático e doente se encontra o meio.

"Coringa" é um filme transgressor, sombrio, sério e conflituoso, retrata as pústulas da sociedade e a violência como meio para provocar e refletir, a sua forma pode gerar polêmicas, cabe a interpretação de cada um, mas é absolutamente uma obra marcante e belamente bem concebida. 

Um comentário:

  1. O filme é um grande e surpreendente acerto na carreira de Todd Phillips.

    A interpretação de Joaquin Phoenix é sensacional.

    Abraço

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