terça-feira, 23 de julho de 2019

Borgman

"Borgman" (2013) dirigido por Alex van Warmerdam (Schneider vs. Bax - 2015) é um filme que passeia pela surrealidade, pelo sobrenatural, pelo humor negro e pelo mistério, a abordagem dá abertura para várias leituras e a experiência é única a cada um. É um filme que incomoda e que gera agonia, pois disserta sobre o mal, sobre o decair do ser humano.
Certo dia, Camiel Borgman (Jan Bijvoet) anda pelas ruas de um tranquilo bairro burguês, e toca a campainha de uma das casas. Quem é este homem? O que ele quer? Aos poucos, Borgman consegue se introduzir nesta família, transformando para sempre a vida de todos.
No início acompanhamos um padre e mais alguns caçadores indo atrás de algo tido por eles como o mal, então vemos Borgman saindo de um esconderijo debaixo da terra da floresta, também mais outros dois são alertados e fogem, há uma frase bíblica mostrada anteriormente que é importante para entendermos um pouco o contexto: "E eles desceram sobre a terra para fortalecer suas fileiras". As perguntas sobre quem é esse homem martelam o tempo todo, dá a entender que ele é um sem-teto que vaga e de tempos em tempos para em algum local, mas então porquê estão caçando-o? Borgman bate numa porta e pede para que possa tomar um banho, mas é negado, ele vai seguindo observando as grandes mansões e escolhe uma toda branca e enorme, bate e faz o mesmo, também é negado, mas novamente tenta e Richard (Jeroen Perceval), o dono da casa, fica nervoso pela história que Borgman conta sobre sua mulher ter sido sua enfermeira, e pronto, a semente do mal foi plantada, Borgman é agredido e fica desacordado no quintal, Marina (Hadewych Minis) vai socorrê-lo e deixa-o ficar numa casinha aos fundos escondido do marido. Borgman é tratado como um rei, banho, roupão, comida e vinho da melhor qualidade, passa uma noite e ele diz que quer ficar mais alguns dias, quando Marina nega ele diz que é o mínimo já que foi espancado.
Borgman fica espreitando e passeia pela casa sem ser visto, os três filhos do casal o vê, mas nunca dizem nada, aliás uma parte interessante a se notar, as crianças são apáticas, uma questão que o filme aborda com eficácia é essa relação familiar fria e a ambição desmedida de Richard ao se importar somente com a sua ascensão na empresa. A família aparenta ser perfeita e sem maiores problemas, Marina passa os dias no mais completo tédio e de vez em quando pinta quadros, quem cuida das crianças é a babá, uma moça que acena para tudo que lhe dizem. Borgman entra nessa casa e começa desestruturá-la sem de fato tocar em nada, apenas a presença dele acende o mal que já havia dentro desse casal, mas não é tão simples captar as nuances dessa história, ela diz sobre o mal e sobre a pulsante hipocrisia da burguesia que se sente culpada pelo que possuem, mas também há seu lado sobrenatural, como podemos ver na imagem em que Borgman está sentado nu em cima das pernas de Marina enquanto ela dorme, ele parece vigiar ou influenciar os sonhos dela, uma clara referência ao demônio Íncubo. Borgman em dado momento decide deixar a casa, mas Marina não deixa, só que ele não quer ficar mais escondido e para isso articulam um meio para que entre pela porta da frente, o desenrolar é extremamente sinistro e violento. 

Borgman é admitido como jardineiro por Richard, que não o reconhece, ele fez a barba e cortou o cabelo, mais adiante chama seus amigos da floresta para ajudá-lo, há um plano macabro sendo colocado em prática, o casal está em extrema crise, as crianças relegadas aos cuidados da babá, tudo está desmoronando e Borgman aproveita para se infiltrar de um jeito sorrateiro com seus colegas e tanto as crianças como a babá são de certo modo protegidas desse meio, fazem um tipo de incisão cirúrgica em suas costas e bebem um liquido estranho, o jardim está um caos e as ações já não são controladas. Vale ressaltar que nenhum deles vibra ou se delicia com as atrocidades, há um ar melancólico e monótono, mas incrivelmente hipnotizante. Marina se apaixona por Borgman, ela não suporta mais o marido e então decide acabar com tudo. A entrada de Borgman alterou a rotina e deu início a essa onda, todos possuem tanto o bem como o mal dentro de si, dependendo das circunstâncias ora aparece um, ora o outro, em cena não há somente o maligno.

"Borgman" é um conto perturbador, intrigante e permeado por uma atmosfera sombria capaz de produzir reflexões diversas e garantir uma experiência memorável, é daqueles que é necessário revisões, pois certamente a cada assistida agregará mais e mais, a leitura que eu tive o outro pode não ter tido e quanto mais se pensa mais interpretações surgem. Filmaço indigesto que propõe mostrar o mal sem estereótipos e de maneira nada convencional.

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