terça-feira, 25 de setembro de 2018

Maktub

"Maktub" (2017) dirigido por Oded Raz é uma comédia israelense que mescla momentos afetuosos e violentos, é um olhar leve sobre os costumes e brinca com estereótipos, como religião e terrorismo, a dupla de protagonistas esbanja carisma e é impossível não se encantar com o desenrolar da história, que apesar de ter ações violentas e maneiras de se agir duvidosas o que prevalece ao fim é o sentimento de amizade e lealdade.
A palavra título dá alma ao filme, Maktub, que significa "já estava escrito", toda vez que um contratempo aparece tem significação de que tudo já estava predeterminado pelo destino, e daí por diante as escolhas precisam ser mais cuidadas. O peixe que cai de uma janela que é considerado má sorte é seguido logo após por um ato terrorista no restaurante, que é encarado como um aviso de que precisam mudar suas vidas. Steve (Hanan Savyon) e Chuma (Guy Amir), dois criminosos, são os únicos sobreviventes de um ataque terrorista em um restaurante em Jerusalém. Esse acontecimento inspirou neles uma mudança de vida, decidindo ajudar o próximo. Eles passam a realizar os pedidos deixados entre as pedras do Muro das Lamentações.
Steve e Chuma são capangas de um mafioso em Jerusalém, que cobram dívidas dos comerciantes de restaurante enquanto degustam e opinam sobre o cardápio, são praticamente especialistas nas mais diversas receitas e dizem com o quê e como devem ser servidos os pratos, um dia uma bomba explode destruindo o restaurante onde almoçavam, apenas os dois sobrevivem porquê estavam no banheiro no momento, quando saem se chocam e fogem com a mala cheia de dinheiro destinada ao chefe. Claro que falam que o dinheiro não estava com eles e sim com o estrangeiro que presta serviço também ao mafioso, Steve diz que não querem mais trabalhar devido o trauma, mas o chefe apenas diz para tirarem umas férias, ao mesmo tempo em que o chefe procura o estrangeiro com a mala de dinheiro, Steve e Chuma decidem mudar de vida e vão até o Muro das Lamentações, local sagrado em que as pessoas depositam seus pedidos, por um acaso Steve retira um papel do muro para escrever algo para Chuma, que ficou surdo após o ataque e, de repente, se veem ajudando as pessoas, retirando os papeizinhos do muro e realizando seus desejos a fim de agradecer o milagre de sobreviverem.

Os personagens são imensamente cativantes, principalmente Chuma que possui afeto pelo filho de Steve, este que não quer nem que fale sobre o assunto, o menino deseja que o pai se aproxime, mas quem é que se preocupa de fato é Chuma, Steve é mulherengo e irresponsável, mas mesmo assim consegue fazer com que gostemos dele. A química entre a dupla é o que faz com que a história se desenrole de forma agradável e engraçada. É até ingênua e por vezes brega, mas traz traços interessantes da cultura e costumes do país, além de usar os estereótipos a seu favor, a mistura de gêneros também é um ponto a favor, vai desde o drama do filho que quer ter um pai e o pai que rejeita o filho, da ação que envolve mafiosos e seus esquemas e a comédia que permeia a mudança que aos poucos ocorre nos personagens, após o ataque terrorista Chuma principalmente, sente necessidade de fazer ações boas para que de certa forma compense a sorte que teve, Steve por amizade vai na onda. São cenas hilárias e recheadas de diálogos incríveis, a fotografia enche os olhos com a Jerusalém retratada com seus subúrbios e o Muro das Lamentações, que não é nada fora da realidade.

"Maktub" é um longa que preenche o coração com sentimentos bons, traz a amizade e a lealdade, a empatia e o amor pelo outro, além das questões paternais que afloram, ao fim o choro e o riso vêm junto com a certeza de que o que emanamos para o universo uma hora volta para nós mesmos. 
Disponível no catálogo da Netflix!

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

A Glória e a Graça

"A Glória e a Graça" (2017) dirigido por Flávio R. Tambellini (Malu de Bicicleta - 2011) é um bom filme que lança uma luz sobre a questão da maternidade, o que ou quem qualifica uma pessoa para ser mãe? A desconstrução pode ser rasa, mas mesmo assim ainda é importante, o fato é que esse filme demorou cerca de dez anos para sair do papel e a atriz Carolina Ferraz assumiu a produção, apaixonada pela personagem Glória a construiu com honestidade e potência, a escolha de uma atriz cis para dar vida a uma travesti é polêmica e com certeza deixou de dar visibilidade a uma atriz trans, contudo mesmo com todos os enroscos que a produção sofreu merece ser visto e também serve como um pontapé para a evolução dos próximos trabalhos envolvendo o tema 
Graça (Sandra Corveloni), é uma mulher solteira, mãe de dois filhos. Ao descobrir um aneurisma cerebral impossível de ser operado, ela resolve ir atrás de seu irmão Luiz Carlos (Carolina Ferraz), que, por conta de uma briga, não vê há 15 anos. Quando se encontram, Graça é surpreendida ao se deparar com Glória - uma travesti que deixou de ser Luiz Carlos e vive há muito tempo uma vida completamente diferente, como dona de um restaurante em Santa Teresa. Sensibilizada pelas circunstâncias, Glória aceita se aproximar da família aos poucos. Ela conhece seus sobrinhos, retoma a amizade com Graça e percebe que talvez, para se sentir verdadeiramente completa, precise ser mãe.
Primeiro é preciso dizer que apesar de o papel não ter sido destinado a uma atriz genuinamente travesti não impediu que o longa tivesse um protagonismo marcante, Carolina Ferraz imprimiu força e sinceridade à Glória e certamente se esforçou ao máximo para não se transformar em uma caricatura, aliás seu desempenho é uma das coisas mais legais do filme. Tudo começa quando Graça descobre um aneurisma que pode levá-la a qualquer momento, sozinha e mãe de dois filhos ela precisa reencontrar o irmão que não vê há mais de dez anos e pedir ajuda, pois é seu único elo familiar. Graça é massoterapeuta e possui uma vibe boa, não cria problemas quando vê seu irmão Carlos como Glória, talvez por desesperadamente necessitar de ajuda ou simplesmente por não se importar, até porque mais tarde percebemos que na família todos já sabiam, o que foi fator decisivo para Glória se mandar de casa e sozinha lutar por suas coisas, ela viajou por diversos países, se formou na universidade, é culta e se tornou dona de um restaurante chique, o reencontro é difícil, pois retrata que só quando se precisa de ajuda é que o familiar distante aparece, Glória tem a vida que sempre quis, não tem responsabilidades maiores e tem tudo sob controle, a volta da irmã mexe com ela de alguma forma, mas de início não quer se envolver. Graça fica perturbada por não saber como lidar com os filhos e seguir com a vida depois da descoberta do aneurisma, ela tem instantes de raiva, instantes de tristeza. 

Com o passar dos dias Glória repensa e vai atrás de Graça e aos poucos se reconectam, elas relembram o passado, ela conhece os sobrinhos, uma adolescente que sofre bullying na escola e o garoto que vive no reino da imaginação, vai tomando conta da situação e deixando Graça feliz, claro que nem tudo são flores e muitas histórias do passado vêm à tona, Glória descobre outras e troca de farpas acontecem, um acerto de contas final. A questão da aceitação de Glória não é tão explorada, retrata seu cotidiano muito por cima e seu passado é só conversas aleatórias, a história faz questão de colocá-la numa posição de já ter conquistado as coisas, seus diálogos é que nos demonstra o quanto foi penoso, enfrentar preconceitos, e principalmente, lidar com a solidão. A dificuldade em criar laços e ter carinho parece o maior obstáculo para Glória. 

"A Glória e a Graça" não possui profundidade e há uma inconstância no roteiro, mas possui momentos muito ternos e naturais, o plot é o drama familiar, a reconexão de duas irmãs, a empatia pelo outro, o tão necessário afeto, desconstrói o conceito família e introduz algumas das questões que envolvem a vida de uma travesti, como por exemplo, sempre associá-las à prostituição, há cenas dotadas de emoção, os planos são quase na totalidade fechados, no interior da casa de Graça e a bela fotografia com bastante cores ajuda a compôr um cenário por vezes até lúdico, e quase para o final há uma cena dentro desse contexto com todos fantasiados, onde Glória representa uma sereia, um simbolismo maravilhoso que ao longo é disposto na história. É um filme leve, terno e que possui a sua maior força na gloriosa atuação de Carolina Ferraz.

terça-feira, 18 de setembro de 2018

O Vazio do Domingo (La Enfermedad del Domingo)

"O Vazio do Domingo" (2018) dirigido por Ramón Salazar é daqueles filmes em que a Netflix injeta dinheiro justamente por enxergar potencial em agradar uma gama dos seus assinantes, os amantes de filmes ditos de arte, então é lançado como original Netflix no mundo todo, nada mais que uma troca, já que é uma boa chance do diretor ser visto e sua obra admirada.  
Mais de trinta anos depois de abandonar sua família, Anabel (Susi Sánchez) recebe uma visita inesperada de sua filha Chiara (Bárbara Lennie - Magical Girl, 2014). Ela cede a seu desejo de passar dez dias em uma vila remota entre a Espanha e a França. Melancólico, reflete profundamente a relação entre mãe e filha, o abandono, a culpa e as maneiras de se reconectar. 
O roteiro tem uma evolução tocante, o que de início fica duvidoso o porquê da reaproximação da filha com a mãe, com o desenrolar percebemos que vai muito além de elo de sangue, mágoas e acerto de contas, é sobre conexões emocionais construídas a partir de um acontecimento e convivência. Nesse contexto a sutileza impera, são momentos dotados de silêncios. Tudo se inicia quando Chiara vai trabalhar de garçonete na mansão de Anabel, uma milionária casada com um homem importante, vemos o quão exigente é com o jantar e o como os garçons devem se apresentar, Chiara faz tudo ao contrário, não tira seus brincos, serve o vinho errado e quando permanece após tudo terminar Anabel percebe que aquela moça é sua filha, abandonada há cerca de 30 anos com o marido francês, claramente seu primeiro pensamento é relacionado a dinheiro, depois de tanto tempo só pode ser esse o motivo, também sente medo de uma vingança e assim manchar o nome e a tranquilidade da família. Chiara não quer um centavo de Anabel, mas o marido pede que ela assine um documento que garantirá que não pedirá absolutamente nada e que não importunará mais depois que passar os dez dias pedidos por ela. Então a madame segue com Chiara para um chalé no meio da floresta, onde Chiara cresceu com o pai, que diz ter morrido. Suas roupas de grife destoam do ambiente rústico, as duas precisam de alguma maneira manter uma relação, o que nos primeiros dias não acontece, Anabel tem receio das intenções de Chiara, esta que articula meios de aproximação, como pegar um cachorro, o enlamear e depois dizer que o resgatou para que a mãe esboce algum sentimento, ela também a força a fazer as tarefas, a sair do salto alto, viver a vida ali, sentir alguma coisa fora da sua bolha.
A maternidade é retratada sob um ponto de vista realista, sem romantizações acerca de elos e amor incondicional, o egoísmo e os desejos de Anabel falaram mais alto e para ela era o certo a fazer, depois de tantos anos esqueceu-se de que tinha uma filha, mas ao se deparar com ela e depois com o pedido de passar dez dias juntas, isso a revolveu por dentro, o que de início soou estranho com o passar dos dias esse pedido ganhou uma significação importante. Ali ela pode repensar, remexer suas memórias, compreender a si mesma e a filha, em meio a natureza, a quietude; o tempo.

O drama é envolto por mistérios e essa relação vai sendo reconstruída, mas não de maneiras clichês, são momentos dos quais ora aproximam, ora repelem, a mágoa, a culpa e a dor permeiam o ambiente, será possível estabelecer um elo materno depois de anos e anos distantes? O sentimento de abandono misturado ao de querer conhecer a pessoa que lhe fez se sentir vazia é imensamente triste, mas Chiara tem seus motivos de tê-la procurado, uma maneira de se sentir em paz. O final é extremamente doloroso e certamente a cada um tocará de uma forma.

"O Vazio do Domingo" diz sobre as escolhas e o sentimento de impotência diante das consequências delas, mas de alguma forma é preciso passar por esses pesos para que de algum modo se transformem. "Algumas lembranças se movem e nos ajudam a viver. Outras... ficam estagnadas. São muito poderosas. Se não as puser em movimento de novo, elas o perturbam", essa frase é citada num ponto crucial da história, Anabel após passar os dez dias com a filha e estabelecer vínculo surge mais um pedido e é aí que mais uma vez ela precisa escolher, os instantes finais é um ato de coragem, de renovação e de amor. Com certeza Anabel olhará a vida de outra maneira, não poderá tampar esse vazio, mas enfim conseguiu encará-lo.

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

A Mulher Mais Assassinada do Mundo (La Femme la Plus Assassinée du Monde)

"A Mulher Mais Assassinada do Mundo" (2018) dirigido por Franck Ribière é baseado na história real da atriz Paula Maxa, ícone do teatro Grand-Guignol, especializado em espetáculos de horror entre os anos 1897 e 1962. Paula Maxa nome artístico da atriz francesa Marie-Thérèse Beau atuou neste popular teatro entre 1917 a 1933, seus papéis sempre consistiam em dramas excessivos nos quais ela era torturada e morta de diversas maneiras, por conta do sucesso ela ficou conhecida como a mulher mais assassinada do mundo, ela teria sido morta cerca de 358 vezes no palco levando ao público um sentimento de horror e dúvida, já que as cenas eram feitas com perfeição, inclusive usando métodos à frente do tempo em relação a efeitos de maquiagem, como o sangue, que era usado em demasia. O filme apesar de desandar em seu desenvolvimento e ter um final anticlimático consegue incutir curiosidade e manter um tom sombrio em que a ficção se mistura à realidade.
O filme tem uma espécie de prólogo nos inserindo à figura de Maxa, imergimos em seu macabro universo permeado de mortes de todos os tipos, o clima sombrio flerta com o estilo noir e a voz imponente de Anna Mouglalis narra as maneiras das quais sua personagem morreu: estrangulada, envenenada, decapitada, violentada, esmagada, esquartejada, alvejada, afogada e por aí vai, então vem uma abertura e a história segue com o jornalista Jean (Niels Schneider) indo ao teatro a fim de produzir uma matéria sobre os protestos que estão acontecendo para o fechamento do teatro, o período em que tudo se passa é os anos 30 e para a maioria os espetáculos incitam a violência e desvirtuam as pessoas, o teatro Grand-Guignol se tornou sinônimo do horror devido as esquetes exclusivamente sobre assassinatos e torturas repletas de sangue - o que se tornaria tempos depois um subgênero do terror, o gore, difundido por George Romero, especialmente - os populares desmaiavam e até vomitavam durante a peça, o fato é que esse lugar era considerado um templo do horror em Paris. Jean fica encantado com o que vê e acaba conhecendo Paula e com o decorrer descobre que sua vida pessoal tem a ver com o que representa, ela tem o sofrimento como algo inerente. Jean descobre mais do que deveria, há um suspense não definido e uma confusão entre o que acontece fora do teatro com o que acontece dentro, o sumiço do jornalista, por exemplo, alguns acontecimentos parecem desconexos e as explicações são rasas. Mas há um bom empenho no que diz respeito a homenagear o grande teatro, as cenas são reproduzidas com muito amor, os bastidores e as artimanhas que usavam para fascinar e chocar o público são excelentes.

O que mais chama a atenção é o visual, a ambientação e a atmosfera com suas ruas escuras e esfumaçadas, a sensação é de estar assistindo um filme antigo, Anna Mouglalis dá vida a Maxa com muita força, seus olhos e sua voz são impossíveis de não notar, dão uma característica peculiar. As pessoas entravam no teatro sabendo que ela iria morrer, elas iam especialmente para isso, a cada noite uma morte, fascinantes efeitos de maquiagem, e que deixavam as autoridades de cabelo em pé, até duvidando da onde viria todo aquele sangue que era jogado literalmente na cara da platéia, já era avisado antes de entrarem: "Nosso sangue é sempre fresco e os clientes que não quiserem levá-lo para casa em suas roupas, devem evitar os assentos próximos do palco".

"A Mulher Mais Assassinada do Mundo" é um exemplar curioso e que instiga a procurar mais sobre a atriz Paula Maxa, o teatro Grand-Guignol, seus espetáculos de horror que chocavam e fascinavam o público e até o como o cinema absorveu muitos dos elementos e efeitos desse período e que são usados até hoje.
Disponível no catálogo da Netflix!

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

The Doors

"Quando as portas da percepção forem abertas, veremos tudo como realmente é: infinito." 
(Citação de William Blake, que por sua vez  Adouls Huxley se inspirou para escrever "As Portas da Percepção", e da qual Morrison tirou o nome da banda.)

"The Doors" (1991) dirigido por Oliver Stone (Assassinos por Natureza - 1994) é uma biografia musical de Jim Morrison, a voz e a alma dos Doors, um homem que marcou várias gerações e que ainda hoje nos faz interrogar se algum dia alguém o conheceu realmente. A história retrata a ascensão e a decadência de Jim, mostra sua passagem pelo conturbado mundo do rock´n roll, onde as drogas e o sexo reinavam. 
Para quem deseja conhecer mais um pouco sobre o ídolo o filme é ótimo, ele destaca os seis últimos anos de Morrison, Val Kilmer encorporou Jim de forma visceral, em muitos momentos ele está idêntico, além de cantar divinamente. Suas performances sem dúvidas são a alma do filme. 
O filme começa retratando Jim quando criança testemunhando um acidente de caminhão envolvendo índios, esse episódio o marcará e inclusive ele terá visões de um xamã por toda a sua trajetória. Em 1965, Jim e seu amigo Manzarek (Kyle MacLachlan) estudam cinema, também conhece sua musa inspiradora Pamela Courson (Meg Ryan), Jim se dedica a escrever poemas e letras de músicas, ao mostrar uma delas a Manzarek, este fica encantado e dá a ideia de formar uma banda, se juntam a eles Robby Krieger (Frank Whaley) e John Densmore (Kevin Dillon), as letras vão nascendo e o contrato com a Elektra Records surge, logo o sucesso chega, a banda ganha status na contracultura, o espírito da época é maravilhosamente bem delineado e somos absorvidos pela atmosfera hippie. As passagens em que mostram os integrantes viajando com LSD é outro ponto de destaque. O sucesso engole Jim, o excesso de álcool, drogas, o relacionamento conturbado com Pam, a infidelidade de ambos renderam brigas épicas que beiravam à loucura, ela também tinha atitudes autodepreciativas apesar de sua personalidade espontânea de início, ela se afundou junto de Jim.
Para quem é fã talvez sinta falta de um aprofundamento, mas devido diversas inviabilizações, como o tecladista Manzarek ter sido contra o filme e outras dificuldades de produção, só após 20 anos de tentativas que o longa surgiu com o protagonismo de Val Kilmer, papel que antes estava destinado a John Travolta, o fato é que mesmo diante de muitas licenças poéticas, a história consegue cativar e dar uma ideia do que foi a loucura da época, o sucesso surreal da banda, a genialidade de Jim, que era cheio de habilidades no palco, sexy, contestador e enfeitiçava o público com suas letras melancólicas, viajadas e fascinantes improvisos.  

O baterista John Densmore em vários momentos enfrenta Jim e o alerta para o uso desenfreado de drogas, de que o intuito era usar para expandir a mente e não como modo de fuga, também retrata a genialidade de Manzarek, que era tão importante quanto, pois era o responsável pelo som psicodélico da banda, os integrantes não são tão explorados, mas dá pra ter noção do quão grande era a figura de Morrison, o frenesi em torno de si e o quanto isso o deixava vulnerável, precisando cada vez mais ser adorado. Outra personagem interessante é a jornalista Patricia (Kathleen Quinlan), adepta de rituais de bruxaria, há uma cena muito doida em que bebem sangue e dançam alucinadamente.

"The Doors" é uma boa introdução à vida de Morrison e aos Doors, uma das bandas mais explosivas do final dos anos 60 e começo dos 70, Jim, acima de tudo, era um poeta e buscava a si mesmo, para isso encarava a dor e flertava com a morte. No final, em torno de tantas polêmicas e acusações caiu numa profunda depressão, sua morte é envolta em mistérios e boatos até hoje, a verdade não sabemos, mas o que importa é o seu legado magistral e imortal.

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Garotos de Programa (My Own Private Idaho)

"Garotos de Programa" (1991) dirigido por Gus Van Sant (Inquietos - 2011, O Mar de Árvores - 2015) retrata de maneira dura, porém sensível a marginalização da juventude do final dos anos 80, o abandono e a carência de garotos que se prostituem, usam drogas e contestam às normas da sociedade. Terceiro longa de Gus Van Sant, que mais tarde viria a se tornar um colecionador de sucessos, já aponta neste suas fortes características com temas polêmicos abrangendo o universo da juventude atrelados a uma inteligente carga emotiva, a energia desse longa é especialmente única, dado o que se sucedeu ao ator River Phoenix anos depois, é uma experiência amarga e afetuosa acompanhar a jornada de seu personagem, ao final só desejamos abraçá-lo e acolhê-lo.
Mike (River Phoenix) e Scott (Keanu Reeves) são dois jovens garotos de programa que moram nas ruas de Portland, Oregon. Os dois fazem parte de um grupo de libidinosos excluídos sociais, que se juntam num prédio condenado para fazer tumulto e se venderem a quem esteja disposto a pagar por eles. Apesar de ambos serem insatisfeitos e perturbados, os dois garotos têm a personalidade bem diferente: Scott é rebelde e se prostitui para humilhar sua família, já Mike é um sonhador, um rapaz gentil que está apaixonado pelo seu melhor amigo, e quer encontrar a mãe. Juntos os dois se metem em diversas encrencas em viagens que vão do Idaho até a Itália para encontrar a mãe de Mike.
É impressionante que o que poderia soar algo vazio, graças a sincera composição de personagem de River Phoenix o roteiro ganha tons profundos e ternos, acompanhamos especialmente dois desses garotos que vivem à margem da sociedade, habitam prédios abandonados, colecionam histórias bizarras de programas sexuais, famílias disfuncionais e perdidos se apegam uns aos outros, Mike e Scott são dois amigos completamente diferentes um do outro, Scott é filho de um milionário e para contestá-lo se une aos mais pobres, se prostitui, arranja encrencas e apenas espera sua herança, Mike foi abandonado pela mãe, vaga de uma cidade à outra e se vira como pode, além de possuir narcolepsia, um distúrbio que o faz de repente cair no sono, seu desejo é reencontrar a mãe e para isso não mede esforços. Por ele ter esses surtos de sono somos inseridos a seus sonhos/memórias de forma lúdica, sequências que ajudam a criar empatia com o personagem. Com o passar percebemos sua paixão por Scott e numa das cenas mais sensíveis ele diz gaguejando e timidamente que o ama: "Eu consigo amar sem as pessoas me pagarem". Essa cena foi reescrita por River Phoenix com o apoio do diretor e é com certeza a passagem mais bonita e dotada de emoção. Há tanta fragilidade em seu personagem.

A história retrata jovens abandonados, a maioria de famílias disfuncionais, que desamparados se tornam rebeldes e não possuem opções na vida além da prostituição, se submetem à fetiches bizarros e situações de violência, não há saída a não ser sair por aí e vandalizar, gritar e procurar um pouco de afeto, Scott poderia ter amor se quisesse, mas seu único desejo é humilhar o pai milionário, por pura diversão se alia a esses garotos, enquanto Mike procura pela mãe, cujo passado ele mesmo molda, quando encontra o irmão podemos ter a certeza disso, seu anseio em encontrá-la é tão grande que ele vai de cidade em cidade com as pistas que acha aleatoriamente, inclusive chegando ir à Itália, local do qual Scott se apaixona e por consequência o faz retornar ao lar. O semblante de Mike se torna cada vez mais triste, se decepciona por Scott o abandonar e mais uma vez sozinho retorna às ruas. É cruel o que Scott faz, ele volta ao seu habitat e despreza os amigos de outrora, a rejeição é palpável em Mike, machuca vê-lo jogado sem perspectiva, sem afeto, sem absolutamente nada. A cena final é dilacerante!

"Garotos de Programa" é um filme cru e que tem na interpretação de River Phoenix seu maior triunfo, sua delicadeza tira muito do peso da história, mas a melancolia está presente mesmo nas partes mais leves, a sensação do se sentir abandonado é imensa nesse filme, uma obra memorável e, que infelizmente, foi a última de River Phoenix.

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Hereditário (Hereditary)

"Hereditário" (2018) dirigido pelo estreante Ari Aster é dessa nova leva de terror que vem mais atrelado ao thriller psicológico, que não se concentra em artifícios fáceis e que não subestima o espectador, é um exemplar perturbador que possui várias camadas, repleto de simbolismos a trama nos arrasta devagar para a sinistra família marcada por infortúnios. 
Após a morte da reclusa avó, a família Graham começa a desvendar algumas coisas. Mesmo após a partida da matriarca, ela permanece como se fosse uma sombra sobre a família, especialmente sobre a solitária neta adolescente, Charlie, por quem ela sempre manteve uma fascinação não usual. Com um crescente terror tomando conta da casa, a família explora lugares mais escuros para escapar do infeliz destino que herdaram. Atenção: Spoilers a Seguir!
É preciso estar atento as pistas, aos detalhes que a história vai dando, não é um filme para se assistir olhando o celular ou fazendo qualquer outra coisa, é preciso imergir nela, pois o desenrolar e a atmosfera pesada vem de modo gradativo, já no início a câmera foca no colar da avó, que é igual ao que Anne (Toni Collette) usa, o símbolo desse colar aparece em várias cenas e sua significação é de extrema importância, o discurso feito por Anne no enterro reflete a relação complicada e o como ela desconhecia a mãe, "uma mulher muito reservada e privada... ela tinha rituais privados e amigos privados"após o falecimento dessa avó que era adorada aparentemente apenas por Charlie (Milly Shapiro), desestabiliza essa família por completo. Anne é uma artista primorosa que constrói miniaturas para uma galeria de arte, toda a sua obra representa a sua própria vida, uma maneira perturbadora de se lidar com a realidade, Charlie é uma garota peculiar que ou está desenhando ou está construindo seus próprios bonecos (outro simbolismo), também vive comendo barras de chocolate, sua introspecção é extrema e parece não habitar a realidade. Seu irmão Peter (Alex Wolff) é um adolescente que fuma maconha escondido dos pais e que está começando a se desinibir, o pai (Gabriel Byrne) apesar de não esboçar muitos sentimentos com o decorrer se mostra a pessoa mais centrada ali naquela família. Muitas questões se desnovelam dentro daquela casa, o luto, a dificuldade da comunicação, maternidade, distúrbios psíquicos, o fato é que todos se fecham em si mesmos, Anne em seu mundo miniatura, Peter no seu quarto fumando maconha, Charlie desenhando e Steve o único tentando resolver os problemas reais, mas que se recolhe em seu casulo não dando assistência emocional a ninguém. Anne busca ajuda em grupos de autoajuda e ali compreendemos mais da conflituosa relação com a mãe e sobre a hereditariedade dos distúrbios psíquicos, o flerte com o oculto acontece mesmo depois da morte trágica de Charlie, que parece ter sido articulada por forças sobrenaturais, Peter quer ir a uma festa, mas Anne só deixa se ele levar Charlie, claramente a menina não quer, mas acaba indo, Peter sobe para fumar com a menina que está afim e deixa Charlie à vontade para comer um bolo de chocolate, que está forrado de nozes, logo sua alergia ataca e sua garganta fecha, Peter se desespera e a coloca no carro, no caminho o acidente, no poste o símbolo, um momento terrível que faz o espectador arregalar os olhos tamanho o horror. Peter fica paralisado, demora a se recompor e recomeçar a dirigir, no asfalto a cabeça da irmã, no carro o corpo. 

Peter não diz nada à família, Anne descobre pela manhã e irrompe em desespero, novamente o luto, a angústia, o silêncio. Ninguém diz nada a ninguém, Anne se isola em seu estúdio, Peter vaga pela casa esperando que a mãe diga algo, a culpa o corrói. Então a família começa a ruir de vez, enquanto isso Anne novamente pensa em buscar ajuda fora e é aí que conhece Joan (Ann Dowd), que a consola e a convida para participar de um ritual, uma espécie de jogo do copo, onde ela chama pelo espírito do neto, Anne fica comovida e se agarra a possibilidade de se conectar com Charlie. Tudo desanda de vez, ela aceita o oculto e a partir daí vai descobrindo mais sobre sua mãe e vai ladeira abaixo, ao fazer o chamado de Charlie o espírito começa a atormentar Peter. Steven não acredita nestas coisas e acaba interpretando que Anne está descontando no filho seu sofrimento e ele por conseguinte manifestando com comportamentos estranhos. Esse desencontro familiar, a incomunicabilidade e distanciamento só ajuda na entrada do mal, cada vez mais ele se acomoda e chega mais próximo do que deseja, Peter.

Anne começa a ligar os pontos em determinado momento, assim como nós espectadores, Joan era uma antiga amiga de sua mãe e ambas faziam parte de um culto que desejava dar um receptáculo a Paimon, um dos reis do inferno, segundo a magia Goetia, desde o começo sua mãe articulou tudo, sobre Anne ter um segundo filho e dessa maneira se reconectar a ela, em várias partes Anne diz o quanto odiava quando sua mãe alimentava Charlie e da sua afeição estranha pela menina, mas é que ela era um receptáculo de Paimon, quando a avó morre a menina pergunta quem cuidará dela, a mãe tenta consolá-la e diz que era favorita da avó, Charlie por sua vez diz que a avó preferiria que ela fosse homem. Compreendemos isso mais tarde quando depois de sua morte o culto começa a ritualizar em cima de Peter, pois Paimon tem preferência por corpos masculinos, então tudo vai se encaixando e a obscuridade vai tomando conta da história. A escolha dessa entidade foi um acerto original, muitos filmes retratam o demônio, satanás, lúcifer, o capeta e sempre com intuito apenas de assustar, não há profundidade ou contexto. Segundo a demonologia, Paimon é o nono espírito dentre 72 da Goetia (Refere-se à prática de Invocação de Anjos ou a Evocação de Demônios descritos no grimório do séc. 17), ele é considerado um dos reis do inferno e muito obediente a Lúcifer, ele aparece sob a forma de um homem de rosto afeminado sentado em cima de um dromedário com uma coroa em sua cabeça, ele tem o poder de influenciar e ensinar todas as artes e ciências e pode revelar conhecimentos e mistérios da Terra. É no final que o ritual se concretiza e vemos Paimon se apoderando do corpo de Peter, o que mais chama a atenção é a estátua dedicada ao rei Paimon, que faz referência às imagens católicas, mas que possui alguns detalhes que escarnecem com o significado religioso.

"Hereditário" é um drama familiar atrelado ao terror, isso desencadeia diversas questões, como luto, incomunicabilidade, o sofrimento que cada um carrega, a maternidade, não é só algo que flerta com o oculto, mas que mescla os dramas e constrói a partir disso situações sinistras caminhando sempre em direção ao tão aterrorizante desconhecido.
Por mais que o filme pareça arrastado todas as cenas são primordiais para que a história ganhe corpo e camadas, todos os personagens são explorados e maravilhosamente bem compostos, Toni Collette exibe facetas aflitivas, é uma mulher complexa que desesperada luta com as perdas da mãe e da filha, do casamento falido, com a confusa relação com Peter, com as descobertas sobre a mãe e sua derrocada psicológica. Milly Shapiro e seus estalos com a língua gera inquietação, só sua presença ajuda a criar estranheza, Alex Wolff compõe um adolescente perdido e que está sempre assustado, sua evolução é ótima e tem momentos terrificantes, Gabriel Byrne é uma presença fantasma, não faz muito para ajudar a família e só faz crescer o caos por isso. Não tem como não falar também de Ann Dowd como Joan, que age calculadamente para atingir seu objetivo com o culto que a mãe de Anne liderava. A atmosfera ganha tons mais sombrios lá pelo final, o sobrenatural se alia ao caos psíquico e assim o desconhecido ganha formas. 

Criativo, instigante e encorpado, é um filme que pede revisões e cativa os espectadores que curtem mais um terror enigmático e sem sustos baratos, há todo um contexto por trás e nada é de graça, é necessário prestar atenção aos símbolos, diálogos e nos detalhes de cada personagem, a escolha da entidade que possui conhecimentos e auxilia e ensina as artes de todos os tipos, além de fornecer riquezas inimagináveis foi bem acertada, pois traz à tona o universo da Goetia, os mistérios são sedutores e sai da zona de conforto dos filmes de possessões e crucifixos invertidos. 

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

O Despertar da Adolescência em 20 Filmes

A lista prioriza obras que retratem o despertar da adolescência, que nem sempre é bonito e doce, as descobertas, os desejos aflorando, o olhar mudando para com o mundo, tudo isso misturado ao medo e as responsabilidades chegando, o amargo crescimento está na maior parte dos listados e é muito mais que filmes regados a romance e sonhos, é uma reflexão contundente sobre a fase mais confusa e importante da vida. 

20- "Gigante Adormecido" (Sleeping Giant - 2015) Canadá
O adolescente Adam está passando as férias de verão com seus pais em Lake Superior. Sua maçante rotina é quebrada quando ele faz amizade com Riley e Nate, primos espertinhos que passam o seu tempo livre com deboche e imprudências. A revelação de um doloroso segredo para Adam acarretará em uma série de eventos irreversíveis que testarão os laços de amizade e mudarão os meninos para sempre.

19- "Bridgend" (2015) UK/EUA/Dinamarca
Sara e seu pai chegam a uma cidade assustada após uma série de suicídios de adolescentes. Quando ela se apaixona por James, começa a sentir a depressão generalizada do lugar. A história baseada em fatos reais retrata a chocante onda de suicídios cometida por adolescentes - que começou em 2007 e continua até hoje - na cidade de Bridgend, País de Gales. A causa é desconhecida e várias são as hipóteses, o fato é que nessa cidade o suicídio contagia esses jovens, que parecem ter na morte a solução para os seus problemas. Saiba+


18- "Flickan" (2009) Suécia
A historia de uma garota que fica sozinha em casa (lugar aparentemente não muito longe de Estocolmo), enquanto os pais vão para a África. Deixam como babá, uma tia da garota, mas a babá tem uma vida pessoal "agitada", e também vai embora para tratar dos seus assuntos. A garota fica sozinha, e é aí que o filme verdadeiramente começa. Não se passa nada de especial - nenhum drama, nenhuma crise -, como se tudo se resumisse a uma crônica da ocupação do tempo, e este é o aspecto mais simpático do filme.

17- "Sebbe" (2010) Suécia
A história do jovem de 15 anos Sebastian, que passa suas horas vagas catando lixo e componentes eletrônicos, e com esses detritos ele habilmente constrói novos objetos, inclusive um motor para a sua velha bicicleta. É um garoto tímido e constantemente intimidado pelos seus colegas de classe, quando não pelo seu vizinho que também o agride sexualmente, além da convivência com a sua mãe bipolar, que em certos momentos lhe dá carinho e em outros o insulta.

16- "O Porco Espinho" (Le Hérisson - 2009) França/Itália
Paloma é uma menina séria e inteligente de 11 anos, decidida a se matar em seu décimo-segundo aniversário. Fascinada por arte e filosofia, a menina passa o dia filmando seu cotidiano, a fim de fazer um documentário. À medida que a data de seu aniversário se aproxima, ela conhece pessoas que a fazem questionar sua visão pessimista do mundo.  Um filme delicado, com um roteiro primoroso que se apega a detalhes, a pequenas grandes paixões dos personagens, o que faz deles interessantes aos nossos olhos. Saiba+

15- "Kid-Thing" (2012) EUA
Nos arredores de Austin, Annie, uma garota de 10 anos de idade, passeia com sua bicicleta BMX, arremessa objetos em carros e quebra coisas com seu taco de beisebol. Seu pai, um criador de cabras e motorista de carros de competição, é ausente e faz pouco esforço para representar uma boa figura paterna. Annie não tem amigos da sua idade, por isso sua rotina diária é repleta de aventuras solitárias. Brincando na floresta um dia, ela ouve uma mulher clamar por ajuda dentro de um poço abandonado. Embora Annie se sinta impelida a visitar o poço diariamente, ela não tem certeza sobre como lidar com a situação da mulher.

14- "Incompreendida" (Incompresa - 2016) Itália/França
Roma, 1984, Aria é uma menina de nove anos de idade. À beira do divórcio, os pais infantis e egoístas de Aria estão muito preocupados com suas carreiras e assuntos extraconjugais para cuidar adequadamente de qualquer uma das necessidades da criança. Enquanto suas duas irmãs mais velhas são mimadas, Aria é tratada com indiferença e frieza. Mesmo assim, ela anseia em amar e ser amada pela família. Na escola, a menina se destaca academicamente, mas é considerada desajustada por todos. Ela é incompreendida. Seu conforto resume-se em seu gato Dac e sua melhor amiga, Angelica. Ao ser expulsa da casa dos pais e abandonada por todos, até mesmo por Angelica, Aria finalmente chega ao limite do que pode suportar, e toma uma decisão inesperada em sua vida. Um filme que retrata uma menina em fase de transição em meio a uma família disfuncional. Escrito em parceria com Barbara Alberti, talvez o roteiro tenha algo de autobiográfico, já que a diretora, Asia Argento, é filha do mestre do terror Dario Argento e da atriz Daria Nicolodi, certamente algumas memórias inspiraram a sua doce protagonista, Aria. Demonstrando toda a difícil missão de crescer sendo rejeitada e incompreendida pelos próprios pais, adentramos num universo perturbador e triste, mas que evoca sensações de ternura e carinho. Saiba+

13- "Sparrows" (Þrestir - 2015) Islândia
Ari (Atli Óskar Fjalarsson), um garoto de 16 anos, vive com sua mãe em Reykjavik e, de repente, é enviado de volta para a remota Westfjords para viver com seu pai, Gunnar (Ingvar E. Sigurdsson). Lá, ele tem que lidar com a difícil relação que tem com o pai, ao mesmo tempo em que encontra amigos de infância. Neste ambiente sem esperança e em declínio, Ari tem de encontrar o seu caminho. A transição da adolescência para a vida adulta é sempre fascinante, por mais que existam inúmeros filmes sobre o tema, o diretor conseguiu expôr as emoções com sensibilidade, é um retrato sincero e por isso tem a sua originalidade, partindo das experiências particulares de um adolescente que amadurece e percebe que a vida pode ser cruel e que decisões são cruciais. Saiba+

12- "Heartstone" (Hjartasteinn - 2016) Islândia
Na beleza de um pequeno vilarejo da Islândia, dois garotos compartilham uma jornada de amizade e amor. Enquanto um deles tenta ganhar o coração de uma menina, o outro descobre novos sentimentos pelo melhor amigo. Realista e poético ao retratar o despertar dos desejos na adolescência, a amizade verdadeira e o como o meio em que se vive oprime o que considera diferente. Saiba+

11- "Califórnia" (2015) Brasil
O ano é 1984. Estela vive a conturbada passagem pela adolescência. O sexo, os amores, as amizades; tudo parece muito complicado. Seu tio Carlos é seu maior herói, e a viagem à Califórnia para visitá-lo, seu grande sonho. Mas tudo desaba quando ele volta magro, fraco e doente. Entre crises e descobertas, Estela irá encarar uma realidade que mudará, definitivamente, sua forma de ver o mundo. Um filme delicado que retrata a difícil, porém maravilhosa fase da adolescência. Sob a perspectiva feminina observamos todas as descobertas vivenciadas pela protagonista, seja o doce e o amargo da paixão, os frescos sonhos, as dúvidas, as amizades, e a formação de identidade. Saiba+

10- "O Despertar da Adolescência" (The Mudge Boy - 2003) EUA
Conta a história do jovem Duncan Mudge (Emile Hirsch), que possui um difícil relacionamento com o pai, perde a mãe na pré-adolescência e sua melhor amiga é uma galinha. Sua mãe, que mantinha um galinheiro no sítio onde moram, morre, e ele dá continuidade no cuidado com os bichos, o que não agrada seu pai - dela ele herda alguns hábitos estranhos, além de parecer muito com ela. A história acontece numa zona rural dos EUA: a maioria dos habitantes está ligada à produção agropecuária, frequentam a igreja, e alguns jovens não se adequam àquela vida, dentre eles, Perry e sua turma, que passam a levar o garoto dos Mudge para beber e farrear. O garoto é "esquisito", e com a falta da mãe costuma usar suas roupas, luta para lidar com a própria sexualidade, afinal ele está em plena puberdade. Possui nos novos amigos, principalmente em Perry (Tom Guiry), uma fortaleza e chance de tentar ser diferente, é quando eles se envolvem numa relação de cumplicidade além da amizade...

09- "Infância Nua" (L'Enfance Nue - 1968) França
O menino François (Michel Terrazon), de 10 anos, se sente rejeitado pela mãe quando ela o abandona em um lar para crianças desobedientes. Ele é posto sob a tutela de um casal, mas eles não se adaptam ao comportamento do menino. François, então, é adotado por um casal de idosos, mas suas ações fazem com que ele seja preso. Ele vai tentar, aos poucos, superar a rejeição de sua mãe e se esforçar para melhorar sua imagem.

08- "Kauwboy" (2012) Holanda
Jojo, um garoto de 10 anos, um dia traz um filhote de gralha para casa, mas o esconde de seu pai, que não quer animais nem plantas dentro de casa. Jojo pretende surpreender a mãe com o pássaro, no dia do aniversário dela. Mas seu pai prefere não comemorar a data, haja vista ela não ser muito presente em suas vidas. Jojo tem muito tato ao lidar com o pai, devido às suas violentas mudanças de humor, fazendo de tudo para que se aproximem. Jojo adquire uma maturidade precoce por cuidar de si ainda tão pequeno, mas isso não elimina a inocência do universo pré-adolescente, que consiste numa fase repleta de descobertas. Saiba+

07- "Stella" (2009) França
Stella é uma garota argentina de 11 anos de idade que acaba de iniciar um novo curso numa escola de Paris. Mas sua vida, mesmo, transcorre dentro de um bar cujos pais exilados são donos. Um refugio para a classe trabalhadora, que cai na bebida, faz apostas, fala de futebol e outras amenidades até o dia amanhecer. Para Stella, a escola é complicada. Mais do que os estudos, o que ela não suporta são as humilhações dos professores e amigos por causa de sua origem. É assim que começam a despertar na garota instintos mais violentos. Mas graças a sua única amiga, também filha de intelectuais argentinos exilados, Stella vai vislumbrar um mundo que não conhece: desde o primeiro amor até os perigos que cercam uma menina prestes a se tornar mulher. Disserta sobre a transição de criança à adolescência de modo natural, sem julgamentos e esteriótipos. Saiba+

06- "Girls Lost" (Pojkarna - 2015) Suécia
Kim (Tuva Jagell), Bella (Wilma Holmén) e Momo (Louise Nyvall) são três amigas inseparáveis muito incomodadas pelos seus colegas de classe. Uma noite, após outro dia ruim na escola, elas ficam bêbadas e decidem provar do misterioso néctar que escorre de uma flor. Após passarem mal logo ao inserirem o líquido, elas acordam horas depois como meninos. Intrigadas com a mudança de seus corpos elas decidem explorar o mundo dos homens e desenvolvem autoconfiança. Porém, as emoções se transformam em perigo à medida que uma das três desenvolve uma forte ligação com sua nova identidade e inesperados sentimentos surgem. Traz o despertar da adolescência de uma forma inusitada e poética, a fantasia é uma bela aliada para nos inserir em variados temas que rodeiam o universo das três garotas que passam por transformações e autoconhecimento, o amadurecimento surge com pitadas de deslumbramento e o clima sombrio caracteriza a dor que cada uma sente para se encontrar e se aceitar. Saiba+

05- "The Fits" (2015) EUA
Um retrato psicológico de Toni, uma menina de onze anos de idade, que está participando de uma equipe de dança em Cincinnati, quando um surto misterioso de desmaios atinge a equipe e seu desejo de aceitação é torcido. Abarca o tema rito de passagem feminino com um quê de mistério e passeia pelo suspense ao retratar um certo tipo de histeria que acomete as meninas e que seria contagioso, uma excelente e intrigante metáfora para explicitar o quão difícil é o despertar da adolescência feminina. Saiba+

04- "O Gigante Egoísta" (The Selfish Giant - 2013) UK
Uma fábula sinistra sobre a chegada da adolescência, conta a história de Arbor, um menino de 13 anos marginalizado e fora da escola. Ele e Swifty, seu melhor amigo, conhecem Kitten, um velho catador de lixo. Usando uma charrete e um cavalo, eles saem pela cidade coletando metal para ajudar o catador. Enquanto Swifty se dá melhor com o cavalo, Arbor se interessa mais em fazer amizade com Kitten e ganhar algum dinheiro. Mas aos poucos Arbor começa a se sentir deixado de lado, o que aumenta sua ganância e faz crescer a tensão entre os três personagens. Um drama esmagador sobre a pré-adolescência de dois garotos pobres que dia após dia tentam ganhar a vida para ajudar suas famílias. É uma fábula sinistra sobre a chegada da adolescência. Saiba+

03- "O Pequeno Italiano" (Italianetz - 2005) Rússia
Vanya Solntsev (Kolya Spiridonov) é um garoto de 6 anos, que vive em um orfanato na Rússia. Como em breve será adotado por um casal de italianos ele ganhou o apelido de "pequeno italiano" entre os colegas de orfanato. Um dia Vanya vê uma jovem mulher chegar ao orfanato, buscando reaver o filho. Ele passa a sonhar que sua mãe também pode tentar buscá-lo algum dia e, desta forma, decide procurar por ela. Um conto emocionante sobre crianças abandonadas que habitam um orfanato na Rússia, e que por falta de recursos vendem elas a casais estrangeiros. É um retrato realista sobre a situação econômica e social do país pós-comunismo. Vanya é pequeno só no tamanho, sua personalidade é de uma grandeza gigantesca, sua coragem em não ceder ao mais fácil, a difícil jornada por seu sonho necessita de muita força, a inocência se mescla com uma maturidade precoce, as condições de sua vida não o faz desistir, ele é um herói. Saiba+

02- "O Tempo e o Vento" (Bes Vakit - 2006) Turquia
Em um pequeno vilarejo do interior da Turquia, um grupo de crianças tenta sobreviver às dificuldades do cotidiano por meio da imaginação e da integração com a natureza e suas estações do ano. Um retrato duro e poético sobre o rito de passagem de três crianças numa pequena aldeia do noroeste da Turquia, escondidas entre montanhas e colinas elas vão se confrontando cada vez mais com uma realidade preestabelecida, assim como o ciclo da passagem das estações e a alternância entre noite e dia, o amadurecimento e a transformação vêm com peso e responsabilidade de repetir o mesmo trajeto das gerações anteriores. Saiba+

01- "Eu Existo" (Jestem - 2005) Polônia
Um menino na faixa dos dez anos se vê perdido diante ao fato de não ter ninguém no mundo, ele tenta encontrar seu lugar, mas sem muito sucesso. De início o vemos no orfanato sendo ridicularizado pelos amigos, ele não entende o porque de estar lá, já que tem uma casa e uma mãe. Ao fugir e retornar ao seu lar encontra sua mãe, uma prostituta alcoólatra repleta de problemas, eles acabam brigando e o menino sai correndo. Sem ter para onde ir e o que comer, ele vaga até encontrar um velho barco abandonado em frente a casa de uma família rica, e se estabelece lá. Belíssimo filme que retrata o amadurecimento precoce e a dificuldade de se descobrir perante ao mundo e se afirmar mesmo que este o rejeite. Saiba+

Bônus: 

"Vidas sem Destino" (Gummo - 1997) EUA
Os amigos Tummler (Nick Sutton) e Solomon (Jacob Reynolds) navegam pelas ruínas de uma cidadezinha devastada por um furacão e habitada por criaturas deformadas, perturbadas e pervertidas. Os jovens passam o tempo aprontando ou se drogando. Em outro lugar, Bunny Boy (Jacob Sewell) é intimidado por crianças com a metade de sua idade e as irmãs Dot (Chloe Sevigny) e Helen (Carisa Glucksman) tentam escapar de um pedófilo.