sexta-feira, 8 de março de 2013

Eu Existo (Jestem)

"Eu Existo" (2005) entrou para minha lista dos filmes mais belos que vi. É daqueles que chegam devagarinho, e ao final ficamos completamente absorvidos pela história. É de uma delicadeza poucas vezes vista no cinema, é triste, mas ao mesmo tempo singelo e inocente. É existencialismo puro.
Um menino na faixa dos dez anos se vê perdido diante ao fato de não ter ninguém no mundo, ele tenta encontrar seu lugar, mas sem muito sucesso. De início o vemos no orfanato sendo ridicularizado pelos amigos, ele não entende o porque de estar lá, já que tem uma casa e uma mãe. Ao fugir e retornar ao seu lar encontra sua mãe, uma prostituta alcoólatra repleta de problemas, eles acabam brigando e o menino sai correndo. Sem ter para onde ir e o que comer, ele vaga até encontrar um velho barco abandonado em frente a casa de uma família rica, e se estabelece lá. Ele passa os dias pensando na vida e vendendo toda a sucata que consegue para obter seu alimento. O filme começa a ficar realmente bonito quando o menino é descoberto pela garotinha da casa, ela se sente exatamente igual a ele, mesmo tendo todo o conforto. Sua irmã mais velha e muito linda, de certa forma sente ciúmes da amizade e amor que cresce entre os dois, e é ela que definirá o rumo da história. Kuleczka, a jovenzinha sente-se feia e bebe escondida, Kundel, o garotinho abandonado não se mistura com os outros meninos de rua, pois estes usam drogas e vivem se metendo em encrencas. É difícil encontrar um lugar no mundo quando não há ninguém que o direcione e o ame, se sentir excluído de tudo como se fosse um animal, um inútil. Há cenas grandiosas, das quais mexem com nosso coração.
Kundel sobrevive de vender sucatas e numa de suas idas ao lugar o velho quer pagá-lo dando vários gatinhos, mas o menino se recusa, pois não há comida nem para ele, quando ele retorna e pergunta dos bichinhos o velho lhe diz que os afogou no rio, o menino pergunta o porquê e o homem responde que ninguém precisava deles, não tinha serventia alguma. Então, Kundel pensativo diz: "Por que não me afoga, você também não precisa de mim". É tão espontâneo que esse momento nos arranca tanto o choro como o sorriso.
Com o tempo as duas crianças se aproximam mais, fazem confidências e conversam sobre um possível futuro, o que esperam para si em um mundo do qual não pertencem. Kundel tenta mais uma vez ir ao encontro de sua mãe, mas ela o rejeita da pior forma. Arrasado volta para o único mundo que tem, junto de sua amiga especial. Ele chora ao lado dela e pergunta o que fez para que sua mãe não gostasse dele, a menina simplesmente diz: "Você existe!".

Kuleczka leva todos os dias um sanduíche a Kundel, este espera ansioso pela sua chegada, a sua única companhia, a pessoa que gosta dele e o entende, numa dessas ao morder o lanche encontra um bilhetinho escrito: "Eu Te Amo". O sorriso dele diante a frase é inexplicável, é o amor no seu estágio mais puro e inocente. Amar pelo simples fato da pessoa existir.
Outro ponto positivo vai para a fotografia que dá o toque de solidão que o filme possui, os atores mirins são incrivelmente naturais, é bonito ver crianças atuando desta forma, pois o brilho do olhar diante a câmera ainda possui aquela inocência, as sutilezas, como o sorriso de canto de boca de Kundel quando se sente feliz, pois alegria é uma estranha pra ele. O fim é triste, mas dotado de uma beleza muito peculiar, percebemos que o menino encontra seu lugar ao afirmar que ele existe, mesmo que o mundo não o perceba, há quem o ame e isso é o que dá a certeza de sua existência.

Essa é daquelas histórias pequenas e simples que nos edifica e nos faz querer ser melhores uns com os outros, vivemos num mundo onde ninguém se importa com ninguém, onde crianças são rejeitadas por suas mães e nem todas conseguem achar seus caminhos, a inocência se perde e a vida se torna insuportável cedo demais, pois o valor de alguém é medido pelo status, beleza, sociabilidade, sobrenome, essa é a única realidade aceitável, as outras são invisíveis e esquecidas.
É por isso que vale a pena assistir filmes bons que nos acrescentam algo, que ficará guardado com muito carinho na memória. "Eu Existo" é filme para rever durante o decorrer da vida, é sutil e leve ao tratar de um tema tão triste, a dificuldade de se descobrir perante ao mundo e se afirmar mesmo que este o rejeite.

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