Mostrando postagens com marcador 1991. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador 1991. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

The Doors

"Quando as portas da percepção forem abertas, veremos tudo como realmente é: infinito." 
(Citação de William Blake, que por sua vez  Adouls Huxley se inspirou para escrever "As Portas da Percepção", e da qual Morrison tirou o nome da banda.)

"The Doors" (1991) dirigido por Oliver Stone (Assassinos por Natureza - 1994) é uma biografia musical de Jim Morrison, a voz e a alma dos Doors, um homem que marcou várias gerações e que ainda hoje nos faz interrogar se algum dia alguém o conheceu realmente. A história retrata a ascensão e a decadência de Jim, mostra sua passagem pelo conturbado mundo do rock´n roll, onde as drogas e o sexo reinavam. 
Para quem deseja conhecer mais um pouco sobre o ídolo o filme é ótimo, ele destaca os seis últimos anos de Morrison, Val Kilmer encorporou Jim de forma visceral, em muitos momentos ele está idêntico, além de cantar divinamente. Suas performances sem dúvidas são a alma do filme. 
O filme começa retratando Jim quando criança testemunhando um acidente de caminhão envolvendo índios, esse episódio o marcará e inclusive ele terá visões de um xamã por toda a sua trajetória. Em 1965, Jim e seu amigo Manzarek (Kyle MacLachlan) estudam cinema, também conhece sua musa inspiradora Pamela Courson (Meg Ryan), Jim se dedica a escrever poemas e letras de músicas, ao mostrar uma delas a Manzarek, este fica encantado e dá a ideia de formar uma banda, se juntam a eles Robby Krieger (Frank Whaley) e John Densmore (Kevin Dillon), as letras vão nascendo e o contrato com a Elektra Records surge, logo o sucesso chega, a banda ganha status na contracultura, o espírito da época é maravilhosamente bem delineado e somos absorvidos pela atmosfera hippie. As passagens em que mostram os integrantes viajando com LSD é outro ponto de destaque. O sucesso engole Jim, o excesso de álcool, drogas, o relacionamento conturbado com Pam, a infidelidade de ambos renderam brigas épicas que beiravam à loucura, ela também tinha atitudes autodepreciativas apesar de sua personalidade espontânea de início, ela se afundou junto de Jim.
Para quem é fã talvez sinta falta de um aprofundamento, mas devido diversas inviabilizações, como o tecladista Manzarek ter sido contra o filme e outras dificuldades de produção, só após 20 anos de tentativas que o longa surgiu com o protagonismo de Val Kilmer, papel que antes estava destinado a John Travolta, o fato é que mesmo diante de muitas licenças poéticas, a história consegue cativar e dar uma ideia do que foi a loucura da época, o sucesso surreal da banda, a genialidade de Jim, que era cheio de habilidades no palco, sexy, contestador e enfeitiçava o público com suas letras melancólicas, viajadas e fascinantes improvisos.  

O baterista John Densmore em vários momentos enfrenta Jim e o alerta para o uso desenfreado de drogas, de que o intuito era usar para expandir a mente e não como modo de fuga, também retrata a genialidade de Manzarek, que era tão importante quanto, pois era o responsável pelo som psicodélico da banda, os integrantes não são tão explorados, mas dá pra ter noção do quão grande era a figura de Morrison, o frenesi em torno de si e o quanto isso o deixava vulnerável, precisando cada vez mais ser adorado. Outra personagem interessante é a jornalista Patricia (Kathleen Quinlan), adepta de rituais de bruxaria, há uma cena muito doida em que bebem sangue e dançam alucinadamente.

"The Doors" é uma boa introdução à vida de Morrison e aos Doors, uma das bandas mais explosivas do final dos anos 60 e começo dos 70, Jim, acima de tudo, era um poeta e buscava a si mesmo, para isso encarava a dor e flertava com a morte. No final, em torno de tantas polêmicas e acusações caiu numa profunda depressão, sua morte é envolta em mistérios e boatos até hoje, a verdade não sabemos, mas o que importa é o seu legado magistral e imortal.

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Garotos de Programa (My Own Private Idaho)

"Garotos de Programa" (1991) dirigido por Gus Van Sant (Inquietos - 2011, O Mar de Árvores - 2015) retrata de maneira dura, porém sensível a marginalização da juventude do final dos anos 80, o abandono e a carência de garotos que se prostituem, usam drogas e contestam às normas da sociedade. Terceiro longa de Gus Van Sant, que mais tarde viria a se tornar um colecionador de sucessos, já aponta neste suas fortes características com temas polêmicos abrangendo o universo da juventude atrelados a uma inteligente carga emotiva, a energia desse longa é especialmente única, dado o que se sucedeu ao ator River Phoenix anos depois, é uma experiência amarga e afetuosa acompanhar a jornada de seu personagem, ao final só desejamos abraçá-lo e acolhê-lo.
Mike (River Phoenix) e Scott (Keanu Reeves) são dois jovens garotos de programa que moram nas ruas de Portland, Oregon. Os dois fazem parte de um grupo de libidinosos excluídos sociais, que se juntam num prédio condenado para fazer tumulto e se venderem a quem esteja disposto a pagar por eles. Apesar de ambos serem insatisfeitos e perturbados, os dois garotos têm a personalidade bem diferente: Scott é rebelde e se prostitui para humilhar sua família, já Mike é um sonhador, um rapaz gentil que está apaixonado pelo seu melhor amigo, e quer encontrar a mãe. Juntos os dois se metem em diversas encrencas em viagens que vão do Idaho até a Itália para encontrar a mãe de Mike.
É impressionante que o que poderia soar algo vazio, graças a sincera composição de personagem de River Phoenix o roteiro ganha tons profundos e ternos, acompanhamos especialmente dois desses garotos que vivem à margem da sociedade, habitam prédios abandonados, colecionam histórias bizarras de programas sexuais, famílias disfuncionais e perdidos se apegam uns aos outros, Mike e Scott são dois amigos completamente diferentes um do outro, Scott é filho de um milionário e para contestá-lo se une aos mais pobres, se prostitui, arranja encrencas e apenas espera sua herança, Mike foi abandonado pela mãe, vaga de uma cidade à outra e se vira como pode, além de possuir narcolepsia, um distúrbio que o faz de repente cair no sono, seu desejo é reencontrar a mãe e para isso não mede esforços. Por ele ter esses surtos de sono somos inseridos a seus sonhos/memórias de forma lúdica, sequências que ajudam a criar empatia com o personagem. Com o passar percebemos sua paixão por Scott e numa das cenas mais sensíveis ele diz gaguejando e timidamente que o ama: "Eu consigo amar sem as pessoas me pagarem". Essa cena foi reescrita por River Phoenix com o apoio do diretor e é com certeza a passagem mais bonita e dotada de emoção. Há tanta fragilidade em seu personagem.

A história retrata jovens abandonados, a maioria de famílias disfuncionais, que desamparados se tornam rebeldes e não possuem opções na vida além da prostituição, se submetem à fetiches bizarros e situações de violência, não há saída a não ser sair por aí e vandalizar, gritar e procurar um pouco de afeto, Scott poderia ter amor se quisesse, mas seu único desejo é humilhar o pai milionário, por pura diversão se alia a esses garotos, enquanto Mike procura pela mãe, cujo passado ele mesmo molda, quando encontra o irmão podemos ter a certeza disso, seu anseio em encontrá-la é tão grande que ele vai de cidade em cidade com as pistas que acha aleatoriamente, inclusive chegando ir à Itália, local do qual Scott se apaixona e por consequência o faz retornar ao lar. O semblante de Mike se torna cada vez mais triste, se decepciona por Scott o abandonar e mais uma vez sozinho retorna às ruas. É cruel o que Scott faz, ele volta ao seu habitat e despreza os amigos de outrora, a rejeição é palpável em Mike, machuca vê-lo jogado sem perspectiva, sem afeto, sem absolutamente nada. A cena final é dilacerante!

"Garotos de Programa" é um filme cru e que tem na interpretação de River Phoenix seu maior triunfo, sua delicadeza tira muito do peso da história, mas a melancolia está presente mesmo nas partes mais leves, a sensação do se sentir abandonado é imensa nesse filme, uma obra memorável e, que infelizmente, foi a última de River Phoenix.