quinta-feira, 30 de abril de 2020

Ares / Nada Ortodoxa (Unorthodox)

Segue a resenha de duas séries disponíveis no catálogo da Netflix que fazem a diferença entre a infindável lista de títulos. Confira:

"Ares" (2020) é uma série holandesa dirigida por Giancarlo Sanchez e Michiel ten Horn, com apenas oito episódios à primeira vista causa uma certa dúvida sobre seu tema que é focado em uma sociedade secreta composta pela grande elite do país, o seu desenrolar acaba enganando, mas aos poucos vai soltando pistas para então seu elaborado e inteligente desfecho. Misteriosa, sombria e fria fica a dica para os que estão interessados, se enveredem pela história sem saber muito, vale muito a pena imergir nas obscuridades e se surpreender ao final. 
Aviso: Poderá conter spoilers!
Uma sociedade estudantil secreta no coração de Amsterdã, onde os melhores amigos Rosa e Jacob se rendem a um mundo de riqueza e poder. Contudo, lentamente eles começam a perceber que entraram em um lugar demoníaco, construído sobre segredos do passado da Holanda. Um lugar onde o verdadeiro poder chega a um preço terrível.
Acompanhamos a protagonista Rosa (Jade Olieberg), uma estudante de medicina de origem humilde, mas que possui bastante ambição, ela encontra meios para subir quando se depara com Ares, uma sociedade secreta, através de seu melhor amigo Jacob (Tobias Kersloot), mesmo ele querendo afastá-la desse meio Rosa se interessa e adentra esse universo. Em sua casa possui a responsabilidade de cuidar da mãe mentalmente instável e seu pai se desdobra trabalhando como enfermeiro, na universidade se destaca e nas aulas sabe até mais que os professores, cansada da sua vida não pensa duas vezes quando é convidada a ir para Ares. Os membros são bizarros e sempre estão escondendo algo, todos são descendentes de famílias influentes da Holanda e lá dão seguimento à linhagem com seus ritos e regras, observamos a iniciação de Rosa envolvendo marcação na pele, submissão aos líderes e diversas privações, incluindo o mundo externo. A narrativa pode parecer confusa e extremamente lenta, mas compensa acompanhar todos os mistérios e cada camada proposta pela série, a partir de um ponto Rosa começa a vomitar um líquido preto, algo parecido com petróleo, os membros ficam chocados com a rapidez da ascensão de Rosa na sociedade, o vômito é um signo importante, descobrimos então que ele significa a culpa, enquanto isso Jacob adentra os meandros do local e cada vez mais descobre a origem dessa sociedade e a sua própria, sua confusão mental aumenta quando ao tocar uma parede é consumido e seus dedos ganham o mesmo aspecto do líquido e do qual lhe dá um poder, além de que neste espaço há um poço que vive uma criatura denominada Beal que se alimenta dessa substância. As perguntas não cessam em nossa mente e é só no final que entendemos que a série toca num assunto muito sério, o imperialismo holandês, as grandes conquistas através da exploração e escravidão dos negros, Rosa percebe que precisa se entregar e se tornar o próprio Beal, para assim acabar com Ares e fazer justiça. Realmente ela propõe reflexões contundentes do como a Holanda, um país tão pequeno se tornou tão rico rápido, do como o poder se perpetuou por causa da escravidão e do sangue negro derramado, Rosa é o símbolo da mudança e da verdade.

"Nada Ortodoxa" (2020) é uma minissérie alemã de quatro episódios dirigida por Maria Schrader e traz uma impressionante e libertadora história, reflete sobre o ultraconservadorismo da religião judaica, mas demonstra respeito às heranças culturais permeando com boas doses de conhecimento. 
Na intenção de escapar do casamento arranjado por seus pais em Nova York, Esther Shapiro (Shira Haas), uma jovem judia de 19 anos, resolve fugir para Berlim e começar uma nova vida. No novo país, ela passa a explorar a própria identidade e sexualidade para além dos valores religiosos com os quais cresceu. A história é inspirada no best-seller "Unorthodox: The Scandalous Rejection of My Hasidic Roots", de Deborah Feldman, sobre a fuga de uma jovem judia de uma seita religiosa.
A protagonista é um alento para nosso coração, inserida em um meio completamente fechado cada vez mais sente necessidade de explorar o mundo e a si mesma, esse desejo aumenta quando depois do casamento arranjado a pressão constante para que engravide a torture dia após dia. Diante de um cenário castrador, como deixar suas aulas de piano, decide pegar os documentos que sua mãe lhe deu para a cidadania alemã e com a ajuda da professora de piano consegue fugir sozinha e sem nada em mãos - só para elucidar que sua mãe foi rejeitada pela comunidade e mora em Berlim com a esposa. Longe do meio em que vive Esther se deslumbra ao mesmo tempo que sente receio por seu futuro, logo de cara consegue fazer amizades e se encaixar num grupo de músicos de orquestra, ela ama música e mais adiante até consegue fazer uma audição no conservatório, sua vida começa a tomar seu próprio destino mesmo entre tantas dificuldades, sente que a liberdade de ser é prazerosa e que não precisa sentir culpa por isso. Os amigos lhe ajudam nesse processo, alguns mais do que outros, e daí surge a mudança que começa externamente na retirada da peruca para então se tornar mais confiante e decidida. O que torna seu rito de transformação ainda mais desafiador é por estar num local cheio de histórias traumáticas para sua comunidade de descendentes de judeus sobreviventes ao Holocausto, aliás a série aborda seriamente a respeito da religião e suas regras, principalmente sobre o pensamento de que eles precisam se manter unidos e passarem de geração em geração a dor de sua história para que isso nunca se perca. É um choque para Esther, mas ela é uma alma livre e que necessita conhecer-se, viver para entender-se. É realmente muito sensível sua trajetória e traz à tona costumes e tradições culturais que são representados com cuidado e também revela o outro lado, o do poder de escolha, da ponderação, da empatia e da liberdade. Apaixonante!

sexta-feira, 24 de abril de 2020

Vivarium / Devorar (Swallow)

Segue a resenha de dois filmes bizarros e muito interessantes que não poderiam estar de fora do catálogo aqui do blog, continuarei fazendo postagens conjuntas, pois assim se torna mais fácil administrar meus pensamentos e continuar na ativa. Confira:

"Vivarium" (2019) dirigido por Lorcan Finnegan (Sem Nome - 2016) é um filme que aborda de maneira peculiar a vida doméstica, os papéis e estereótipos que cada um carrega dentro desse modelo, as responsabilidades da maternidade, os compromissos da paternidade e o truque do tempo que absorve o cotidiano e faz envelhecer. É uma proposta criativa que prende o espectador junto da armadilha montada. 
Aviso: Poderá conter spoilers!
Quando o casal de noivos Tom (Jesse Eisenberg) e Gemma (Imogen Poots), à procura da casa perfeita para começar a vida juntos, conhecem um estranho corretor imobiliário, eles não pensam duas vezes quando são apresentados à Yonder, uma misteriosa vizinhança suburbana de casas idênticas. No entanto, logo eles vão perceber que estão presos em um pesadelo - tendo que criar uma criança de outro mundo.
Acompanhamos o jovem casal Tom e Gemma que pretendem iniciar uma vida juntos, numa visita a um empreendimento chamado Yonder são surpreendidos por Martin, um vendedor robótico e de sorriso contínuo, animados com a proposta vão até esse conjunto habitacional e se deparam com uma imensidão de casas iguais, inicialmente parece um sonho, mas aos poucos percebem não ser bem o que querem, mas Martin sumiu e ao tentarem sair não conseguem, sempre voltam para o mesmo lugar, cansados decidem ficar, mas por fim terminam num loop infinito, ainda mais quando do nada aparece uma caixa com um bebê dentro indicando que precisam criá-lo, daí a repetição se dá e rapidamente o vemos crescido com comportamentos bizarros, como imitar os trejeitos de Gemma e Tom, ele grita ininterruptamente quando quer ser alimentado, um show de horrores que perturbam o casal e os desestruturam psicologicamente. Tom entra numa espiral de que precisa cavar um buraco no quintal para que quem sabe ache uma saída, e Gemma aterrorizada com a criança sempre diz que não é a mãe dele, mas acaba o protegendo em muitos momentos, esse local perfeito é irritantemente falso, desde a grama ao céu com suas nuvens redondinhas, claro que percebemos que estão presos sendo cobaias, talvez de alienígenas que estão estudando e reproduzindo comportamentos, interessante que na superfície tudo parece ser idêntico, mas as emoções são mimetizadas, a história abarca questões sobre o conceito familiar, a estrutura frágil e rotineira, os papéis desempenhados para dar algum sentido, os filhos preenchendo o espaço e tomando toda a energia para no fim envelhecidos e sozinhos morrerem. É um filme estranho que gera agonia pela sua repetição, mas que faz pensar nos padrões estabelecidos, e que por mais que se quebre muitos deles ainda assim sem perceber copia-se e repete-se a grande maioria.

"Devorar" (2019) dirigido por Carlo Mirabella-Davis é uma obra repleta de camadas, um filme aparentemente bizarro, mas que disserta sobre questões femininas, do como a mulher é ainda vista, sobre seu suposto papel dentro da família e suas supostas obrigações, surpreendente o como a história te leva para meandros psicológicos angustiantes e reflexivos. 
Hunter (Haley Bennett) é uma dona de casa que engravidou recentemente e se vê cada vez mais viciada em se alimentar de objetos perigosos. Enquanto o marido e a família reforçam o controle sobre sua vida, Hunter deve enfrentar o segredo sombrio por trás de sua nova obsessão.
Acompanhamos Hunter e sua vida aparentemente perfeita, casada com o rico Richie (Austin Stowell), também convive com os sogros (David Rasche), (Elizabeth Marvel), a imensa casa é cuidada por ela e segue seus dias solitária e invisível, Hunter não possui voz própria nesse meio que está inserida, seus desejos são tolhidos, a expectativa da família é que ela engravide. Hunter é uma mulher infeliz e que por traumas passados conduz sua existência de maneira submissa, aos olhos do marido quer ser prefeita, foi ensinada a agradar, mas chega em um determinado momento que ela adquire uma compulsão em engolir objetos, como agulhas, bolinhas de gude, tachinhas e pilhas, ela gosta de sentir as texturas em sua boca e não o ato em si, como diz para a psicóloga contratada pela família após descobrirem no ultrassom que tinha outras coisas além do bebê em sua barriga. A gravidez indesejada só amplia suas angústias, aumenta a vontade de engolir os objetos e quando expelidos os guarda como um troféu, além disso traumas passados vêm à tona, despertam nela sentimentos perturbadores, ela pensa no como veio ao mundo, na complexidade de sua existência e sua inadequação naquela família que a tem apenas como uma boneca pronta para agradar-lhes.
Melancólico e sensível retrata a opressão que a mulher sofre para realizar as expectativas dos outros, a falta de controle sobre si mesma desencadeou sua compulsão, que não só faz paralelo com a gravidez, mas o ato de engolir e expelir e de guardar o objeto como um troféu seria um tipo de controle secreto, um desejo seu satisfeito, algo só dela. O filme amplia essas questões quando o trauma é inserido no contexto e percebemos que para ela sair dessa prisão é preciso muito mais do que foi retratado, mas com certeza um começo, resolver as pendências e se olhar com mais carinho, deixar o meio que a oprime e seguir livre. Além da originalidade da obra, sua estética e trilha sonora são incríveis e só agregam para gerar o terror vivido pela protagonista. Um ótimo filme que abrange questões femininas com autenticidade e une a tristeza e a beleza em pequenas e intensas dosagens.

sábado, 18 de abril de 2020

O Poço (El Hoyo) / A Casa (Hogar)

Segue a resenha de dois filmes espanhóis disponibilizados pela Netflix, inclusive os mais vistos do streaming, e não é à toa, já que tocam em temas essenciais, especialmente porque dialogam com a atualidade sombria e incerta em que estamos vivendo, desigualdade social, desemprego, isolamento, ambição desenfreada, conflitos sociais, etc, temas que valem a pena refletir e que fazem um paralelo profundo com a realidade.

"Existem três tipos de pessoas: as de cima, as de baixo e as que caem."

"O Poço" (2020) dirigido por Galder Gaztelu-Urrutia é um filme essencial, principalmente por causa da situação atual em que vivemos, ele retrata de forma cru e provocativa o quanto o ser humano se torna uma besta quando enclausurado necessitando sobreviver, repleto de metáforas e simbolismos, mas também direto em diversos momentos, não é fácil acompanhar o lado perverso e faminto da sociedade, a ambição desvairada e a falta de empatia e humanidade, o caos obviamente se instala usando artifícios que fazem o espectador refletir na sua própria condição, no meio em que está inserido e na sociedade em geral.  
Dentro de um sistema prisional vertical, os presos são designados para um determinado nível e forçados a racionar alimentos a partir de uma plataforma que se move entre os andares. Uma alegoria social sobre a humanidade em sua forma mais sombria e faminta.
Goreng (Ivan Massagué) acorda e depara-se com uma situação desconfortável, ele está preso numa espécie de prisão que possui um poço infindável, do qual uma plataforma se desloca levando comida entre os andares, sua companhia é o estranho e escroto Trimagasi (Zorion Eguileor), na parede o número é o 48 e segundo calcula vai até o 132, a dupla no início trava uma troca de diálogo interessante e aos poucos descobrimos mais sobre o lugar, o funcionamento acontece a partir do nível zero com a plataforma abarrotada de alimentos, ela vai descendo e os confinados comem o quanto querem até que ela vá para o próximo, sendo proibido guardar qualquer comida consigo, se isso ocorrer imediatamente o local esquenta ou esfria, Goreng escolheu entrar nesse experimento por vontade própria com a intenção de parar de fumar e levou consigo o livro "Dom Quixote", já seu companheiro escolheu levar uma faca auto-afiante, o que indica que se precisar sobreviver tem uma aliada. O banquete servido daria para todos se alimentarem, mas o que acontece é que dominados pela fúria, ambição e medo se empaturram fazendo com que não sobre absolutamente nada para os andares inferiores, o que gera violência, caos e morte. Goreng de tempos em tempos se muda de andar e experimenta tanto a tranquilidade de ter o que comer quanto a dor da fome, quando ele encontra Iomoguiri (Antonia San Juan), uma das administradoras do local ela lhe diz que a ideia do experimento era perfeita, mas que as pessoas estragaram tudo e tenta convencer os que estão no andar de baixo a racionar para que chegue alimento até o final do poço, mas obviamente cada um pensa somente em si e devora todas as comidas. Esse pensamento de dividir entra na mente de Goreng e obcecado com Miharu (Alexandra Masangkay), a estranha personagem que desce na plataforma em meio a comida para tentar encontrar sua filha e também por causa do próximo companheiro em outro andar, Baharat (Emilio Buale), que está a apenas seis andares do topo, se afia ao ideal de ir descendo nível por nível convencendo que comam somente o necessário, obviamente a violência entra em cena e traz à tona o animalesco no seu ponto mais alto. O filme é excelente em manter o espectador curioso e aflito, mas especialmente acerta ao incutir reflexões particulares a cada um, seja elas de cunho religioso, político-social, ou com mensagens de esperança e transformação em seu final, são simbolismos que afetam de maneiras diferentes e ganham camadas profundas. 
"O Poço" revela um sistema de isolamento em que é inviável a ação coletiva e quando essa regra é quebrada para acontecer uma possível transformação se dá através da violência e muito sangue, dai a frase: "a solidariedade nunca é espontânea". Uma potente crítica a diferença de classes, onde a ganância e a indiferença do topo prejudica quem está muito mais abaixo, por exemplo, ficamos sabendo do número real de andares lá pelo fim, ou seja, a invisibilidade da extrema miséria que acaba indo pelo único caminho, o da violência e morte. Sem dúvidas, uma obra para ser assistida outras vezes para captar ainda mais nuances que conversam com a realidade. Filmaço!

"A Casa" (2020) dirigido por Àlex Pastor e David Pastor (Vírus - 2009) é um suspense magnético que aborda de forma primorosa a obsessão e a paranoia pelo poder e sucesso. 
Javier Muñoz (Javier Gutiérrez) é um executivo desempregado que é forçado a vender seu apartamento. Quando ele descobrir que ainda tem as chaves, ficará obcecado pela família que agora mora lá e decidirá recuperar a vida que perdeu, a qualquer preço.
O protagonista é um homem que não se conforma com sua atual condição, antes um publicitário de respeito, agora um reles homem sujeito a qualquer tipo de trabalho, vide o momento em que ele não percebe estar sendo designado para um estágio não remunerado por um antigo colega, essas situações humilhantes vão se aglomerando e Javier vai as guardando de modo frio, principalmente quando é obrigado a se mudar por não poder bancar mais seu luxuoso apartamento, a sua esposa não vê problema em se mudar para um lugar mais humilde e seu filho é retratado como um menino retraído e isolado do resto. Acompanhamos então a recusa de Javier a seguir um outro tipo de vida, primeiro que ele mente em relação a vender seu precioso carro e começa a stalkear os novos moradores de seu adorado apartamento. Acontece que Javier ainda possui as chaves desse local, pois quando despediu em seu carro a empregada ela as jogou em cima dele, diante desse cenário não pensa duas vezes e espera toda a família sair e se infiltra na casa alheia. Começa a surgir sentimentos de inveja e obsessão, Javier se adapta a rotina da família e capta as fragilidades e começa a seguir Tomás (Mario Casas), se aproxima dele no grupo do AA e mente, se torna amigável e confiável, nesse meio tempo cada vez mais se familiariza e continua a adentrar o apartamento, arquiteta intrigas e deixa a sua própria família à mercê, sendo indiferente a sua esposa e filho. Ele cria seu roteiro e é fiel a suas paranoias, brinca com a vida do outro, seu desejo é a posição de poder e se aproxima do lado que está no topo. O desenrolar é permeado por cenas tensas e que incutem pensamentos acerca da moral, a não aceitação de um homem antes bem remunerado - talvez nem tenha sido grande em sua profissão, o que tudo indica é que teve sorte e boas relações - tendo que lidar com a realidade palpável de trabalhar para sobreviver. Ele não aceita esse cenário e diante das circunstâncias seu desejo é ascender e para isso pouco importa os entraves. É frio, hediondo e execrável, a pessoa que experimenta estar lá em cima e cultiva em si a ambição e cobiça ávida jamais aceitaria estar abaixo. Sua mente não trabalha nesse universo. O filme causa polêmica porque não tem um desfecho julgador e que dê lições, simplesmente esse tipo de pessoa existe aos montes e raramente se dá mal, acumula-se relações, troca de favores e permanece nesse lugar mesmo que dê sinais de sempre haver transtornos, como a ótima cena final da torneira pingando.
"A Casa" é uma obra que retrata o cerne da inescrupulosidade, e por isso que é tão incômodo e provocativo, nosso desejo de juiz vem à tona, mas claramente sabemos que a justiça não existe para essas pessoas. Sem dúvidas, um ótimo exemplar para evidenciar o quão doentio é a ânsia que domina a ganância e a sede do poder de estar acima sem se importar com quem está ao seu lado, mesmo que essa pessoa seja o seu próximo mais próximo. Para pensar e muito!

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Perdrix / Aurora / Microhabitat

Segue a resenha de três filmes numa única postagem por eles terem características bem parecidas e também porque particularmente foram muito especiais e merecem um lugar no blog. Ultimamente por tantas coisas acontecendo me falta ânimo para atualizar esse espaço, mas espero que aquela vontade e empenho que tinha volte. Confira:

"Perdrix" (2019) dirigido por Erwan Le Duc é uma comédia dramática francesa peculiar que flerta com absurdos, mas que também consegue despertar emoções vívidas e graciosas, tem aquele elemento especial que nos faz ficar de coração preenchido e sorrir. 
Desde que a enigmática Juliette Webb (Maud Wyler) entrou em sua vida, Pierre Perdrix (Swann Arlaud) não tem sido mais o mesmo. Atingindo a sua rotina e modificando os seus dias como um meteorito emocional, a presença da moça fez com que, indiretamente, toda a família Perdrix repensasse suas vidas.
Acompanhamos a pacata e disciplinada rotina do policial Pierre na cidadezinha na belíssima região montanhosa dos Vosges, ele mora com sua mãe (Fanny Ardant), que possui um programa de rádio que fala sobre amor, seu irmão (Nicolas Maury), que ensina a importância das minhocas a um grupo de crianças, e sua sobrinha (Patience Munchenbach), isolada e sempre desejando ir embora do local, essa família um tanto estranha é repleta de coisas não resolvidas e preferem não expô-las e continuar vivendo sob um véu de ilusão confortável, Pierre literalmente cuida de todos e segue a risca sua rotina, até que Juliette aparece quando seu carro é roubado por nudistas anarquistas que vivem em meio a floresta, impaciente com os protocolos decide agir e gruda em Pierre desnorteando toda a sua maneira de pensar. Essa mulher peculiar não pensa para falar e ao se inserir na vida da família de Pierre balança a frágil estrutura, mas ela também tem seus medos e vemos isso através da angústia em perder suas lembranças, que estão todas anotadas em cadernos, dos quais se encontram no carro roubado, são dois opostos, enquanto um não quer experimentar e viver, como diz: "O cotidiano é a única coisa que não decepciona", já ela por sua vez, prova a si mesma que viveu anotando tudo como se assim tivesse a certeza de que não perderia nada da vida. O relacionamento cresce de uma forma orgânica e muito poética, lentamente os dois terminam se complementando. 
"Perdrix" é um longa aconchegante e interessante, além de seus cenários naturais serem um encanto, e também os atores que elevam o nível de peculiaridade, Swann Arlaud e Maud Wyler garantem momentos curiosos e bonitos. 

"Aurora" (2019) dirigido por Miia Tervo é um drama finlandês sensível, bonito e que possui passagens memoráveis e uma protagonista que brilha aos nossos olhos, nos encantamos por Aurora e torcemos para que ela supere os problemas, a empatia e identificação é inevitável. 
Sempre com medo de se comprometer seriamente a qualquer pessoa, Aurora (Mimosa Willamo) é fanática por festas, mas percebe que essa prática está desgastando-a com o tempo. Depois de esbarrar com um rapaz que tem fobia da morte, ela percebe que eles dois podem aprender a superar seus traumas juntos de maneiras diferentes.
Aurora segue sua vida de maneira incerta, trabalha como manicure e vive em festas, tem sérios problemas com álcool e tudo se agrava quando é despejada e seu pai alcoólatra é internado, ela sonha em se mudar da Finlândia, mas a falta de dinheiro e oportunidade a afasta desse sonho, tentando se virar arranja um emprego cuidando de uma senhora bem engraçada e de mente aberta, desse modo vamos juntos de Aurora que se afunda cada vez mais e não enxergando de fato seu problema com a bebida, seu escape é um grande monstro a engoli-la. Nesse entremeio há o personagem Darian (Amir Escandari) e sua filha de nove anos que sonham em poder morar legalmente no país, eles moram numa casa que acolhe temporariamente imigrantes, numa noite Darian conhece Aurora numa lanchonete, ela lhe paga o restante que faltava para o lanche e numa conversa aleatória a pede em casamento para obter o visto, mas obviamente recusa, só que mais tarde ela oferece uma outra ideia, que por três mil euros arranjaria uma esposa finlandesa. A vemos muito perambular pelas ruas, no frio congelante, bebendo e cambaleando de salto alto na neve, dando festa na casa da senhora que cuida, se expondo a situações perigosas e travando meios que talvez a tirem desse buraco, Darian surge como um alívio em sua vida, mas é lentamente que essa relação toma forma e Aurora se dá conta da paixão, é realmente muito orgânico e sensível. O filme mesmo carregando momentos pesados tem uma leveza especial, terna e empática, não é difícil se identificar em muitas partes e torcer pela personagem, aliás uma composição linda e potente de Mimosa Willamo, uma tour de force que destrói o psicológico, mas também possui tons de humor que são um tanto curiosos, talvez pela expressão cultural do país.
"Aurora" é um filme apaixonante, carregado de questões interessantes, como os estereótipos que se cria em cima de imigrantes, o alcoolismo e o processo do entendimento desse problema, a sensação de inquietação pela falta de oportunidades, perdas e a solidão.

"Microhabitat" (2017) dirigido por Jeon Go-Woon é um filme sul-coreano simples, mas imenso, retrata pequenas grandes paixões que nos movem, no cotidiano chato e cada vez mais competitivo encontrar alívio nessas coisas que amamos, sem dúvidas, é o que dá sentido à vida. São coisas particulares a cada um e que podem parecer errado e desprezível a muitos. A protagonista é gigante em cena, aliás o filme propõe o exercício da quebra de julgamentos, até porque todos temos nossos pequenos vícios, esses que somente a nós cabe decidir se nos faz bem. Mais uma vez uma personagem de fácil identificação e que amplia nossos horizontes de pensamentos. Melancólico e extremamente sensível acompanhamos a rotina de Mi-So (Esom), que trabalhou como doméstica nos últimos 3 anos e ganhou 45 mil won (US$ 40) por dia. Mi-So adora beber Whisky e fumar cigarros. Seu namorado é Han-Sol (Ahn Jae-Hong) e ele quer se tornar um escritor de webtoons. Mesmo que Mi-So seja pobre, ela está feliz enquanto tem Whisky, cigarros e seu namorado. Infelizmente, os preços dos cigarros aumentam no primeiro dia do novo ano. Mi-So tem que dar algo e ela decide desistir de seu apartamento. Então, inicia-se uma peregrinação, ela contata antigos amigos, dos quais formavam uma banda, ela dorme um tempo na casa de cada um, mas aos poucos percebe que é um incômodo e que todos mudaram sua personalidade, aderiram ao sistema e estão infelizes, a cada porta que bate tem uma surpresa e é tratada de variadas formas, desde desprezo, julgamentos e falsa simpatia. Mi-So dispõe ainda de uns trocados e tenta arranjar uma casa bem longe da cidade, mas o preço exorbitante a desanima e mesmo os piores lugares, como cubículos sujos são caros, desse modo decide gastar com o que faz sentido para si, mas com o aumento do cigarro e Whisky e a partida do seu namorado em busca de uma melhoria financeira se entristece e se torna ainda mais marginalizada, vemos que ela seguiu pelo caminho que lhe falava o coração e foi fiel a sua personalidade, não se vendeu e modificou para agradar e se inserir num processo que capitaliza absolutamente tudo. É muito fácil julgar o caminho dos outros, especialmente àquele que se torna à margem de tudo, mas se faz sentido para si é o que importa, afinal o que resta a cada um é esses pequenos prazeres, como no caso de Mi-So, cigarro e Whisky.
"Microhabitat" é uma obra singela que mostra uma personagem que não tem vergonha de seus vícios e de suas escolhas, que segue ignorando o julgamento alheio até porque entende que a pessoa que julga decepou inúmeras particularidades para se tornar algo que quase sempre não escolheu. É o retrato da desigualdade e o impacto da cultura do consumo, da naturalização do ter e não do ser. Filme simples, mas que carrega em si um gigantesco significado. Lindo!

sexta-feira, 10 de abril de 2020

11 Filmes Sobre Confinamento

Segue uma lista de filmes que retratam o confinamento, em sua grande maioria histórias em que o medo vem pelo que surge de fora, mas também por aquele que vem de dentro de si mesmo. Alguns deles conversam muito com o momento tão confuso e angustiante em que vivemos evidenciando aspectos político-sociais e colocando-nos a refletir no que virá.

11- "Pontypool" (2008) Canadá
Os membros de uma equipe de rádio numa pequena cidade isolada no norte do continente americano, entram em contato com um surto de violência estranho. Comunicando-se a distância, rapidamente compreendem que estão sendo cercados e que a agressividade geral é provocada por um estranho vírus que se propaga pela linguagem.

10- "A Noite Devorou o Mundo" (La Nuit a Dévoré le Monde - 2018) França
Quando acorda pela manhã, neste apartamento onde ainda ontem acontecia uma grande festa, Sam precisa aceitar os fatos: ele está sozinho e mortos-vivos invadiram as ruas de Paris. Aterrorizado, ele precisa se proteger e se organizar para continuar vivo. Mas Sam é realmente o único sobrevivente? O filme não faz questão de entregar respostas ou esclarecer o acontecimento, o que de fato importa é a reflexão que a história proporciona ao colocar uma pessoa totalmente sozinha tendo que lidar com uma situação completamente desconhecida e usando criativamente maneiras de sobreviver, até certo ponto Sam consegue se estabelecer e manter uma rotina, mas com o passar dos dias a solidão extrema entrega indícios de paranoia e desespero, sua mente se torna confusa e sua ânsia de sair do prédio é grande e se manifesta de modo caótico. Saiba+

09- "Bug" (2006) EUA
Agnes White (Ashley Judd) é uma garçonete solitária, que escapou de seu ex-marido Jerry Gross (Harry Connick Jr.), recém-saído da prisão. Ela vive em um hotel de beira de estrada e é apresentada por R.C. (Lynn Collins), sua colega de trabalho, a Peter Evans (Michael Shannon), um veterano da Guerra do Golfo. Peter é obcecado por insetos e logo se relaciona com Agnes. Porém ela passa a viver um pesadelo claustrofóbico quando diversos insetos começam a invadir sua vida. "Bug" faz um aprofundamento na mente de duas pessoas fragilizadas que se unem numa única loucura. A paranoia é contagiosa, ainda mais quando a situação real é um mar de perguntas sem respostas. Saiba+

08- "Agoraphobia" (Phobidilia - 2009) Israel
Depois de sofrer um colapso nervoso, um jovem decide abandonar a caótica vida urbana e nunca mais sair de seu apartamento. Ele logo descobre que no mundo atual tudo de que ele precisa pode ser facilmente conseguido: sexo pela internet, entrega de comida, entretenimento na televisão. Anos depois, essa existência idílica sofre um baque quando ele é informado que o apartamento está prestes a ser vendido. O filme não explica os motivos de sua fobia, apenas a retrata, há muito desespero, agonia e alucinações, ele mesmo diz que quando se está por muito tempo sozinho nada mais parece real. Sua única companhia é Albert, o gato, e seu lazer é o jardim, que lhe dá o prazer de ver o pôr do sol. Saiba+

07- "A Hora do Lobo" (The Wolf Hour - 2019) EUA
Uma ex-celebridade nos EUA corta totais relações com o mundo exterior após os crimes cometidos pelo serial killer David Berkowitz, em 1977. Agora vive isolada dentro de um apartamento no Bronx. Tudo muda quando uma pessoa misteriosa começa a atormentá-la.

06- "Expresso do Amanhã" (Snowpiercer - 2013) Coreia do Sul/EUA/França
Quando um experimento para impedir o aquecimento global falha, uma nova era do gelo toma conta do planeta Terra. Os únicos sobreviventes estão a bordo de uma imensa máquina chamada Snowpiercer. Lá, os mais pobres vivem em condições terríveis, enquanto a classe rica é repleta de pessoas que se comportam como reis. Até o dia em que um dos miseráveis resolve mudar o status quo, descobrindo todos os segredos deste intrincado maquinário.

05- "No Topo do Poder" (High-Rise - 2016) UK
Adaptado do livro futurista de J.G. Ballard publicado em 1975, retrata uma sociedade estruturada numa torre de condomínio gigantesca, projetada para isolar seus moradores do mundo exterior. Porém, o que era para ser o local perfeito para viver, uma guerra entre classes acontece, recriando um novo mundo governado pelas leis da selva.


04- "O Abrigo" (Take Shelter - 2011) EUA
Curtis LaForche (Michael Shannon) mora numa pequena cidade de Ohio com a esposa Samantha (Jessica Chastain) e sua filha de seis anos, que possui uma deficiência auditiva. Os dois trabalham pesado para juntar o dinheiro para suprir as necessidades especiais da filha, mas mesmo passando por algumas dificuldades, eles podem dizer que são felizes. Isso começa a mudar quando Curtis passa a ter pesadelos com uma tempestade apocalíptica e começa a ficar obsessivo. Ele constrói um abrigo no quintal e desperta a preocupação da esposa e a desconfiança dos amigos e colegas de trabalho. O filme prima pelo roteiro inteligente e pela ótima atuação de Michael Shannon, é um drama surpreendente que hipnotiza e nos incomoda psicologicamente. Saiba+

03- "Ao Cair da Noite" (It Comes At Night - 2017) EUA
Paul (Joel Edgerton) mora com sua esposa e o filho numa casa solitária, misteriosa, mas segura, até que chega uma família desesperada procurando refúgio. Aos poucos a paranoia e desconfiança vão aumentando e Paul vai fazer de tudo para proteger sua família contra algo que vem aterrorizando todos. Um filme que explora de maneira eficaz a desconfiança, o medo, a paranoia; um exemplar que usa de poucos artifícios para gerar desconforto e muita tensão. Saiba+

02- "A Luz no Fim do Mundo" (Ligh of My Life - 2019) EUA
Em uma realidade pós-apocalíptica, onde quase toda a população feminina foi devastada, um pai (Casey Affleck) precisa proteger sua filha (Anna Pniowsky) do caos que se espalhou pela sociedade. Ela é a única menina sobrevivente de que se tem notícia e, mesmo dez anos após a pandemia que tirou a vida de todas as mulheres, incluindo sua mãe (Elisabeth Moss), Rag e seu pai ainda precisam lutar diariamente por sobrevivência. Toca em temas como luto, paternidade, amadurecimento, realidade violenta e amor, além de mostrar que independente de qualquer coisa o pai precisa deixar a filha escolher seu caminho e deixar sua personalidade fluir, também é reflexivo e simbólico ao colocar com sensibilidade o quão desequilibrado, caótico e violento se torna o mundo sem a figura feminina. Saiba+

01- "O Poço" (El Hoyo - 2020) Espanha
Dentro de um sistema prisional vertical, os presos são designados para um determinado nível e forçados a racionar alimentos a partir de uma plataforma que se move entre os andares. "O Poço" é uma alegoria social sobre a humanidade em sua forma mais sombria e faminta. Conversa muito com o momento em que vivemos, a solidariedade e a mudança nunca será espontânea, as metáforas e simbologias do filme são exemplares em relação as classes sociais e de um modo grosso e cru expõe com imagens e diálogos inteligentes, para que fique bem claro, já que a sensibilidade está fora de questão nesse processo de mudança. Filmaço! Saiba+

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Retrato de uma Jovem em Chamas (Portrait de la Jeune Fille en Feu)

"Retrato de uma Jovem em Chamas" (2019) dirigido por Céline Sciamma (Tomboy - 2011) é um filme extremamente belo e sedutor visualmente e narrativamente arrebatador. Uma obra-prima delicada repleta de sutilezas.
Na França do século XVIII, Marianne (Noémie Merlant) é uma jovem pintora que recebe a tarefa de pintar um retrato de Héloïse (Adèle Haenel) para seu casamento sem que ela saiba. Passando seus dias observando Héloïse e as noites pintando, Marianne se vê cada vez mais próxima de sua modelo conforme os últimos dias de liberdade dela antes do iminente casamento se veem prestes a acabar.
Ambientado na França do século XVIII acompanhamos a história da pintora Marienne que é contratada para realizar o retrato da jovem Héloïse, prometida em casamento a um italiano, contrariada se recusa a posar a qualquer pintor que se aproxime, o fato é que a obrigação do casamento a perturba demasiadamente, pois a noiva seria sua irmã, mas devido um "acidente" ela precisou ocupar este lugar. A condessa, mãe de Héloïse diz a Marianne para se aproximar de forma cautelosa e a princípio como uma dama de companhia para assim conseguir captar os traços e conseguir pintá-la. É montado um improvisado estúdio num salão que disfarçou como um quarto e entre os lençóis pendurados coloca seus materiais. Nesses passeios a observação e os olhares ganham uma força primorosa, o filme nos arrebata pelas sensações dos pequenos gestos, pelos detalhes de cada cena, tudo quer dizer algo e faz diferença para o desenrolar. Marianne se esforça para capturar e imaginá-la posando em sua frente, mas após o quadro finalizado ela decide dizer o real motivo de sua estadia ali, a condessa concorda e Héloïse ao ver seu retrato não gosta por não ter verdade. Decidida a posar para Marianne, a relação vai ganhando camadas e mais íntimas se tornam quando se veem sozinhas nesse local tão remoto, também nesse tempo estreitam o laço com a empregada Sophie (Luàna Bajrami), que se vê precisando de ajuda num determinado ponto.
Um filme marcante, silencioso e muito imersivo, seja pelos olhares sutis, o desejo aflorando, as pinceladas e a arte nascendo, assim como a  intensidade da intimidade, as conversas que iluminam, a cumplicidade entre elas, sequências que enchem os olhos tamanha a beleza, como os poderosos cenários naturais destacando a melancolia. O romance foge completamente das fórmulas e entrega com verdade a situação, pois o amor entre duas mulheres nesta época é algo que jamais seria aceito. 

Apesar de ser um filme quieto, seus símbolos no decorrer acendem nossa atenção e nos faz entrar na história, as camadas de sentimentos, o desenvolvimento e o seu poético fim tão cheio de significados e intensamente apaixonado. As protagonistas são mulheres corajosas e resistentes mesmo tendo a consciência de seus destinos, não só Marianne e Héloïse, mas Sophie também, há importantes momentos em que a irmandade entre elas são evidenciadas e mostram o quão fortes são.

"Retrato de uma Jovem em Chamas" se inspirou no mito de Orfeu, possui a aura dos clássicos da literatura e a trama é pontuada por um concerto de Vivaldi, "Verão" de "As Quatro Estações", fascinante como deu completude à essa obra tão intensa e apaixonada.