quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

O Silêncio de Lorna (Le Silence de Lorna)

"O Silêncio de Lorna" (2008) dirigido por Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne (A Garota Desconhecida - 2016) possui uma linha naturalista quase documental, característica ímpar dos irmãos, neste há um elaborado roteiro que discute não só a problemática da imigração ilegal e a máfia da naturalização, mas também retrata o processo de entendimento sobre a culpa que a protagonista sofre no desenrolar. O cotidiano é exposto com crueza e não há espaço para melodramas, a atriz albanesa Arta Dobroshi realiza uma tour de force, o controle de suas emoções e sua conscientização do entorno gera um conturbado e dilacerante final.
Lorna (Arta Dobroshi) deseja se tornar sócia em uma lanchonete, junto com seu namorado. Envolvida em um esquema, aceita se casar com Claudy (Jérémie Renier), um dos capangas do mafioso Fabio (Fabrizio Rongione), apenas para adquirir a nacionalidade belga. Após certo tempo ela é obrigada a mais uma vez se casar, desta vez com um mafioso russo. Só que para que este novo compromisso seja selado, Lorna precisa se livrar de Claudy.
Acompanhamos o cotidiano de Lorna que está prestes a conseguir sua cidadania graças a um esquema do taxista Fabio (Fabrizio Rongione), que faz parte da máfia albanesa, assim como o namorado de Lorna, Sokol (Alban Ukaj), que na maior parte do tempo está distante agindo na Alemanha, o plano de casá-la a troca de dinheiro com um viciado em drogas dá certo, mas Fabio planeja reaver o dinheiro a casando novamente com um russo e garante a ela que haverá um adicional e então conseguirá abrir a lanchonete que tanto sonha, mas para isso acontecer Claudy precisa morrer, fazendo de Lorna uma viúva de cidadania belga e dessa forma podendo casar-se novamente e possibilitando dar a cidadania à outrem. Claudy luta contra o vício em drogas e se apega a Lorna, ela demonstra distância, seus interesses são outros, mas à medida que ele implora por sua ajuda algo nela começa a mudar, e não há nada mais difícil para um viciado do que pedir auxílio, o vendo nesse estado o acompanha na internação e nos dias que segue limpo. Fabio pretende que Claudy tenha uma overdose, mas Lorna não concorda com isso, mesmo o namorado dizendo a ela que esses tipos só amam as drogas, ela decide ir por outros caminhos e pede o divórcio alegando violência doméstica, ela se machuca e consegue até testemunhas para agilizar a sentença, Claudy fica chateado por ser visto como um agressor e por ela querer a separação. De alguma maneira Lorna tenta salvar Claudy do iminente perigo e a relação ganha formas surpreendentes e até afetuosas, Lorna ao longo deste esquema sujo vai se conscientizando de sua culpa e do dano que causará na vida da frágil figura de Claudy, que diga-se de passagem, composta por Jérémie Renier com muita veracidade e veemência.

Lorna apesar de estar envolvida num sórdido esquema possui princípios morais, por isso seu controle emocional e frio na maior parte do tempo, não quer se envolver com os problemas de Claudy, mas os dilemas vão se tornando maiores conforme vai descobrindo o que Fabio planeja para o vulnerável Claudy, o esquema é mais sujo do que imaginava e os meios que usou para conseguir sua cidadania vão se transformando numa grande culpa. Depois o desejo de abrir a lanchonete com o namorado a guiou para que acatasse o segundo casamento, mas as circunstâncias se tornam ameaçadoras e confusas, Lorna entra num turbilhão de sentimentos e desestabiliza todo o esquema de Fabio.

"O Silêncio de Lorna" é um filme que retrata a crueza da realidade sem espaço para floreios, não há trilha sonora pontuando, somente em seu final ao som de Beethoven, o que se sobressaí é o roteiro e seu maior triunfo está nas interpretações, o envolvimento gradativo e a empatia que surge garante um emaranhado de sentimentos e uma dolorosa experiência. 

Um comentário:

  1. Gosto dos trabalhos dos irmãos Dardenne.

    Este segue o estilo realista dos diretores, focando em tramas atuais com pessoas comuns que passam por situações complicadas.

    Dos vários que conferi da dupla, meu preferido é "Dois Dias, Uma Noite".

    Abraço

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