quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Os Irmãos Sister (The Sisters Brothers)

"Os Irmãos Sister" (2018) é o primeiro filme em língua inglesa de Jacques Audiard (Ferrugem e Osso - 2012), adaptado da obra homônima do escritor canadense Patrick DeWitt é um faroeste repleto de nuances e que consegue transpor todas as camadas reflexivas que o livro propõe. É melancólico, sombrio e também permeado por um humor negro. 
Eli (John C. Reilly) e Charlie (Joaquin Phoenix) Sisters são dois pistoleiros que recebem uma missão complicada: capturar e eliminar Hermann Kermit Warm (Riz Ahmed), um explorador de minas de ouro. Os assassinos perseguem o explorador através do deserto do Oregon, no entanto, Eli começa a ter uma crise de consciência sobre a carreira que leva. Para se salvar, Hermann pode se aproveitar dessa fraqueza momentânea e oferecer um acordo melhor para os irmãos.
Esperei muito por essa adaptação, pois o livro me surpreendeu de uma forma que jamais imaginei, personagens diferentes dos apresentados na maioria dos westerns, foge dos clichês convencionais e se aprofunda nos sentimentos que cada um experimenta vivendo nesse ambiente, uma obra que passeia pelo drama e humor negro com grande habilidade. A adaptação conseguiu conservar essa essência e o elenco virtuoso ressalta ainda mais essas características, todos têm seu espaço e brilham cada um à sua maneira, deslumbrante a composição de John C. Reilly como Eli, geralmente o vemos em papéis coadjuvantes e sempre impecável, mas aqui temos a exata noção de sua potência como ator, a incorporação de um homem que não se encaixa, que está à frente de sua época, que questiona os meios violentos dos quais utiliza e consegue estabelecer elos afetivos facilmente, sua postura, seu gestual e todos os detalhes o tornam um personagem interessante, por exemplo, quando decide usar a escova de dentes, algo que destoa de todo o cenário retratado, Joaquin Phoenix como Charlie é também um absurdo de excelência, ele é o irmão violento, prepotente e conhecido por sua destreza com as armas, o que sobra a Eli de perspicácia falta a Charlie, ele é o retrato do homem ambicioso e indômito, do outro lado temos Jake Gyllenhaal como Morris, uma espécie de detetive do Comodoro, ele é o meio pelo qual os irmãos conseguirão chegar até o alvo, falso e descrente seu personagem aparenta não possuir moral nenhuma até conhecer Hermann, vivido por Riz Ahmed, um químico que possui um sonho utópico, seu personagem é extremamente sensível e toda sua inteligência impressiona Morris, através dele consegue vislumbrar uma vida diferente e se encanta com a ideia e seus meios de obter o ouro do rio, claro que a ambição é a força que o move, mas durante o processo a afetividade ganha forma, algo super incomum em filmes deste gênero. Os quatro possuem sua carga dramática e toda a trajetória os levam a pensar e, a partir daí, modificarem seus modos de agir.  
Charlie e Eli saem com uma missão, capturar Hermann com o apoio de Morris, este disfarçado se finge de amigo e desse modo o levará até os irmãos, Eli não está satisfeito com o cavalo que recebeu e tão pouco em ficar de fora da reunião com o Comodoro, ele questiona o tempo todo qual o propósito de matar Hermann e durante a viagem sofre de pesadelos e com os incidentes que se revelam, se imagina abrindo uma loja e se libertando dessa vida de violência, os motivos para seguir e matar Hermann não o deixam sossegado e enquanto isso Charlie bebe e se irrita com tudo e todos, mais para frente entendemos o porquê está nessa com o irmão e o quanto Charlie o subestima não enxergando o quanto o protege e controla a sua impulsividade.

Dentre tantas situações que ultrapassam durante a viagem, como infortúnios, ameaças conhecidas e desconhecidas e pitadas de sorte, observamos Morris se interessando pelas ideias de Hermann, são diálogos primorosos em que tanto um como o outro pensam em um futuro melhor, a fórmula que Hermann criou para enxergar o ouro no rio salta aos olhos de Morris e a ambição fala mais alto, logo muda de lado e o acompanha até São Francisco para o garimpo. Quando finalmente os quatro se juntam depois de acertarem as contas e pensarem no quanto de ouro acharão com a fórmula, empreendem um duro trabalho com graves lesões físicas, a violência é deixada de lado e a melancolia toma conta, há medo misturado a sonhos, afeto e muita ambição, e é justamente esse anseio desmedido que detona todo o plano e a narrativa ganha ainda mais contornos tristes e escuros. 

"A maioria das pessoas vai continuar insatisfeita, sem nunca tentar entender por que ou como elas poderiam mudar as coisas para melhor, elas morrem sem nada no coração a não ser sangue sujo..." (trecho do livro)

"Os Irmãos Sister" é uma bela e sensível obra que aborda crise existencial, ganância e relações afetivas em meio a um cenário hostil com um humor particular e um ar sombrio. Um atípico faroeste, pois deixa a violência e questões de vingança para segundo ou terceiro plano, o foco está na evolução da personalidade dos personagens, na mudança de suas prioridades, no entendimento do trabalho bárbaro que cometem, são homens diferentes entre si, complexos e fascinantes. 
O filme conta com uma série de acertos, desde o diretor Jacques Audiard que colocou suas características, como realismo e sensibilidade, o elenco formidável, destacando-se principalmente John C. Reilly, a trilha sonora composta por Alexandre Desplat e a recriação do cenário, que mesmo a história se passando no oeste americano as gravações foram realizadas no sul da Espanha e na Romênia.

A onda de faroestes retornou e está surpreendendo com tamanha criatividade e originalidade em seus enredos, deixando de lado cenas batidas de duelos em que a ação é o mais importante, recentemente fiz uma lista com alguns exemplares, confira

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