quarta-feira, 8 de março de 2017

Party Girl

"Party Girl" (2014) dirigido pelo trio Claire Burger, Marie Amachoukeli e Samuel Theis é um interessante filme feito em família, um retrato quase autobiográfico, Samuel Theis resolveu colocar na tela a vida de sua própria mãe e toda a sua melancólica trajetória que ousa quebrar paradigmas para vivenciar quem de fato é.  
Angélique (Angélique Litzenburger), sessenta anos, trabalha em um bar noturno perto da fronteira franco-alemã, ela ainda gosta de festas e de homens, mas que, tendo-se tornado a pessoa mais velha do bar, sente que está próxima do fim. Repentinamente, aceita casar-se com Michel (Joseph Bour), um de seus clientes regulares. Angélique é mulher livre que escolheu uma vida à margem da boa sociedade, o filme mergulha no coração de uma França desconhecida com um realismo assumido. 
A figura de Angélique nos captura, observamos bem de perto o seu rosto borrado de maquiagem, seu cabelo despenteado, as suas rugas, uma mulher que dentro do efervescente contexto da noite poderia destoar, já que as suas companheiras são mais novas, mas existe um desejo imenso dentro de Angélique, uma gana de vida. Vendo que está cada vez mais solitária decide aceitar o pedido de casamento que um antigo cliente propõe, é uma esperança de ter um lar, refazer os laços com os filhos e uma companhia. Michel é um homem carinhoso, porém com o passar dos dias Angélique percebe que está deixando de ser ela mesma, a sua essência está sendo aprisionada com toda a história do casamento. Seus filhos - que interpretam a si mesmos - veem tudo isso como uma boa oportunidade, só que em nenhum instante exigem ou julgam. Angélique parece querer algum tipo de redenção quando decide mudar de vida, recupera a convivência com os filhos, inclusive com uma da qual em sua juventude se separou, sai com os amigos de Michel, mas trava diante ao sexo, não consegue justamente por descobrir não estar inteira na relação, não está apaixonada, a mulher libidinosa despareceu.
As interpretações são excelentes, naturais e espontâneas, Angélique se doa completamente, uma atuação sincera que nos chama para perto, ela compartilha suas dúvidas, seus receios, sua melancolia e sua sede por viver e ser quem é sem estigmas e rótulos, desafia todos os estereótipos que rodeiam as mulheres sexagenárias. Com certeza uma mulher corajosa que prefere viver sua essência a sucumbir a um roteiro. Ela é livre, porém, claro, a liberdade tem em si boas doses de dor e solidão.

A trilha sonora conversa muito com a trama e causa inúmeros sentimentos, a melancolia, principalmente. A cena em que toca "Still loving you", do Scorpions é linda e memorável, e sem dúvidas, a canção final que batiza o filme, "Party Girl" de Chinawoman, pseudônimo da cantora canadense Michelle Gurevich, resume tudo. Angélique tem um estilo de vida que leva de modo natural, é a sua arte. Ao chegar numa nova etapa da vida em que o medo da solidão na velhice surge, aceita o pedido de casamento de Michel, mas ela começa a pensar se essa escolha a fará feliz e o principal, se sentirá como ela mesma? Essas dúvidas observamos bem de perto e mergulhamos no mundo dessa protagonista tão honesta consigo mesma.

"Party Girl" é um excelente drama que flerta com o documental e que nos deixa intrigados por querer saber o que de fato é real e o que é ficção, além de surpreender por sua naturalidade e sinceridade na condução da narrativa coroada com a brilhante atuação de Angélique Litzenburger, que nos permite adentrar em seus dilemas e decisões. E, enfatizando novamente a canção "Party Girl", que a exemplifica perfeitamente: "Não importa o que você cria se você não tem diversão."

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