quinta-feira, 29 de novembro de 2012
O Milagre de Anne Sullivan (The Miracle Worker)
"O Milagre de Anne Sullivan" (1962) é um filme esquecido no tempo, mas de grande relevância em seu conteúdo. Uma lição para toda a vida. Grandioso e de uma carga emocional raramente vista no cinema. E isso se deve as atrizes Anne Bancroft e Patty Duke completamente devotadas a suas personagens.
Baseado no livro autobiográfico "The Story of my Life" de Helen Keller, "O Milagre de Anne Sullivan" é um grande clássico do cinema americano. Realizado pelo cineasta Arthur Penn, o filme é comovente e retrata a luta pela vida, nesse caso, contra a adversidade. Em 1887, no Alabama, a jovem Helen Keller, cega, surda e muda desde a infância, devido a uma congestão cerebral, está a ponto de ser enviada para uma instituição especializada em doentes mentais. Sua falta de habilidade para se comunicar a deixou frustrada e violenta. Desesperados, seus pais procuram ajuda junto ao Perkins Institute, de Boston, que lhes encaminha a jovem Anne Sullivan para ser tutora de sua filha. Anne acabara de concluir seu curso, de modo que Helen será sua primeira aluna. Em sua incansável tarefa para tentar fazer com que Helen se adapte e entenda, pelo menos em parte, o mundo que a cerca, Anne não se mostra condescendente nem a trata como uma pessoa deficiente. Com essa atitude e determinação, entra muitas vezes em confronto com os pais de Helen, que sempre sentiram pena da filha e a mimaram. Por várias vezes, o pai a ameaça de mandá-la embora. A situação chega a tal ponto que Anne diz que, para seu trabalho apresentar bons resultados é preciso que ela e a menina passem a morar sozinhas numa outra casa da família.
Os pais de Helen não a ensinaram a se comportar, nem nada, era realmente um bichinho selvagem, Anne tem toda a paciência, mesmo sendo ríspida e não demonstrando amor, inclusive várias cenas é como se estivesse domesticando um animal, com lutas corporais de cansar o espectador. Anne precisava ensinar Helen comer do próprio prato, com talheres e dobrar seu guardanapo, a maneira grossa de ensiná-la fez a menina pegar ódio de Anne, e a reaproximação levou um certo tempo. Helen não sabia absolutamente nada, não tinha ideia de mundo, quando ensinado a linguagem de surdos e mudos, Helen tocava as mãos de Anne e imitava-os, mas ela não tinha noção do que aquelas palavras significavam. A cegueira mental de Helen era o seu maior problema.
É evidente que conquistar a confiança de um aluno pela afetividade é mil vezes melhor do que pela rigidez, mas no caso de Helen, que era muito mimada pelos pais, tratada com piedade, não era exatamente por esse caminho que ela iria aprender algo.
Anne teve um caminho difícil até ali, órfã foi mandada para uma casa de deficientes quando criança, onde morou por muitos anos. Essa experiência foi extremamente marcante em sua vida. Anne Sullivan conseguiu estudar, formar-se e tornou-se uma referência no ensino de pessoas com deficiência, ela nunca se deparou com um laço afetivo, e isso foi crucial no método que adotou. A disciplina era ponto fundamental, porém ela sabia que a obediência não era suficiente. Era preciso muito mais. A ideia de estar no mundo. De saber estar presente nele. A gratidão ao final exposta pela garota por Anne ter tirado a venda dos seus olhos e ter descoberto as belezas da vida é muito bonito. Quando ela conseguiu associar palavras a seus significados, foi o milagre. Ela tocando a água desesperadamente entendendo que aquilo era água, a terra era terra, a árvore era árvore. É extremamente emocionante, de uma beleza sensorial magnânima.
Quando crianças começamos a descobrir as palavras, associando-as vem o deslumbramento diante o mundo, perdemos isso com o tempo, pela falta de interesse por ele, sem ao menos nos darmos conta que este mundo nos chama para que o conheçamos mais e mais. O impactar-se, emocionar-se com nossas experiências, sentir a essência da vida. Por isso, esse filme é tão especial, não só didaticamente, mas filosoficamente, por falar da vida e de seus esplendores. É triste saber que um filme desse está esquecido no tempo, assim como nossos deslumbramentos perante a vida.
"O Milagre de Anne Sullivan" tem um enorme valor social. Helen Keller é muito mais que uma história de superação, ela demonstra esperança e humanidade, saída da escuridão total para se tornar uma pessoa exemplar. Helen se tornou escritora, com um diploma de bacharel em artes, lutou pelo voto feminino e pelos trabalhadores e deficientes. Ela morreu em 1968.
É muito importante que trabalhemos a nossa linguagem e a comunicação, pois só assim nos conheceremos plenamente gerando liberdade e amplitude. Há tanto para se aprender, para se resgatar e sentir. Pena que a maioria dos seres humanos pareçam apenas animais domesticados sem entender direito o que representa para si e para o mundo.
Baseado no livro autobiográfico "The Story of my Life" de Helen Keller, "O Milagre de Anne Sullivan" é um grande clássico do cinema americano. Realizado pelo cineasta Arthur Penn, o filme é comovente e retrata a luta pela vida, nesse caso, contra a adversidade. Em 1887, no Alabama, a jovem Helen Keller, cega, surda e muda desde a infância, devido a uma congestão cerebral, está a ponto de ser enviada para uma instituição especializada em doentes mentais. Sua falta de habilidade para se comunicar a deixou frustrada e violenta. Desesperados, seus pais procuram ajuda junto ao Perkins Institute, de Boston, que lhes encaminha a jovem Anne Sullivan para ser tutora de sua filha. Anne acabara de concluir seu curso, de modo que Helen será sua primeira aluna. Em sua incansável tarefa para tentar fazer com que Helen se adapte e entenda, pelo menos em parte, o mundo que a cerca, Anne não se mostra condescendente nem a trata como uma pessoa deficiente. Com essa atitude e determinação, entra muitas vezes em confronto com os pais de Helen, que sempre sentiram pena da filha e a mimaram. Por várias vezes, o pai a ameaça de mandá-la embora. A situação chega a tal ponto que Anne diz que, para seu trabalho apresentar bons resultados é preciso que ela e a menina passem a morar sozinhas numa outra casa da família.
Os pais de Helen não a ensinaram a se comportar, nem nada, era realmente um bichinho selvagem, Anne tem toda a paciência, mesmo sendo ríspida e não demonstrando amor, inclusive várias cenas é como se estivesse domesticando um animal, com lutas corporais de cansar o espectador. Anne precisava ensinar Helen comer do próprio prato, com talheres e dobrar seu guardanapo, a maneira grossa de ensiná-la fez a menina pegar ódio de Anne, e a reaproximação levou um certo tempo. Helen não sabia absolutamente nada, não tinha ideia de mundo, quando ensinado a linguagem de surdos e mudos, Helen tocava as mãos de Anne e imitava-os, mas ela não tinha noção do que aquelas palavras significavam. A cegueira mental de Helen era o seu maior problema.
É evidente que conquistar a confiança de um aluno pela afetividade é mil vezes melhor do que pela rigidez, mas no caso de Helen, que era muito mimada pelos pais, tratada com piedade, não era exatamente por esse caminho que ela iria aprender algo.
Anne teve um caminho difícil até ali, órfã foi mandada para uma casa de deficientes quando criança, onde morou por muitos anos. Essa experiência foi extremamente marcante em sua vida. Anne Sullivan conseguiu estudar, formar-se e tornou-se uma referência no ensino de pessoas com deficiência, ela nunca se deparou com um laço afetivo, e isso foi crucial no método que adotou. A disciplina era ponto fundamental, porém ela sabia que a obediência não era suficiente. Era preciso muito mais. A ideia de estar no mundo. De saber estar presente nele. A gratidão ao final exposta pela garota por Anne ter tirado a venda dos seus olhos e ter descoberto as belezas da vida é muito bonito. Quando ela conseguiu associar palavras a seus significados, foi o milagre. Ela tocando a água desesperadamente entendendo que aquilo era água, a terra era terra, a árvore era árvore. É extremamente emocionante, de uma beleza sensorial magnânima.
Quando crianças começamos a descobrir as palavras, associando-as vem o deslumbramento diante o mundo, perdemos isso com o tempo, pela falta de interesse por ele, sem ao menos nos darmos conta que este mundo nos chama para que o conheçamos mais e mais. O impactar-se, emocionar-se com nossas experiências, sentir a essência da vida. Por isso, esse filme é tão especial, não só didaticamente, mas filosoficamente, por falar da vida e de seus esplendores. É triste saber que um filme desse está esquecido no tempo, assim como nossos deslumbramentos perante a vida.
"O Milagre de Anne Sullivan" tem um enorme valor social. Helen Keller é muito mais que uma história de superação, ela demonstra esperança e humanidade, saída da escuridão total para se tornar uma pessoa exemplar. Helen se tornou escritora, com um diploma de bacharel em artes, lutou pelo voto feminino e pelos trabalhadores e deficientes. Ela morreu em 1968.
É muito importante que trabalhemos a nossa linguagem e a comunicação, pois só assim nos conheceremos plenamente gerando liberdade e amplitude. Há tanto para se aprender, para se resgatar e sentir. Pena que a maioria dos seres humanos pareçam apenas animais domesticados sem entender direito o que representa para si e para o mundo.
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Gritos e Sussurros (Viskningar Och Rop)
A história é sobre três irmãs que habitam uma casa de campo no século XIX. Agnes (Harriet Andersson), Karin (Ingrid Thulin) e Maria (Liv Ullmann), elas são o retrato do desamparo e do desencanto, traduzido em olhares perdidos, choros incontidos e gestos extremos. A primeira está muito doente e carece de cuidados especiais, ainda que, no atual estágio de sua enfermidade, eles sejam apenas paliativos. As outras duas são confrontadas com a dor da existência em um alto grau ao lidar com essa situação difícil. Ao se deparar com a agonia dos últimos dias de Agnes, Karin e Maria também refletem sobre suas próprias vidas, seus matrimônios, suas inseguranças e infelicidades. E a morte de Agnes acaba aproximando as vidas separadas de suas irmãs.
Ingmar Bergman, diretor de "Gritos e Sussurros" é conhecedor da alma humana e imprime de maneira desconcertante isso em seus filmes, ele é adorado e respeitado pelo público e ícone do cinema arte. Nesse o clima é tenso e desconfortante, as mulheres revelam desesperos contidos, amarguras, tristezas, e isso tudo é exprimido pelos rostos em close, marca de Bergman. A cena em que Maria tem seu rosto analisado diante do espelho (identificado à câmera, para a qual ela olha) por seu amante (o médico interpretado por Erland Josephson) é de uma agressividade e um sadismo incríveis: ele associa cada vinco e cada ruga de Maria ou a um defeito dela ou a um percalço vivido. Tudo em sua mise en scène é questão de coreografia, decoro, posicionamento e movimentação de corpos em um espaço minuciosamente arquitetado. A cor vermelha sempre presente é a dor que permeia o espaço, e aquelas mulheres. Também a cor do sangue, da paixão e o da própria alma. As mulheres enigmáticas e fantasmagóricas vagueiam em vestidos e camisolas de um branco atordoante. A relação entre Agnes e Anna, a empregada que perdeu sua filha recentemente é carinhosa e muito maternal. Muitas vezes ela a pega como se fosse um bebê, a sua dedicação é incansável.
Há sequências de sonhos e flashbacks que estabelecem como o passado e o presente se sobrepõem, ao mesmo tempo que oferecem uma explicação para a evidente paralisia emocional. Bergman, porém, raramente contemplou um mundo sem esperança e o filme termina com um doce sorriso. "Fomos até dar uma pequena caminhada. Foi um acontecimento e tanto (...). Toda a minha dor foi embora. As pessoas de quem eu mais gosto estão comigo (...). Pensei: Isto é realmente a felicidade."
O ser humano guarda muitos segredos consigo mesmo, e como a alma é complexa, somos capazes de ser cruéis conosco, nos mutilamos interiormente, cultivamos ódio, uma espécie de amargura que só tende a crescer, e eis o vazio existencial. Velamos ele no dia a dia, damos nossos sorrisos forçados, olhamos de forma cínica quase sempre ironizando a vida. É incrível, pois a alegria está na nossa frente e quase nunca a enxergamos, está em pequenos momentos que deveriam ser a alavanca que nos impulsiona e que nos faz respirar a vida novamente.
"Gritos e Sussurros" é uma experiência sensorial, ele se desenvolve nas entrelinhas, e cada um interpreta à sua maneira, mas é inevitável não nos colocar por vezes na situação dessas personagens, que entre gritos e sussurros apresentam seus fantasmas interiores.
Acima de tudo propõe que pensemos ao menos um pouco, que viver vale a pena, mesmo que seja em um breve momento de alegria e paz, pois a morte é como um jogo de xadrez, cuja única opção que temos é adiar a derrota.
O filme se traduz em emoção, em cada olhar, expressão, maneira de andar, são os detalhes que nos faz compreender aquelas mulheres. O longa deve ser admirado da mesma forma que se aprecia um quadro, com precisão e profundidade. São sentimentos traduzidos em imagens, que por vezes gritam e que por vezes são silenciosas.
terça-feira, 27 de novembro de 2012
Polissia (Polisse)
A pedofilia é o tema do filme "Polisse", que retrata as atividades da Brigada de Proteção de Menores em Paris, e nos traz de forma muito realista diversas histórias de crianças que sofreram abusos de adultos, dos quais a maioria são da família. O tom do longa chega perto a de um documentário, a diretora Maiwenn, que também interpreta uma fotógrafa, acompanhou esta corporação francesa (BPM), por meses e trouxe os casos que vivenciou para o roteiro que escreveu junto com Emmanuelle Bercot. A rotina dos policiais que lidam com esses casos é totalmente desgastante, ainda mais quando o acúmulo de ocorrências condenáveis só aumentam e alguns não se finalizam, esses policiais lidam com o pior do ser humano. O ritmo do longa contribui ferozmente para o sentimento de asco que nos toma a cada história revelada. Logo no início vemos uma declaração de uma menina que é digno de revolta.
A grafia errada é proposital, pelo fato de estarem lidando com crianças e geralmente elas escrevem como escutam, Polisse e não Police que é o correto. Além das macabras histórias que passeiam desde o abuso de um pai para filho, de um avô para com um neto, professor e aluno, pais que prostituem seus próprios filhos, e vai até adolescentes de 14 anos que não tem limites, se vendem na internet, mostrando seus corpos, ou adolescentes que são violentados, o longa mostra também a vida pessoal desses policiais, relacionamentos, a inquietação constante, a perda de controle, e momentos de descontração, mas que não são suficiente para evitar as consequências emocionais que o ofício traz as suas vidas particulares. Os personagens vivem vidas e relacionamentos conturbados. Fred é o que mais leva para o lado pessoal e um exemplo disso é no modo como defende uma criança abandonada; outro foco importante na vida dessas pessoas é a de Nadine, que reluta a se divorciar do marido, mas a feminista Iris demonstra firmeza ao aconselhar a colega a se separar, esta por sua vez, esconde uma frustração que é revelada indiretamente por meio do plano mais chocante do filme.
De início não nos apegamos a um personagem, são muitos e é difícil se acostumar com o ritmo, mas logo somos apresentados a dupla principal, Fred (Joey Starr) e a fotógrafa Melissa (interpretada pela diretora Maiwenn). Vemos acontecer um relacionamento aos poucos, pois cada um deles têm as suas dificuldades, porém com o dia a dia se aproximam mais. As cenas mais impactantes são as de pedófilos que tentam minimizar a importância de seus desvios sexuais, o que provoca a revolta dos policiais. Alguns com poder aquisitivo zombam deles, dizendo que nunca ficarão presos, e mostra o lado mais frágil desta corporação.
Um outro ponto chocante é quando a criança gosta de seu agressor, na mente dela é carinho. Isso é mostrado sutilmente e as cenas são apenas sugeridas, mas mesmo assim é impressionante. De certa forma aquilo tudo que os policiais vivenciam é um verdadeiro caos, uma total falta de controle diante a tantos casos. O ponto forte do filme não é a vida desses policiais, é sem sombra de dúvidas os depoimentos das crianças e dos pedófilos.
"Polisse" é sincero ao lidar com um assunto tão difícil, principalmente, quando mostra pessoas que não seriam suspeitas de tais atos absurdos, pessoas com um bom trabalho, pais de família que passariam despercebidos entre tantas outras que julgamos apenas pela aparência.
Maldade não tem cara, não tem posição social, e nem nível de escolaridade. Ela está mascarada em nossa sociedade. Às vezes um desfecho feliz para casos de pedofilia não acontece por vários motivos, mas como no final, há esperança, mesmo que apenas alguns casos sejam solucionados. O importante é lutar contra este tipo de pessoas que acham natural, ou que por pura perversão abusam de crianças.
"Polisse" é um filme sério, sensível, e que vale a pena ser conferido, serve para nos alertar, pois sempre é válido assistir obras que nos informem e que gerem discussões.
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Entre os Muros da Prisão (Les Hauts Murs)
"Entre os Muros da Prisão" (2008) é um filme completamente emocionante, em que cada cena foi feita para nos gerar sensações diversas. O clima e a fotografia dão um ar de melancolia. Já no início somos advertidos de que a história é baseada em fatos reais. O que só faz aumentar a tristeza do que acontece entre os muros daquela prisão. É um filme minucioso em que detalhes fazem toda a diferença. Os olhos do protagonista nos faz perceber muitas das coisas que não são ditas em palavras.
A situação é a seguinte: França, anos 30, um menino sujo e maltrapilho corre até a praia. Olha sorrindo para o mar durante breves segundos, até perceber que está sendo perseguido por guardas a cavalo. Leva um golpe de fuzil no rosto e a cena escurece. Durante a 2ª Guerra Mundial, os órfãos dos combatentes franceses eram enviados a Centros de Educação Vigiada. Aos 14 anos, Yves Tréguier já passara por vários, sendo transferido sempre que tentava fugir. Seu sonho era chegar ao porto e embarcar num navio para Nova Iorque. Guardava com carinho um atlas, onde percorria imaginariamente a viagem. A trajetória do protagonista Tréguier, por sua vez, vai repetir o mesmo percurso de tantos outros personagens de dramas prisionais: a chegada de um novo detento, a violência sofrida pelo novato por parte de um grupo de internos, a tentativa de sodomização, os vínculos de amizade, e a opressão promovida pelos funcionários do centro.
A prisão do título é tipo uma escola de correção da época, em que jovens considerados rebeldes pelos pais ou tutores eram enviados para lá. Emile Berling interpreta Tréguier maravilhosamente, assim como todos os outros meninos, cada um com sua peculiaridade, talvez o personagem que mais chame a atenção, além de Tréguier, seja Fil de Fer, o personagem mais absurdamente triste. É um garoto inteligente, sensível e que teve boa educação, conhece música e num pedaço de papelão desenhou um piano, e enquanto dedilha o pedaço de papel assovia belas melodias eruditas. Ele é dono de uma das cenas mais tocantes. Sua mãe é uma mulher rica, diferente dos outros garotos ele foi parar lá porque o padrasto não o suportava em casa. A aparição de sua mãe na trama é de arrepiar, impossível não se emocionar diante os diálogos.
Muitos garotos adquiriram uma personalidade criminosa devido a rigidez e repressão, outros ficaram profundamente deprimidos. O que fazia eles esquecerem um pouco a realidade era o trabalho e a cumplicidade que se criava entre eles, como no caso de Tréguier e Blondeau. Os centros de educação vigiada foram fechados apenas em 1979.
"Entre os Muros da Prisão" nos faz lembrar da inadequação dos reformatórios brasileiros, com pessoas incapacitadas para lidarem com adolescentes rebeldes e problemáticos em que a vida não deu um minuto de trégua. Uma coisa é certa: autoritarismo e violência não corrige, é preciso rever certos conceitos. Repreender é um ato falho, quanto mais você proíbe mais revolta é criada. E os meninos do filme mostraram exatamente isso, o desfecho é uma pequena amostra do que esse sistema pode acarretar. Há também a informação ao final do longa de que Yves Tréguier se tornou escritor com o pseudônimo de Auguste Le Breton.
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
Ferrugem e Osso (De Rouille et D'os)
O recomeçar, o refazer-se é terrível, quando tudo desmorona buscar forças não é uma coisa fácil, "Ferrugem e Osso" trata disso, mas sem ser melodramático, é honesto, seco e até cruel. Alain (Matthias Schoenaerts) está desempregado e vive com o filho de apenas cinco anos. Ele parte para a casa da irmã em busca de ajuda e logo consegue um emprego como segurança de boate. Um dia, ao apartar uma confusão, ele conhece Stéphanie (Marion Cotillard), uma bela treinadora de orcas. Alain a leva em casa e deixa seu cartão com ela, caso precise de algum serviço. O que eles não esperavam era que, pouco tempo depois, Stéphanie sofreria um grave acidente que mudaria sua vida para sempre. Eles voltam a se encontrar em circunstâncias bem diferentes: ele envolvido em lutas de ruas para ganhar dinheiro, e ela cuja duas pernas foram perdidas em um acidente com um dos animais de seu show.
Depois de se tornarem amigos eles acabam se envolvendo romanticamente, apesar da resistência dele em assumir compromissos. Marion Cotillard se entrega à uma personagem que enfrenta o dilema de se conhecer na sua nova situação, no início triste, vazia, encontra em Alain uma amizade da qual a fará sentir-se viva novamente. Alain é um homem que alterna entre violento, bem-humorado e terno, sua reviravolta se dá no fim, quando quase perde seu menino de 5 anos, nesse momento ele percebe o quanto estava sendo relapso com o filho, e o faz perceber as coisas a sua volta. A história mostra desespero e angústia com muita sensibilidade. É um amor diferente em que o mundos dos personagens estão completamente destruídos, juntos eles podem consertá-lo, mesmo que demorem para perceberem o sentimento de cada um. Alain sempre está disposto a ajudar Stéphanie, inclusive a leva nas brigas em que se envolve para ganhar dinheiro. A cena da praia em que mergulha no mar, na qual ela sente o sol no rosto depois de muito tempo fechada é fascinante. Quando ela se redescobre como mulher, amada por Alain, a amizade vai se transformando em amor, da maneira deles, sem cobranças, um amor que nasce naturalmente, onde eles se completam da forma que são.
Em certo momento Stéphanie pede mais delicadeza da parte de Alain, este que é rodeado de violência e necessita colocá-la para fora em brigas de rua. Os dois vão se descobrindo e se revelando aos poucos um para o outro, isso até que um sinta que precisa do outro para suportar seus mundos. Marion Cotillard revela força e sensibilidade, seus olhares são significativos e representam seus sentimentos, tanto a depressão como o desejo que sente por Alain. As cenas de sexo se dão de forma natural e se encaixam perfeitamente no contexto. A redenção de Alain não se faz por conta dos acontecimentos na vida de Stéphanie ou do que ele viveu, mas sim por causa de um acidente com seu filho, é algo que acontece rapidamente e que o faz repensar suas atitudes. Ao contrário de Stéphanie que foi aos poucos se adaptando, inclusive com as próteses que mais tarde começa a usar.
Histórias de redenção, superação, redescobertas e amores improváveis soam um tanto piegas, geralmente Hollywood as retrata de maneira feliz, mas esse drama franco-belga chega bem perto do real.
Nem tudo dá certo, nem tudo é poesia, e nem sempre há uma bela trilha sonora nos acompanhando. As tragédias acontecem e não é qualquer um que consegue suportar, principalmente aqueles que nos rodeiam, poucos são os que ficam, a força vem naturalmente, e geralmente quando estamos passando por algo complicado nos apegamos a pessoas complicadas também, talvez afim de compartilhar, e mesmo sem saber ajudamos um ao outro.
Muito bonita a cena em que ela volta ao local de seu trabalho e pelo vidro faz as pazes com a causadora de sua tragédia. A orca segue os movimentos de suas mãos e inevitavelmente Stéphanie sente-se feliz. Sem melodramas, apesar do longa se apoiar em tragédias, a história se faz crua sem ser chocante, simples, mas com personagens complicados, ambíguos e humanos.
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Jaulito
"Jaulito" é uma animação espanhola lançada em 2008. Foi selecionado entre os finalistas do concurso de melhor curta-metragem de animação da Espanha no Artfutura de 2009. É dirigido por Javier de la Torre.
Jaulito nasceu trancado em uma gaiola. Um dia ele consegue escapar com ajuda de um corvo, mas jamais imaginou que a gaiola que tirava sua liberdade, era a mesma que lhe ajudava a viver.
Em tão pouco tempo o curta passa uma mensagem simples e ao mesmo tempo forte, e capta aquele lance de que a liberdade pode ser fatal e, que talvez, seria melhor ficar onde está nossas raízes. O estilo lembra um pouco do humor negro e a obscuridade de Tim Burton, mas com certeza Javier de la Torre realiza um trabalho muito especial e único.
Nem tudo é o que parece ser. Às vezes o que acreditamos ser o pior, na verdade é o que nos mantém vivos.
terça-feira, 20 de novembro de 2012
O Lavador de Almas (Pierrepoint: The Last Hangman)
Albert Pierrepoint (Timothy Spall) inscreve-se para um concurso de executores, no início parece que não irá bem no teste, porém inicia-se ali a carreira do mais famoso carrasco da Inglaterra. "O Lavador de Almas" conta a história de Pierrepoint e como este desempenhou sua função por duas décadas, se tornando o assassino por lei de mais de 600 almas.
O longa acompanha o início da carreira de Pierrepoint paralelo ao início de seu casamento e como este escondeu por um longo tempo isso da esposa, porém seu sucesso na carreira desde o respeito pelos executados dizendo que ali estava o corpo de um inocente, já que havia pago com a própria vida pelos seus crimes, até o pós execução, onde ele mesmo se incumbia de lavar e preparar o corpo para o caixão, pois sabia que estes não seriam bem tratados nas funerárias, faz com que ele atraia a atenção da mídia para si, e a esposa descubra que o dinheiro ganho pelo marido que dizia viajar a negócios vinha das execuções cronometradas e anotadas em um diário.
O personagem se torna mais famoso ainda por realizar uma execução em menos de dez segundos e futuramente ser convidado a matar criminosos nazistas. O que torna "O Lavador de Almas" digno de elogios é mostrar que por mais que o que Albert Pierrepoint fazia era seu trabalho difícil de carrasco da maneira mais ética possível, aquilo com o passar do tempo começou a deixá-lo perturbado, mesmo nunca querendo saber pelo que as pessoas ali em sua frente haviam sido condenadas à morte, quando um de seus trabalhos é enforcar um amigo de bar por ter matado a amante infiel, começa a ver que quando escolheu para si a mesma carreira que o pai e o avô, trouxe tristeza para sua vida com aquelas tantas pessoas culpadas, mas também as que poderiam não ser, a ponto de serem levadas a morrer.
Timothy Spall mostra aqui uma atuação de respeito, junto a Eddie Marsan, o amigo de bar Tish. Baseado numa história real, o diretor Adrian Shergold soube mostrar a maior qualidade desse personagem contraditório da história da Inglaterra e da pena de morte, dito por muitos como sádico, mas na verdade, o lavador de almas dos condenados por si próprios, pelos seus crimes, pelo Estado e se nos aprofundarmos, em muitos casos, pelo próprio povo, menos por Pierrepoint...
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
Eu Vi o Diabo (I Saw The Devil)
O cinema sul-coreano indiscutivelmente sabe produzir filmes para mexer com nosso psicológico. A história de vingança é brutal, sangrenta, mas completamente justa. O diretor Jee-woon Kim (Medo - 2003) nos dá duas longas horas e meia de cenas impressionantes e avassaladoras.
Kyung-chul (Min-sik Choi) é um perigoso psicopata. Mata apenas pelo prazer do sofrimento que causa nas suas vítimas. Essas são sempre mulheres. A polícia anda no seu encalço há muito tempo, sem nunca o conseguir apanhar. Uma noite, a filha de um chefe da polícia reformado é encontrada morta e brutalmente desfigurada. O noivo dela, Kim Soo-hyeon (Byung-hun Lee) é um agente secreto, e vendo a incapacidade da polícia em agir e resolver os homicídios, decide ele mesmo perseguir e capturar o assassino.
Soo-hyeon só tem um objetivo, que é fazer Kyung-chul sentir o mesmo horror e sofrimento das suas vítimas. Assim começa um jogo macabro em que caçador e presa trocam de papéis, o psicopata assassino é convertido em vítima e o caçador em monstro, igual aquele que deseja destruir. Nas primeiras cenas percebemos quem é o diabo, só que nossa opinião vai mudando conforme o desenrolar. Kyung-chul furioso por conta do que seu caçador anda fazendo, deseja vingar-se dele, é um jogo de gato e rato muito original e sangrento. A mistura de ação, suspense, drama e thriller aumenta a tensão a cada cena.
Parece que a Coréia do Sul se especializou em inventar histórias de vingança sem cair nas próprias armadilhas, nada se compara com as cenas de sadismo, o clima é intenso e totalmente eficaz para quem o assiste.
Em determinados momentos personagens secundários alertam Soo-hyeon sobre o caminho que ele está seguindo, mais especificamente sobre seus resultados, perseguir, torturar e matar Kyung-chul não traria Joo-yeon de volta. Ele, porém, não dá ouvidos a ninguém. Soo-hyeon prolonga ao máximo o término de sua vingança, porque sabe que o que virá depois será três mil vezes pior. Suportar o vazio depois de tudo e ter que lidar com o monstro que criou internamente. Diferente do maluco que assassinou sua amada, que tinha prazer em matar, não pensava nas consequências e também tão pouco se importava em morrer.
A linha entre o bem e o mal se desfaz com o fim do longa, percebemos que o justiceiro se transformou num monstro tanto quanto Kyung-chul. É indescritível as cenas finais. A personificação do mal acontece em um diálogo de estremecer, onde o assassino diz não conhecer a dor e o medo.
O ator Byung-hun Lee tem uma performance magistral, uma transformação inimaginável e realmente intensa. E Min-sik Choi em um personagem sádico, cruel e manipulador, encarna a verdadeira expressão diabólica. Juntos fazem uma dupla implacável.
Para quem curte o estilo é obrigatório que veja "Eu Vi o Diabo", e esse é apenas uma amostra do que os sul-coreanos são capazes. Um filme sem meio-termo, que não desperdiça tempo, é cru e os dois personagens não dão trégua um para o outro. Quando se pensa que já acabou, é aí que surge uma reviravolta e muda completamente o rumo da história.
"Impossível ter uma vingança absoluta contra o verdadeiro mal."
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
Cortina de Fumaça (Smoke)
Em NY no ano de 1990, Auggie Wren (Harvey Keitel) é o dono de uma tabacaria frequentada por diversos personagens, entre eles o escritor Paul Benjamin (William Hurt), que após a morte da esposa não mais conseguiu lançar um livro. A vida de Paul muda quando é salvo por Rashid Cole (Harold Perrineau Jr.) antes de ser atropelado. O fato dá início a uma relação de amizade entre o escritor e o jovem que pretende conhecer o pai, Cyrus (Forest Whitaker) que é dono de uma decadente oficina mecânica. A vida de Auggie também muda quando reaparece em sua vida a ex-namorada Ruby (Stockard Channing), alegando que eles tem uma filha (Ashley Judd) que é viciada em drogas. O diretor Wayne Wang se juntou ao escritor Paul Auster para filmar o roteiro deste filme sobre pessoas comuns que convivem ao redor de um local, a tabacaria de Auggie, onde praticamente todos os personagens fumam e tentam resolver seus problemas da melhor forma possível.
Um filme feito para ser visto diversas vezes. Uma obra-prima que expõe dramas humanos de uma maneira impecável. Tudo é extraordinário, começando pelo roteiro completamente envolvente e eficaz, o elenco com uma dose de humanidade extra, com suas personalidades únicas. Há profundidade em cada um, há valores esquecidos, como a generosidade e a amizade. E isso tudo em meio há muita fumaça e conversas magníficas.
Inspirado no maravilhoso "O Conto de Natal de Auggie Wren", de Paul Auster. O cenário é uma tabacaria, localizada numa esquina qualquer do Brooklyn, numa esquina que é o mundo. Auggie é um ser humano comum, que fuma seus charutos e que todos os dias tira uma foto do mesmo lugar, da fachada do seu estabelecimento, sempre com o mesmo enquadramento. Este homem é sábio, para ele todos os dias são iguais e ao mesmo tempo diferentes. A melhor cena é a que mostra seu álbum de fotografias a Paul, e este rapidamente o folheia alegando que todas são iguais, mas Auggie diz que se ele prestar atenção verá que cada uma é diferente, apesar de parecerem iguais. As estações do ano mudam, as pessoas também, às vezes a rua estava vazia, outras repletas de pessoas, e olhando mais devagar Paul se depara com a sua mulher falecida no retrato e se emociona. Esta cena consegue captar a essência da vida, o quanto estamos absortos, não nos damos conta das pequenas mudanças que ocorrem conosco, porque estamos habituados a pensar que tudo está como antes.
As histórias se entrelaçam, a amizade de Paul e Thomas é maravilhosa, um garoto mentiroso que quer encontrar e estabelecer um relacionamento com seu pai, este surge na pobre oficina de seu pai e sem saber que aquele garoto é seu filho, acaba dando um trabalho, mais tarde tudo vem à tona e a descoberta é muito emocionante. O final fecha maravilhosamente com a voz inigualável de Tom Waits, a sua figura combina perfeitamente com o ambiente do filme. Sua voz rouca embala a cena do conto de Auggie reproduzida em imagens. O conto explica como Auggie conseguiu a câmera fotográfica que utiliza todos os dias religiosamente.
Uma obra admirável e de sensibilidade única, indispensável para os cinéfilos. Auggie e Paul fazem uma dupla e tanto. Juntos experimentam a sensação de uma boa amizade. Assim como Paul e o garoto Thomas que vive um estágio em que dúvidas surgem e a esperança de reencontrar seu pai e ser amado é o que o domina. O filme tem aquele ar de reencontro consigo mesmo e de redescobertas interiores. É filme para ver, rever e rever de novo!
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
Me Excita, Droga! (Få Meg På, For Faen)
O cinema norueguês é sempre uma grata surpresa, os longas são feitos com muito capricho. É somado criatividade, originalidade e competência ao fazer filmes com baixos orçamentos e recursos limitados. Conhecido como um cinema alternativo, a Noruega hoje em dia se preocupa demais com os adolescentes e jovens, buscando sempre solucionar seus conflitos pessoais para terem uma formação psicológica adequada. Isso se dá nos filmes, mostrando realismo e crítica social na maneira que o país lida com os jovens. Uma amostra disso é o filme "Vegas".
"Me Excita, Droga" é a história de Alma, uma adolescente que está desabrochando, sempre excitada, ela sonha com Artur, seu colega de escola. Alma vive em uma pequena cidade da Noruega, chamada Skoddeheimen, em que todos se conhecem e com direito até a vizinha bisbilhoteira. Alma junto com as amigas, especialmente Saralou sempre mostra o dedo toda vez que o ônibus escolar entra na sua pequena cidadezinha, demonstração de revolta. Adolescentes efervescentes em uma pacata cidade, não combina! Diferente dos filmes teen, esse mostra a visão de uma garota, as cenas em que ela fantasia transando com homens mais velhos ou com Artur, ou se masturbando não são poupadas, mas a trama segue de forma leve e bem divertida.
O filme traz até nós o olhar feminino sobre a garota que entra na puberdade, desejando, ansiando contato sexual, coisa pouco usual no cinema. Nessa falta do que fazer, eis que surge uma festa da escola, tão esperada, onde eles tem a chance de beber, azarar... Alma sai para fora da festa e Artur vai atrás dela, entre olhares, ele acaba "cutucando-a" com seu pênis. Alma é como toda adolescente e fala para todo mundo o que aconteceu, mas como Artur é admirado por todos, por fazer parte do coral e ser mais sociável, Alma fica com a fama de depravada e acaba sendo excluída do grupo. Sendo chamada de "alma cutucada". Ela tenta de tudo para se satisfazer, telessexo, revistas pornôs, masturbação. Sua mãe descobre suas ligações ao telessexo e não se preocupa em conversar, apenas a despreza, coisa que revolta a menina e a faz fugir para Oslo em busca de liberdade junto de amigos mais velhos, onde é aceita. Só que ela ainda continua amando o causador de sua desgraça, Artur. Ao final sua mãe a busca e finge entender a situação. Já Artur que omitiu o fato o tempo todo, que fez Alma parecer uma louca depravada, acaba confirmando para todo mundo o que de fato aconteceu. É engraçado o tema girar em cima desse lance que houve com eles, mas mostra que adolescente age de forma impulsiva em qualquer parte do mundo.
A mãe por conta de criá-la sozinha, a dificuldade de estar com a filha por causa do trabalho, deixando a garota à mercê do nada, já que a cidade onde mora não é lá aquelas coisas, sem dúvidas, ajuda a imaginação dela rolar solta. A mãe deveria prestar mais atenção na sua filha, conversar e entendê-la, ou pelo menos tentar, pois esse período é uma chateação total para quem vive e para quem está ao lado convivendo. Mas ao mesmo tempo é rodeado por descobertas, que a acompanharão pelo resto da vida e que são únicas e especiais. A adolescência é poesia, descoberta interior, e uma fase intensa. Apesar do tema abordado ser tabu, a masturbação e o despertar feminino é mostrado quase de forma pedagógica.
"Me Excita, Droga!" é um filme sem frescura e honesto ao colocar o despertar feminino como tema, algo tão pouco explorado no cinema.
terça-feira, 13 de novembro de 2012
Vegas
A Noruega moderna é um modelo de sociedade perfeita, mas o mal se encontra até nos melhores lugares. Nesta história é revelado um grupo de adolescentes para quem a vida parece ser muito diferente do sonho norueguês de perfeição. Acompanhe a busca e o desejo mais profundo desses jovens de ter uma vida normal. "Vegas" é a história de Thomas (Jørgen Hausberg Nilsen), Marianne (Karoline Stemre) e Terje (Sindre Kvalvåg Jacobsen), três adolescentes que não tem para onde ir. Depois de testemunhar o maltrato físico de sua mãe, Thomas é enviado a um lar para jovens. Ninguém vai lhe dizer onde está seu irmão mais novo e Thomas promete encontrá-lo. No refúgio conhece Marianne, que sempre deixa tudo de cabeça para baixo, e Terje, que parece ser de outro planeta. Os três descobrem um sonho e juntos embarcam em uma viagem de amor, ódio e confiança.
Ninguém acaba onde planejou, mas todos encontram uma casa de certa forma. "Vegas" dirigido por Gunnar Vikene, conhecido pelos trabalhos na televisão local é um prolífico diretor norueguês. O filme leva os espectadores ao núcleo das famílias disfuncionais através dos olhos de três jovens que estão próximos de perder tudo se não mudarem suas vidas. Valorizado pelos críticos por sua linguagem cinematográfica prática e envolvente, com um ponto de vista e cenas de ângulos baixos, "Vegas" atravessa as fronteiras para trazer sobre a mesa temas como a violência doméstica e o vício em drogas. No entanto, apesar das trágicas histórias que se misturam quando os três personagens principais se encontram, haverá espaço para a redenção e o humor. Esse filme espirituoso retrata mais do que só os problemas enfrentados pela juventude contemporânea. Ele oferece uma solução comovente e esperançosa para os problemas que pais e filhos podem viver.
Os atores mesmo sendo novatos e completamente sem técnica, conseguem imprimir muita personalidade, e por ser natural torna tudo muito próximo da realidade. Marianne faz a revoltada, que pouco se importa com os outros, no desenrolar descobrimos vários segredos, incluindo o porquê do título do filme. Ela é movida por impulso. Thomas, um garoto que vive em uma casa onde a mãe é incapaz de deixar o namorado, mesmo que apanhe constantemente, ela prefere deixar os filhos separando-os um do outro. O refúgio para onde é mandado é muito acolhedor, porém o sofrimento de sua mãe não mandar seu padrasto embora, o corrói por dentro. Ele é dono de uma das cenas mais chocantes.
Terje, após sua mãe cair do navio e se perder no mar é enviado ao lar, seu pai fica impossibilitado de continuar cuidando dele, e o principal: amando-o. Ele o culpa pelo acidente e Terje abalado fica muito transtornado e deprimido, apenas pensa em ir a bordo do navio que vai para a Dinamarca, onde sua mãe caiu no mar e pensa poder resgatá-la de algum jeito. Emocionante o desfecho do personagem, o sorriso do garoto e a imagem dele no fundo do mar em busca de sua mãe é a das mais bonitas. Todos encontram uma saída, mesmo que não seja das melhores.
"Vegas" é um longa diferenciado que vale a pena ser conferido. A Noruega, considerada uma das sociedades mais perfeitas em termos de economia, uma social-democracia que funciona muito bem, também enfrenta problemas e desafios, mas a maneira de lidar, especialmente em relação à educação dos jovens, dando todo o apoio e respeitando as particularidades, faz da Noruega um modelo de sociedade a ser respeitado.
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Thale - Ela Veio da Floresta (Thale)
"Thale" (2012) é um filme que aborda um mito nórdico. Antes é necessário saber um pouco mais sobre a lenda que é mostrada. A Huldra é um ser da mitologia que tem a aparência de uma bela mulher com um rabo de vaca. Quando bem tratada ela é inofensiva, porém se mexem com o ambiente em que vive ela pode se vingar usando seus poderes sobrenaturais, além de seduzir os homens que caçam ou vivem na floresta, cantando uma linda canção ela os atrai para seus domínios sem jamais retornarem a seus vilarejos.
Elvis (Erlend Nervold) e Leo (Jon Sigve Skard) são limpadores de cenas de crimes, e acabam encontrando uma Huldra chamada Thale (Silje Reinåmo) trancada no sótão de uma casa. Eles inicialmente ficam chocados, mas a ajudam e criam uma amizade com ela. Entretanto, Thale é um ser do folclore e mantê-la por perto vai criar problemas. Ela não diz uma palavra, é incapaz de dizer o porquê está nesse local, logo se percebe que ela tem sido mantida em cativeiro por décadas, por razões ainda desconhecidas. Quando percebem a movimentação do lado de fora, sabem que querem ela de volta.
O filme é um Thriller ao estilo folk, não haveria outra designação a não ser essa. Ele pende muito mais para o suspense do que para o horror, e há também dramas pessoais dos quais os protagonistas pouco simpáticos, Elvis e Leo sofrem. "Thale" tem um ritmo lento e a história por ser diferente cativa e nos dá gás para ver até o fim, ainda mais por colocar a cultura nórdica em evidência. O visual no meio da floresta e a trilha sonora folk é incrível, só o desenvolvimento deixou um pouco a desejar. A lenda poderia ter sido mais explorada, mostrando os tais poderes da Huldra, mas acabou focando mais nos personagens centrais. Os dois em meio a isso criam um vínculo bonito de amizade e revelam segredos pessoais, um dos segredos a Huldra é capaz de sanar e ao final vemos que assim se fez, pois ela se simpatizou com os caras.
Silje Reinåmo fez de Thale uma criatura muito interessante, sua feição na maioria das vezes assustada nos conquista, mas ela mostrou do que é capaz ao final, quando foi perturbada pelos homens que queriam capturá-la juntamente com o homem que a prendeu desde o início do filme.
Depois de "O Caçador de Troll" (2010), um excelente filme que explora outro mito nórdico, vale a pena conferir "Thale", pois nos dá a oportunidade de um diferencial dentro do cinema, e mostra mais uma lenda desse folclore riquíssimo. Mesmo com um orçamento baixo Aleksander Nordaas conseguiu fazer um filme muito bem feito, inclusive com efeitos especiais, que apesar de simples e as poucas aparições das Huldras, não deixam a desejar. É impressionante! Um filme fantástico que não pode passar despercebido pelos curiosos de plantão!
quinta-feira, 8 de novembro de 2012
Ovelha Negra (Goats)
O filme "Goats" baseado no livro de Mark Jude, acompanha a história de um jovem a caminho da universidade, que tem que deixar a sua estranha família para trás. No filme, Ellis (Graham Phillips), de 15 anos, parece ser o membro mais adulto de sua excêntrica família. A sua mãe (Vera Farmiga) é uma hippie que namora um malandro (Justin Kirk). O seu pai (Ty Burrell) saiu de casa anos atrás e agora tem uma nova família. E por último, mas não menos importante, o homem cabra, figura paterna de Ellis. Ele mora numa casa que fica na propriedade da mãe de Ellis, e em troca ele cuida da piscina, do jardim, e das cabras. Um homem diferente que preza a natureza e as sutilezas da vida. Mas ao mesmo tempo um homem cuja vida não tem um ritmo comum. O homem cabra planta maconha e passa o dia todo chapado. Ele adora fazer longas caminhadas com as cabras. Inclusive Ellis por várias vezes o acompanha.
O pai do garoto saiu de casa e por isso a figura paterna e toda a transição de sua vida ficou por conta do homem cabra, mas isso é exposto muito sutilmente, sem demonstrações ou qualquer diálogo. São momentos, como quando Ellis vai estudar fora, sente saudade dele e fica bravo por não enviar nenhuma notícia. Sua mãe é totalmente lunática, vive sempre entre dois pólos, frequentando as palestras "new age", e se exaltando quando o nome do ex-marido é mencionado. Ou seja, nesse mundo nada convencional, o garoto poderia se construir de maneira errônea, mas ele consegue captar a essência de cada um e aproveitá-las de um jeito bem legal. É a fase das escolhas e dos caminhos. Contrastando mundos, por um lado o homem cabra que o criou desde pequeno o influenciando a gostar da natureza, e o pai verdadeiro do qual a vida é totalmente diferente, mas as personalidades díspares podem andar juntas e somar na personalidade do menino.
Já longe de casa, estudando, começa a conviver com o seu pai que pouco via, de início a relação é uma mistura de rancor e frieza, mas Ellis é muito inteligente e percebe as qualidades dele apesar de tê-lo abandonado, começa a conhecê-lo, a entendê-lo, e assim admirá-lo. Seu pai construiu uma vida nova, sua mulher que por sinal é muito simpática espera um bebê, do qual Ellis se vê envolvido depois. São dois extremos, por um lado o homem cabra completamente descompromissado com a vida "real", o outro ambicioso e consistente em termos ditos comuns. Ellis, por sua vez, entra em fase de mudanças, ele decide estudar já que tem capacidades, cheio de vontade e entusiasmo permanece no colégio que o preparará para a universidade, que foi também a mesma de seu pai; este que é constantemente chamado de idiota pela ex-mulher, porém Ellis o vê de outro jeito agora. Sua mãe e o homem cabra também são vistos diferentemente por ele nesta fase, esse homem o ensinou a ser aberto para a vida e, sem dúvida, ele é a sua base. Nesse ponto é interessante observar o quão importante é conviver com pessoas de olhares diversos, Ellis decidiu seu caminho, mas sabe da importância que sua família nada comum tem sobre ele. E especialmente, o homem cabra.
O filme é totalmente despretensioso, é uma história que está sendo contada e nada mais. É uma comédia leve sobre pontos de vista, que mostra que é normal se influenciar pelas pessoas das quais amamos, pegar o que elas têm de melhor a nos oferecer e usar isso a nosso benefício, como algo que nos inspire a sermos melhores. Tentar compreender o que cada um tem para nos mostrar, e respeitá-los da maneira que são. Só assim seremos plenos, quando aceitarmos de verdade as pessoas e a forma delas pensarem.
Vale dar uma conferida e ver David Duchovny interpretando o homem cabra.
terça-feira, 6 de novembro de 2012
Fjögur Píanó
O grupo islandês Sigur Rós lançou o clipe "Fjögur Píanó", faixa que está em seu mais recente álbum, "Valtari". Dirigido por Alma Har'el e protagonizado por Shia Labeouf e Denna Thomson. Os atores aparecem completamente nus no vídeo.
Admirável quando um ator aproveita oportunidades opostas das quais está habituado, no caso Shia, os filmes comerciais, agora o vemos de maneira diferente, assim como um ator deve ser. Versátil!
O clipe tem sido descrito como enigmático e estranho, como uma "sequência de sonhos". No entanto, ao decodificar o simbolismo do vídeo, descobrimos que há uma história sendo contada, aquela que é contada de uma forma muito figurativa. A explicação oficial diz que se trata de um relacionamento difícil. A cena das borboletas, por exemplo, representa "coisas bonitas que morrem rápido". Embora isso possa explicar algumas partes, há outros elementos que não podem ser ignorados. O casal está, obviamente, vivendo em um estado de prisão virtual, onde cada aspecto de suas vidas é manipulado por forças externas, o ambiente da vida de Shia e Denna é controlado e modificado pelos manipuladores; eles são drogados, têm olhos vendados e são levados à força a estranhas viagens dissociativas, e suas tentativas de se libertar são inúteis. Em suma, o casal é totalmente impotente contra o mundo à sua volta.
De fato um vídeo cheio de simbolismos. O som é experimental e em cada um surte um efeito, assim como o vídeo, que para alguns soam como um monte de imagens sem sentido, e para outros imagens repletas de emoções.
Os clipes de Sigur Rós são sempre de muito bom gosto e qualidade, além de trazer beleza, tanto simbolicamente como visualmente. Para aqueles que já estão habituados ao universo da banda vão adorar e para aqueles que não conhecem é uma ótima oportunidade. Sigur Rós é uma banda única, suas canções atingem sutilmente nossa alma. É inclassificável!
Assista aqui
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
O Homem das Sombras (The Tall Man)
Antes de mais nada este é o tipo de filme que quanto menos souber melhor, portanto, se ainda não o viu, aviso que haverá spoilers no texto.
"O Homem das Sombras" (2012) é um suspense inteligente, ele cumpre com a promessa de surpreender, as reviravoltas em que vilões viram vítimas e vítimas em vilões são incansáveis. A direção é do francês Pascal Laugier (Martyrs - 2008), que também assina o roteiro. Julia é uma enfermeira a quem o pessoal de uma pequena comunidade recorre quando tem problemas. A cidade de Cold Rock tem uma onda misteriosa de desaparecimentos de crianças atribuídas aquele que a cidade chama de "homem alto", algo que alguns veem como apenas uma lenda e outras como o motivo dos desaparecimentos. Julia não acredita e acha que tudo não passa de uma lenda, até que uma noite o seu filho é sequestrado.
O filme tem sido vendido como terror, mas não se engane, não tem sangue jorrando, psicopata que rouba criancinhas, nesse longa nada é o que aparenta ser. A mudança a partir da segunda parte pode decepcionar as pessoas que esperam outras coisas, mas tem que ser dito que a criatividade não foi poupada.
Jessica Biel diferentemente dos seus outros papéis, consegue nos fisgar por uma personagem completamente profunda. O porquê das crianças estarem sumindo é revelado um pouco depois da metade do filme, e é aí que entra o melhor. Do início que parecia terror, que passa para o suspense e avança para o drama, consegue misturar crítica social. Dentro da história as crianças raptadas são enviadas para um lugar dito superior, pois acredita-se que no lugar que estão não vão conseguir ser alguém melhor, como explicado em um dos diálogos mais incríveis, do qual tudo não passa de um ciclo vicioso. E que se não quebrá-lo as crianças não terão uma oportunidade de crescer, ter conhecimento e informação.
Destaque também para Jodelle Ferland (que sempre interpreta crianças sinistras), no filme ela é uma menina que não fala devido a um possível trauma em sua infância e que parece saber mais do que os outros.
Ponto positivo para o clima criado, as reviravoltas e a crítica social que foi inserida e fez com que o filme se tornasse mais do que apenas um bom entretenimento. Ele envolve, surpreende e ataca nosso psicológico. pensamos sobre educação, futuro e sobre o círculo vicioso da sociedade.
Acima de qualquer coisa "O Homem das Sombras" é um filme inteligente, que passa a ideia de que o conhecimento é a chave para todas as portas, sem ele estamos fadados a repetição, a ignorância, e quando o lugar em que vivemos não nos apresenta oportunidades, não podemos nos acomodar, pois se ficarmos estaríamos passando o mesmo para nossos filhos, e assim por diante.
O filme engana o espectador, e apesar da narrativa parecer confusa ela se desenrola de maneira criativa e ao final tudo é explicado.
E a coisa certa será que realmente está certa? Tire suas próprias conclusões!
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