quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência (En Duva Satt på en Gren och Funderade på Tillvaron)

"Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência" fecha a trilogia "sobre ser um ser humano" de Roy Andersson, e mais uma vez ele fez a proeza de analisar a espécie humana de fora, consequentemente refletimos sobre toda a estupidez que permeia nossa vida. O primeiro "Canções do Segundo Andar" (2000), continua sendo meu favorito, talvez pelo impacto da narrativa e seus simbolismos ao retratar a morte da cultura e o humor negro em relação a nós humanos em não ter mais tempo de sentar, ouvir e pensar diferente. O segundo "Vocês, os Vivos" (2007), é ainda mais irônico e ridiculariza certas ações das quais nós nem percebemos que fazemos no dia a dia, todas praticamente sem sentido, mas que continuamos a fazer para a engrenagem seguir funcionando. A comédia é inserida em todos os seus filmes, porém não é nada convencional, rimos mas logo percebemos que estamos rindo de nós mesmos. O terceiro segue dois homens – um vendedor ambulante e um homem com um ligeiro distúrbio mental. Pelo filme afora vamos assistindo às explicações do vendedor de como a sociedade realmente é. O longa é baseado num detalhe (os pássaros pousados em galhos) de um famoso trabalho a óleo de Pieter Brueghel, intitulado "Os Caçadores na Neve".
Se a existência for analisada de muito perto ela se torna insustentável, por isso o distanciamento se faz necessário, o absurdo está praticamente em tudo, como no cotidiano tedioso de empregos escrotos, de pessoas que não se interessam pelo outro verdadeiramente e que apenas os usam conforme vão precisando. A aparência dos personagens segue o padrão dos outros longas anteriores, todos pálidos, lentos e quase sem vida. Completamente melancólicos, os dois protagonistas vendem objetos que dizem alegrar pessoas, eles garantem o riso, o que torna tudo ainda mais engraçado é o fato de que tanto os objetos como eles próprios são inúteis. Tomar consciência da sua existência é uma das coisas mais desesperadoras, um dos escapes dos personagens é a bebida, cenas no bar são uma constante. Em dado momento um deles diz: "O que seria da vida se não tomássemos umas?"
A narrativa não tem linearidade, são cenas aleatórias que alternam personagens e situações, algumas bem difíceis de decifrar, mas que propõem o que o próprio título explica, a câmera sempre está estática, mas há grande movimentação de personagens, principalmente aqueles que estão ao fundo. Muitas coisas se passam na tela, desde bobagens cotidianas a grandes tragédias, incluindo a guerra, massacres e o poder que alguns seres acreditam ter sobre outros. Simbolismos vão e vêm, repetem-se conforme o desenrolar, um deles é a frase sempre dita ao telefone: "Fico feliz que esteja tudo bem". Frases que costumamos articular no automático sem se preocupar em sua veracidade, por exemplo quando perguntamos se está tudo bem a alguém, sendo que nem queremos saber a resposta. Não importa, são apenas convencionalidades, infelizmente.

Antes que o título te seduza é preciso saber que se está diante de um filme existencialista e filosófico, para quem não tem o hábito de assistir obras com narrativas diferenciadas não irá gostar, tudo nele é estranho, agora quem curte experimentar e aprecia este estilo de cinema vá sem medo. É um estudo crítico e cômico ou ainda trágico sobre os seres humanos. Diversas interpretações podem ser dadas, é subjetivo e particular, algumas passagens refletem o quanto estamos deslocados no mundo, apenas percorrendo pelos dias sem nem mesmo saber se é quarta ou quinta. Nos conectamos com a história de acordo com as situações que se assemelham a nossa própria vida. Vale ressaltar seu prólogo que retrata três mortes e que até mesmo aí o ser humano é capaz de ser absurdo e sem sentido.

"Um Pombo Pousou..." observa o ser humano em momentos cotidianos, o como ele acontece na vida e o que a vida representa para ele. Mesmo tendo um tema pesado e até medonho, pois muitas pessoas evitam pensar literalmente em suas vidas e no seu inevitável fim, tudo é conduzido com um peculiar bom humor, rimos das situações, mas logo o sorriso se afrouxa e lembramos que também fazemos parte deste grande teatro chamado vida. 

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