quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Rainha de Copas (Dronningen)

"Rainha de Copas" (2019) dirigido por May el-Toukhy (No Final das Contas - 2015) é um filme que abre um leque de discussões ao abordar de forma crescente e explícita o quanto o ser humano visto de perto é terrivelmente repleto de segredos, toca em tabus, abuso e liberdade sexual feminina. Direção e construção narrativa primorosas e ainda coroada pela poderosa interpretação de Trine Dryholm.
Anne (Trine Dyrholm) é uma advogada do direito das crianças e dos adolescentes. Acostumada a lidar com jovens complicados, ela não tem muitas dificuldades para estreitar laços com seu enteado Gustav (Gustav Lindh), filho do primeiro casamento de seu marido Peter (Magnus Krepper), que acaba de se mudar para sua casa. No entanto, a relação que deveria ser paternal se torna uma relação romântica, envolvendo Anne em uma situação complexa, arriscando a estabilidade tanto de sua vida pessoal quanto profissional.
Acompanhamos o redescobrir do desejo de Anne quando seu enteado Gustav vem para morar com eles na Dinamarca, o garoto de 17 anos possui dificuldades para se socializar e o distanciamento com o pai não ajuda muito na interação, a família bem-sucedida e aparentemente perfeita o recebe de braços abertos e Anne acostumada a lidar com adolescentes consegue estreitar laços, no início sente-se muita empatia por ela ao vê-la cuidando das filhas e enfrentando casos terríveis na justiça sobre abuso de menores, muitas vezes a vemos transtornada com as decisões da justiça e sua luta para que as vítimas deponham, a relação com o marido é boa, mas existe um tédio e uma rotina que parece não proporcionar mais nada além do comum, a juventude de Gustav acende em Anne um desejo incontrolável e uma vontade de viver que há tempos não sentia, sua aura muda e revela uma mulher completamente sedutora e mais a frente manipuladora e abusadora. Existem camadas extremamente polêmicas e apesar do filme ser explícito em cenas de sexo ao mesmo tempo consegue ser sutil em todas as nuances de seus protagonistas, de modo gradativo a narrativa se transforma e revela facetas desconfortantes, Anne por uma motivação de desejo se envolve com Gustav e se redescobre sexualmente, este que se enreda num jogo psicológico desenfreado e ameaçador, de uma aventura instigante e moralmente errada se dá um jogo de poder abusivo e complexo.
Coloca em xeque questões morais, pois ela é uma advogada que lida exatamente com o que está cometendo, é inevitável não sentir desconforto à medida que Gustav vai sendo desacreditado, é um ótimo meio de expor com clareza que a vítima estará sempre numa posição de impotência, numa relação desse tipo o jogo de poder é enorme e a pessoa mais madura nunca deixará sua integridade ser atingida. 

Muitos homens e também mulheres quando se deparam com histórias de abuso julgam a vítima, seja por não ter contado de imediato ou mesmo questionando se realmente foi abusada, essa desvalorização é mostrada no filme seja quando as vítimas recorrem a Anne e titubeiam em denunciar por medo de não dar em nada ou por medo de revanche, e quando Gustav decide denunciar e ela discorre sobre o quão pequeno ele é diante da posição dela. O jogo psicológico é tenso e esmagador e vai minguando esse garoto, em sua casa ela nega e cria situações para que o marido sempre fique do seu lado. 

"Rainha de Copas" é um forte suspense e potente em suas imagens, retrata com sensibilidade e intensidade conflitos morais, o redescobrir da sexualidade feminina, o abuso, o poder e o revelar da vilania para se manter numa imagem e posição perante a sociedade.

Um comentário:

  1. Ainda não vi este filme, tenho curiosidade.

    A atriz Tryne Dryholm trabalhou em "A Comunidade" de Thomas Vinterbeg.

    Abraço

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