quinta-feira, 26 de setembro de 2019

O Tradutor (Un Traductor)

"O Tradutor" (2018) dirigido por Sebastián Barriuso e Rodrigo Barriuso conta a história real do professor universitário cubano Malin, na verdade, Manuel Barriuso Andino, que vê sua vida transformada quando é designado para ser o tradutor numa ala infantil de um hospital destinado às vitimas do desastre nuclear de Chernobyl. Ambientado em 1989, as primeiras imagens são de Fidel Castro recebendo Gorbachev, Cuba necessita muito da ajuda da URSS, mas devido ao colapso e, por conseguinte, à sua ruína, as coisas começam a mudar no país, inicialmente as aulas de literatura russa são canceladas e novas funções são designadas aos professores, Malin vivido visceralmente por Rodrigo Santoro se vê obrigado a trabalhar num hospital que recebe vítimas do desastre de Chernobyl, especificamente a ala infantil, o sofrimento acaba sendo uma constante em sua vida ao ponto de sugar toda a sua energia, o sistema de saúde de Cuba reconhecido como um dos melhores do mundo recebia essas crianças para o tratamento, mas a comunicação era difícil e, portanto, Malin com ordem do governo inicia esse trabalho. 
Acompanhamos todo o cenário político da época e as suas transformações juntamente com as transformações pessoais do protagonista, sua vida até então boa e sem preocupações passa a ser um fardo, pois o peso de conviver com crianças em estados críticos e terminais deprime e o significado das coisas se modificam, por conta desse dia a dia o casamento se desfaz, não há diálogos e tudo parece pequeno para Malin, sua esposa é curadora de uma galeria de arte e por causa de sua experiência com as crianças que lutam pela vida não consegue entender os problemas dela em relação ao trabalho e as responsabilidades de resolver sozinha as situações cotidianas, grávida do segundo filho resolve deixar a casa e ir morar por uns tempos com seus pais, Malin também se distancia da vida do filho e vemos o como o pequeno é afetado por essa ausência, não é fácil a rotina no hospital, ter que ser o interlocutor de notícias desagradáveis aos pais das crianças, nesse ambiente sufocante ele então inicia formas de suavizar, ou seja, introduz histórias e interação uns com os outros, ouve e percebe o como cada um se sente, o carinho e a compreensão faz total diferença e é aí que o filme nos toca profundamente, é bonito ver o como Malin se dedica a amenizar o sofrimento promovendo leitura, aprendizado e diálogo, o completo oposto em sua casa, mas ali ele faz o possível para o lugar ser menos pesado. A enfermeira Gladys (Maricel Álvarez), ajuda nesse processo, pois possui empatia e sua dedicação também impressiona.

O filme não se aprofunda nas questões políticas, mas a realidade do país socialista é retratada de acordo com as vivências de Malin, observamos vários eventos importantes, como a queda do muro de Berlim e a crise econômica que assolou Cuba devido o colapso da União Soviética, são cenas marcantes e em sua maioria emocionantes, destaque para a ambientação com todos os detalhes que nos transportam para a época. E, claro, a linda dedicação de Rodrigo Santoro ao personagem, percebe-se que deu alma e muita vida para interpretá-lo, brilhante execução.

"O Tradutor" é uma obra que emociona, mas não apela em momento algum para excessos, o desenvolvimento e a transformação vem de forma natural, as vivências do protagonista inspiram muitas reflexões sobre as alternativas de se ajudar os outros em situações críticas, diz como a educação sempre é o melhor caminho fortalecendo assim a empatia, o afeto e olhares diversos, além de colocar tudo em paralelo com o conturbado cenário político.

*O filme foi dirigido pelos filhos de Malin, que na realidade se chama Manuel Barriuso Andino.
*O russo impecável de Santoro se deu por uma imersão na língua durante quatro semanas, estudou e tomou aulas para acertar o ritmo e trabalhou na memorização não apenas de suas falas, mas na de seus colegas de elenco também.

Um comentário:

  1. Parabéns pela crítica! Realmente é belo (e triste filme). E grande atuação de Rodrigo Santoro e de Maricel Álvares. Se não me engano o filme concorre ao Oscar de Filme Estrangeiro, não?

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