sexta-feira, 30 de março de 2012
Histeria (Hysteria)
Em 1880, a Inglaterra ainda tem dificuldade em abandonar velhos hábitos, em especial na medicina. Nessa época, que não se acredita na existência de germes e bactérias, ainda são usados métodos iguais para qualquer tipo de doença. Mortimer Granville (Hugh Dancy) é um jovem médico de pensamentos modernos que sofre para conseguir ajudar as pessoas ao seu redor, e para manter um emprego fixo, já que ninguém gosta de suas inovações. Quando começa a trabalhar com o Dr. Robert Dalrymple (Jonathan Pryce), Mortimer conhece a "doença" chamada Histeria, que estaria afetando metade das mulheres de Londres. O jovem também conhece as duas filhas do velho doutor, a comportada Emily (Felicity Jones) e a revoltada Charlotte (Maggie Gyllenhaal). Ao mesmo tempo que os tratamentos para a Histeria evoluem, Mortimer começa a ver com outros olhos o papel das mulheres na sociedade em que vive e a duvidar se a Histeria realmente é uma doença.
A tal da Histeria era um termo médico para a "doença" que as mulheres tinham na época, quando elas ficavam agitadas, emocionalmente abaladas e agressivas (efeitos normais de ciclos menstruais ou apenas desejo sexual, já que era uma época de muita repressão às mulheres). O tratamento era um estímulo sexual com os dedos ou com jatos d'água, feitos claro, por um profissional.
"Histeria" conta de modo muito leve e com o tão conhecido humor inglês a história do primeiro vibrador numa sociedade completamente machista, onde as mulheres não tinham espaço, eram reprimidas, insatisfeitas e quando alguma se sobressaía como foi o caso de Charlotte, era vista como uma mulher voluntariosa, histérica, e que jamais se casaria, pois nenhum homem se atreveria a domar uma mulher assim. A ideia do vibrador, ou massageador, veio porque as mulheres cada vez mais procuravam o tratamento manual, e assim as mãos dos médicos ficavam dormentes. O filme revela o assunto de forma superficial, colocando ênfase também no começo da mudança em relação de como as mulheres eram vistas no século passado.
Apesar do filme ser classificado como comédia romântica, ele não se encaixa perfeitamente no gênero, tem toda a história de romance e de opostos que se atraem, mas o foco está no interessante retrato desse pedaço da História em que ocorreram grandes mudanças.
O filme retrata uma sociedade diferente, cheia de elegância e pomposidade, mas que na verdade era dominada pelo machismo. As várias cenas em que as mulheres estão no consultório com as pernas abertas, porém cobertas com descrição são um tanto engraçadas, os orgasmos são dos mais variados, e os médicos ao final dizendo que a consulta foi satisfatória e aliviou a paciente da histeria são momentos pitorescos. A ideia era de que a mulher não tinha prazer sexual como o homem, portanto, logo era diagnosticada histérica, mas graças a invenção do vibrador, novas descobertas foram feitas e a mulher avançou grandes passos na sociedade.
Outro ponto muito bom do filme é Edmund, amigo de Mortimer, um homem de fortuna que esbanja com as novidades tecnológicas da época, inclusive ele foi um dos que ajudaram a criar o tão adorado vibrador, aparece também o telefone, super novidade na época e que só pessoas abastadas podiam ter.
O ritmo é ótimo, o conteúdo interessante, divertido sem ser debochado. É um tanto quanto estranho e curioso, digamos que é uma versão romanceada sobre o primeiro vibrador, e isso já vale a pena para querer conferi-lo.
quarta-feira, 28 de março de 2012
Meu Monstro de Estimação (The Water Horse - Legend of the Deep)
Um filme de fantasia infantil dirigido por Jay Russel, é uma adaptação do livro de Dick King-Smith, autor inglês (Babe - O Porquinho Atrapalhado), este sabe como equilibrar um bom drama com uma comédia agradável sem soar patético.
A história conta sobre uma amizade entre um menino e um monstro, até pode parecer clichê, porém consegue trazer detalhes incríveis, gera simpatia pela amizade tão mágica, além de ter uma fotografia deslumbrante.
Ambientada na Escócia de 1930, Angus (Alex Etel) é um garoto solitário, que passa os dias sonhando com a volta do pai, que está servindo a marinha. Ele encontra um ovo misterioso, que revela a lenda sobre o monstro do lago Ness. O menino leva o ovo para casa e resolve criá-lo, dando o nome de Crusoé. Logo se vê em encrencas, pois o animal cresce descontroladamente. O novo empregado da casa, Lewis Mowbray (Ben Chaplin) reconhece que o estranho animal é o lendário cavalo do lago, uma criatura mágica. Para completar um pelotão do exército está acampado na propriedade de sua família, é a segunda guerra mundial, e estão caçando submarinos alemães.
O filme é bem infantil, embora agrade os adultos também, as cenas de aventuras são engraçadas, o monstro Crusoé cativa e entramos no reino da fantasia. Leve, interessante e muito bonito, "Meu Monstro de Estimação" nos faz voltar a ser criança e a sonhar novamente com um mundo imaginário. Angus é um personagem bem profundo e sensível, ele sofre pela ausência do pai, e seu amadurecimento acontece de forma inocente em meio a um ambiente cruel.
Em tempos tão difíceis em que fantasia é mera bobagem, essa é uma ótima opção, a pureza da história faz desse filme um diferencial.
O pequeno Alex Etel dá vida ao personagem Angus de um modo muito particular, de uma inocência que parece não mais existir nas crianças de hoje em dia. É muito bom ver uma criança atuando com tanta segurança, mas sem perder a essência do universo infantil.
"Meu Monstro de Estimação" é um filme criativo, belo e que emociona ao mesmo tempo que diverte. Vale ver!
segunda-feira, 26 de março de 2012
Querida, Vou Comprar Cigarros e Já Volto (Querida Voy a Comprar Cigarrillos y Vuelvo)
Ernesto (Emilio Disi) é um corretor de imóveis de 63 anos que tem uma rotina tediosa em uma pequena cidade da Argentina. Um homem que nunca aproveitou a vida, e tem a sensação que nada poderá mudar as circunstâncias que o rodeiam, porém um homem misterioso aparece e lhe faz uma proposta irrecusável. Voltar a uma época qualquer de sua vida e passar dez anos em seu passado. Com o pacto aceito e feito, retornará ao ano presente de 2011 e receberá uma mala com um milhão de dólares. Os dez anos no tempo presente equivale apenas cinco minutos, portanto, a desculpa usada pelo protagonista para gambelar a sua mulher é a de ir comprar cigarros.
É um bom filme, utilizando meios criativos, como colocar o autor do conto, Alberto Laiseca, com seu bigode gigantesco para ajudar a explicar certas passagens, ou o início quando o tal homem adquire poderes mágicos. O conhecido ditado: um raio não cai duas vezes no mesmo lugar aqui é questionado.
O tema viagem no tempo é bem batido, porém o roteiro nos diverte e nos faz pensar também, ao contrário de outros filmes em que as pessoas voltam ao passado com o desejo de consertar os erros, neste Ernesto quer conseguir fama, dinheiro e mulheres, mas sempre acaba se envolvendo em encrencas, como plagiar a música "Imagine" de John Lennon, que não é exatamente igual, pois ele não sabia a letra perfeitamente e nem era fã de Beatles, entre outras, como inventar o formato de reality shows na TV. É hilário!
Uma comédia divertida e inteligente, um homem derrotista e acomodado e um outro misterioso e esquisito. Com um roteiro perspicaz faz com que a trama se desenrole facilmente, de simples absorção garante boas risadas.
Dirigido por Gaston Duprat e Mariano Cohn, que trabalham juntos desde 1990, o filme é engraçado e diferente, ao mesmo tempo que simples. Um misto de humor negro, surrealismo e filosofia.
Eusébio Poncela, o homem que adquiriu poderes mágicos e a imortalidade tem uma boa expressão, um personagem realmente interessante.
"Todos os animais, com exceção do homem, são imortais. Porque ignoram a morte."
sexta-feira, 23 de março de 2012
Tiranossauro (Tyrannosaur)
O diretor Paddy Considini é mais um ator que se arrisca na direção de longas, e consegue fazer de seu "Tiranossauro" algo bem poderoso.
Peter Mullan interpreta Joseph, um viúvo aposentado e amargurado, ele desconta a sua raiva e seu fracasso como ser humano nos outros. Afogando suas mágoas na bebida, o que é só mais um motivo para se meter em confusões e arranjar brigas.
Joseph é um homem sem fé, seja em Deus ou em qualquer outro aspecto da vida, ele encontra em Hannah (Olivia Colman) um suporte para manter sua alma anestesiada. Ela é uma mulher que tem um casamento falido e que apanha constantemente de seu marido. De início Joseph julga Hannah uma mulher burguesa, mas logo chega uma situação em que ela não admite ser mais surrada e busca apoio na casa de seu amigo. Juntos encontram um meio de sobreviver, um meio termo, na religiosidade de Hannah ou na vida prática de Joseph.
A violência retratada no personagem de Peter Mullan é caracterizada pelos erros do passado, erros dos quais pessoas próximas a ele sofreram também, ele não é capaz de se perdoar e isso o perturba, o sufoca dia após dia. Apesar de tudo Joseph é um homem bom, mas as circunstâncias da vida o fizeram ser frio e medíocre.
A vida de Hannah é um tapa na cara da sociedade vivida por aparências, pois é casada com um homem bem-sucedido, que jamais seria visto como um estuprador e espancador de mulheres, e ela uma mulher de convicções religiosas luta para poder seguir em frente, até que o desespero a toma, e assim conhece seu lado violento.
Ainda em luto pela sua mulher (morte pela qual ele se culpa), Joseph conhece Hannah, e ela entra em sua vida e mostra que existem vidas mais complexas do que a dele, e dessa forma um tenta ajudar o outro à sua própria maneira.
"Tiranossauro" é um filme tenso e bem real, que mostra o quão somos tortos, e a vida realmente não dá colher de chá pra ninguém, os problemas aparecem para todos, só muda o como lidamos, pois cada um recebe e absorve a vida de um jeito. Todos temos dois lados, somos anjos e demônios.
A trilha sonora é maravilhosa e compõe perfeitamente com os silêncios de Joseph, pois é neles que vemos o quanto aquele homem sofre. É impressionante!
O filme já começa sem respiro, é seco, tenso e não é à toa que foi eleito o melhor filme britânico do ano de 2011. Um drama devastador que une duas pessoas pelas suas desolações, um romance atípico. Todos nós temos que enfrentar nossos "dinossauros", seja como for.
Uma bela história de redenção pelo altruísmo. A escolha do título foi uma ótima sacada. Vale a pena assistir!
quarta-feira, 21 de março de 2012
O Enigma de Kaspar Hauser (Jeder Für Sich Und Gott Gegen Alle)
Dirigido por Werner Herzog, "O Enigma de Kaspar Hauser" (1974), cujo título original "Jeder Für Sich Und Gott Geggen Alle", que ao pé da letra significa: "Cada um por si e Deus contra todos", conta a história de um personagem deslocado, que enfrenta o mundo de uma maneira pura e ingênua e que vai contra todas as regras impostas, já que nunca teve contato com o mundo externo.
Kaspar Hauser talvez tenha sido um homem de linhagem, de sangue nobre, que permaneceu trancafiado em um calabouço sem ter contato com o mundo externo, recebendo comida a noite sem qualquer tipo de comunicação, até que um dia é retirado de seu cárcere e abandonado em uma praça com uma carta anônima na mão, um chapéu e um livro de orações. Encontrado por um morador de Nuremberg é levado à delegacia onde começará sua vida no mundo civilizado.
Hauser começa a aprender suas primeiras palavras dentro da prisão, onde é acomodado, sendo objeto de curiosidade da população. Como os gastos eram grandes com ele morando na delegacia, acabou virando atração de circo por um certo tempo, depois sob a proteção do Sr. Daumer, um homem rico da cidade, ele é apresentado às convenções sociais, religiosas, filosóficas e assim reagindo de maneira bem particular. Quando apresentam o conceito de Deus, ele responde de modo incisivo: "Antes devo aprender ler e escrever melhor para poder compreender Deus melhor."
Kaspar Hauser nos mostra que o modo como pensamos é imposto pela sociedade e pelas convenções. Na sua naturalidade, onde começa do zero, sem que influências externas interfiram, ele pensa por si e responde de forma muito inteligente, deixando as pessoas ao seu redor sem palavras.
Embora ele seja amado pelos mais próximos, quando começa a ser inserido à sociedade, começa sofrer atentados, talvez por medo de descobrirem a origem dele, e atrapalhando a linha de sucessão, mas isso sempre será um mistério.
Depois que Kaspar Hauser morre, fazem uma autópsia e creem terem descoberto a explicação, seu fígado era deformado, seu cerebelo superdesenvolvido, o lado esquerdo de seu cérebro era menor que o direito, e é assim que pensaram ter revelado o segredo daquela existência. O escrivão comemora o final de seu protocolo relatando a vida e morte de Kaspar, mas sabemos que aquilo tudo não passa de ilusão.
O filme é baseado em fatos reais, sobre um sujeito tratado como bicho até os 17 anos, numa pequena cidade chamada Nuremberg de 1928.
Kaspar ensina ao invés de ser ensinado, mostra que nem tudo é óbvio como dizem ser, quando contestado sobre os dogmas, ele é direto e mostra de maneira ingênua, porém inteligente o seu modo de enxergar as coisas. Às vezes nos perdemos no meio de tantos pensamentos impostos, que nem nos damos conta o que pensamos sobre aquilo realmente, apenas somos conduzidos, como uma ovelha indo para seu rebanho.
Werner Herzog utilizou um ator com problemas mentais para interpretar Kaspar Hauser (Bruno Schleinstein), o que deu bastante realismo nas cenas.
Um filme feito em 1974, ambientado no ano de 1928, uma obra-prima que nos convida a conhecer o mundo sob a ótica da pureza, onde os parâmetros da sociedade não fazem sentido algum. Quem os criou? Para quê servem? E que mesmo assim moldam a nossa existência. Kaspar nos dá aquela sensação de deslumbramento para certas coisas que nem damos atenção, pequenas, simples, mas inegavelmente belas, e que sim, fazem todo o sentido!
"Vocês não ouvem os assustadores gritos ao nosso redor que habitualmente chamamos de silêncio?"
terça-feira, 20 de março de 2012
Era uma Vez na Anatólia (Bir Zamanlar Anadolu'da)
Um grupo de homens contendo policiais procuram por um corpo nas distantes estepes turcas, assim o diretor Nuri Bilge Ceylan nos conduz a uma fábula lenta e meditativa em cima dos personagens que compreendemos aos poucos, e também a real intenção do filme. Os medos, as inseguranças de cada homem naquela busca incansável.
O filme caminha vagaroso, indo a lugares cada vez mais inóspitos, de repente vemos aquele bando de homens numa pequena casa comendo e bebendo depois de uma exaustiva procura, descansam apenas para recomeçar, destaca-se o rosto de uma mulher sob a luz do lampião, depois de quase uma hora de filme, eis que aparece a primeira figura feminina, os homens abobados com tanta beleza depois de tanto cansaço. O longa é essencialmente masculino. Vemos um médico, um promotor, um motorista, um policial, dois escavadores, um detetive e o bandido. Aos poucos vamos conhecendo-os e entendendo-os. Apesar de ter uma trama policial, não espere muita ação. O propósito não é encontrar motivos para o assassinato, culpados, etc.
Há uma cena incrível do promotor descrevendo a maneira como o morto foi achado e tal. Vê-se a frieza da profissão. Nos apegamos mais a figura do médico, estranho entre os demais, chega mais próximo de como nos sentimos ao ver o discorrer da história, ele olha para o assassino de modo diferente, é mais perceptivo do que os outros. A fotografia é outro ponto de destaque, é excentricamente bonita, especialmente a noturna, toda amplidão e o silêncio que rodeia essa jornada faz jus ao nome "Era uma vez na Anatólia", nos dando a sensação de fábula. Apesar de ser um filme longo, nos prende, é totalmente estimulante, temos vontade de conhecer aqueles homens, todos os seus segredos e seus medos. Principalmente de Kenan o assassino, que descobrimos muito pouco, nada fala, apenas dirige olhares direcionados e nada mais.
São histórias que se diluem conforme o desenrolar, quem sobra é apenas o promotor e o médico, por acaso aqueles que conhecemos um pouco mais durante a busca do corpo. Ao final ficam dúvidas, um ciclo que não se fecha, mas que mesmo assim não deixa no ar.
É sempre bom ver algo que surte efeito em nós, mesmo que não seja mostrado explicitamente, mas que apenas sugira, assim temos a oportunidade de julgar o que é importante ou não. Cada um tira do filme algo e com certeza cada um vê de forma diferente. A cena final que o médico-legista faz a autópsia do corpo é uma das mais interessantes, não vemos nada, ele apenas sugere, com palavras e olhares. Descobre-se mais e mais segredos. Dúvidas, conclusões. E opções de escolha. Nuri Bilge Ceylan (Três Macacos) traz um filme inteligente, estimulante e muito perceptivo.
Uma trama de fundo policial que se estende a dramas pessoais de cada homem ali presente. Um filme que pesa sobre nós e que fica para sempre, com certeza contarei diversas vezes a história que vi em "Era uma vez na Anatólia".
segunda-feira, 19 de março de 2012
Caos Calmo
O filme é baseado no romance homônimo de Sandro Veronesi, o título é uma contradição, pois como pode um caos ser calmo, como reagir com serenidade diante um evento que nos induz ao desespero? Dirigido por Antonio Luigi Grimaldi e protagonizado pelo genial Nanni Moretti que sempre consegue estabelecer em seus papéis dramáticos uma sutileza de humor, em que tira-nos um leve sorriso. Um dia Pietro salva uma mulher que estava se afogando numa praia, enquanto longe dali a sua própria esposa morria diante da filha, de um mal súbito. Quando volta à casa de veraneio onde a família passava férias, Pietro a encontra caída no chão, a filha inconsolável. Como resultado, Pietro deve administrar um luto bastante imprevisto e tem de assumir a responsabilidade paterna junto à filha em tempo integral. Pietro praticamente abandona o trabalho para ficar sentado em um banco de praça em frente a escola da filha, lá ele a espera dia após dia.
O desenrolar do filme é praticamente todo neste ambiente, lá ele conhece o vendedor de jornal, segue a rotina de uma moça que passeia constantemente com seu cachorro, faz amizade com o dono do restaurante onde almoça todos os dias, faz uma espécie de jogo apertando o alarme de seu carro para o menino com síndrome de down que passa com a mãe, e assim ele cria uma nova vida, as pessoas que querem conversar algum assunto com ele, passam a frequentar a praça, pois sabem que é somente lá que o encontrarão. Sua cunhada com quem teve um caso no passado, seus colegas do trabalho, e até uma breve aparição de um poderoso magnata (Roman Polanski).
O filme tem uma singularidade, Pietro tenta não demonstrar tristeza, desespero, para que sua filha possa sustentar o período, mas o que aparenta na realidade é que eles não sofrem de maneira alguma, a filha é muito carinhosa com o pai, é inteligente e madura para sua idade. Pietro apenas quer ficar ali perto, preocupado somente com o bem-estar da filha, seus sentimentos são nulos em relação a morte de sua esposa. A culpa talvez o perturbe, porque no momento que salvava uma vida na praia, sua mulher morria, isso irracionalmente com certeza passa pela mente de Pietro, e acredita que a filha o culpe por não ter estado lá. Ele busca em meio ao caos, uma calmaria, e é no banco de uma praça que encontra seu ponto de equilíbrio. Pietro sentado ali na frente da escola pede para a filha acenar da janela durante o intervalo, assim é a maneira dele de dizer: "Olha estou aqui, não vai acontecer nada", remetendo ao passado quando a mulher morreu e ele não estava lá do lado de sua filha.
Diante a este enredo tem uma cena de sexo que foi muito polêmica e até Dom Nicoló Anselmi, bispo da pastoral dos jovens na Itália ficou chocado, julgando que não havia sentimentos. Não há nada demais na cena, e como assim ausência de sentimentos? De certa forma, Pietro destrói a calmaria que permeia sua vida. Certo que a cena parece ser jogada do nada no filme, mas porque Pietro decidiu fazer sexo no lugar em que sua mulher morreu, justamente com a mulher que salvou aquele dia na praia? São lógicas difíceis de definir, mas é um tipo de raiva sendo expelida, uma maneira de se libertar. Não é possível superar a dor sem encará-la de frente, podemos escondê-la por um breve período, nos colocando em situações diferentes e criando um novo mundo, assim como Pietro fez na praça, mas é inevitável que ela apareça. Para superar o passado é necessário que joguemos ele fora e não guardá-lo para que volte em algum momento. O Caos Calmo é aquele período em que você nega a dor, a neutralidade que surge em relação as coisas. É preciso enfrentar o caos, ele tem seu tempo de acabar, basta esperar.
sábado, 17 de março de 2012
Sobre Relógios, Sonhos e Liberdade
"Sobre Relógios, Sonhos e Liberdade" (2012) é um curta produzido com incentivo da Secretaria de Cultura do Estado de Alagoas e protagonizado pelo Palmeirense Ailton da Costa, que também dirigiu e roteirizou.
Um homem que vive em função do tempo e do seu trabalho num escritório de contabilidade começa a ser atormentado por um sonho que o impede de distinguir o que é real e o que é ilusão. Palmeira dos Índios é o cenário da sufocante rotina que pressiona este homem, que como única alternativa sonha com uma tal liberdade.
O curta expressa a angústia e o sentimento de aprisionamento que nossa sociedade produz, a pressão e o estresse do dia a dia, ter que lidar com patrão que apenas exige, ter que chegar na hora e se abarrotar de trabalho, no fim do dia o que resta é ir para casa e se afundar nos próprios pensamentos, onde a solidão acaba sendo a única companhia.
No ambiente de trabalho, principalmente, o tempo é um fator importante, rapidez significa eficácia, tudo é muito urgente e isso desencadeia uma maneira automática de trabalhar que castra a criatividade e o convívio com outras pessoas. No curta o protagonista pressionado pelo meio em que vive acaba criando sonhos, essa mistura de realidade e ilusão o confunde e já não consegue mais se encontrar.
Quando nada produzimos o sentimento de estar perdendo tempo surge porque programamos nossas vidas em função dos relógios que nos cercam, compromissos e mais compromissos e a repetição de eventos cotidianos, que na maioria das vezes não trazem felicidade. Para ser livre é necessário saber quem você é de verdade e aonde se encaixa nisto tudo, é ser coerente consigo mesmo e não se vender à uma rotina com o único intuito de sobreviver.
"Sobre Relógios, Sonhos e Liberdade" carrega a crítica de uma sociedade que suga e estraga as pessoas em decorrência de uma rotina tediosa que vive em função dos ponteiros do relógio. E onde a liberdade se encaixa? Infelizmente, somente nos sonhos.
sexta-feira, 16 de março de 2012
Uma Vida Melhor (A Better Life)
O filme fala sobre a problemática dos imigrantes ilegais de forma bem emocionante aos olhos de Carlos Galindo (Demián Bichir), um mexicano que vive com seu filho adolescente Luis Galindo (José Julián) em uma cidade americana. O medo de serem deportados por estarem ilegais naquele país, e os sonhos de uma vida melhor tomam conta da trama, que tem o roteiro assinado por Eric Eason baseado na história de Roger L. Simon. Demián Bichir faz um personagem tocante, nos traz um homem de bom caráter, um trabalhador que busca dar o melhor ao seu filho, este namora uma menina que é parente de criminosos, de uma gangue da região. Pai e filho são distantes, o menino parece não gostar do homem que o criou, e rodeado de maus exemplos pelo fato do pai trabalhar o dia todo, o caminho do adolescente parece incerto. Carlos faz de tudo para poder comprar uma caminhonete, começar a trabalhar por conta, e assim a esperança de uma vida melhor surgir. Contudo a vida não dá trégua e todos os seus pertences de trabalho são roubados junto com a caminhonete por um homem que Carlos julgou ser de boa índole. Grande engano!
Daí ocorre uma reviravolta na história, onde o jovem segue em busca com o pai para encontrar o que lhe foi roubado, uma nova maneira de se comunicar acontece e Luís percebe o grande homem que seu pai é.
O ator mexicano Demián Bichir foi indicado ao Oscar 2012, graças a seu personagem retratando as dificuldades que um imigrante passa para poder arranjar um meio de melhorar a vida. É um belo trabalho, o tom amargurado, o olhar esperançoso em meio a situação desencorajadora, ele consegue passar a verdade em seus diálogos com o filho, e nos emociona por diversas vezes. Os créditos também vão para o jovem que interpretou Luís, um garoto complicado, sem rumo, que no final nos surpreende.
Talvez esse não seja o melhor filme sobre o tema imigração, mas consegue nos dar uma parte do que é ser uma pessoa que não é vista como ser humano, mas como burro de carga, a situação é desesperadora, e mesmo assim eles preferem se aventurar e correr o risco, ao invés de ficar no país de origem.
O filme é convincente, retrata uma humanidade sincera. Talvez esse filme chegue perto de muitas pessoas, mexa de algum modo, pois o sofrimento de um pai para dar o melhor ao seu filho é algo que vemos com frequência. Carlos Galindo é a alma do filme, sua tristeza misturada ao amor nos aproxima deste homem tão verdadeiro. Chris Weitz (Lua Nova) conseguiu meu respeito ao dirigir este longa, que tem uma narrativa mais intimista.
quinta-feira, 15 de março de 2012
Demian - Hermann Hesse
Emil Sinclair atormentado por falta de respostas passa a buscar a introspecção, seus pais o ensinou valores diferentes dos quais ele se depara no mundo lá fora, influenciado pelo seu amigo Max Demian, um garoto bem envolvente, ele vive as surpresas que cerca o momento de se descobrir, entre certezas e incertezas. Se rebela contra as convenções sociais, e prova da sua independência e o poder de praticar, tanto o bem como o mal. "Quem quiser nascer tem que destruir um mundo", romper com tradições impostas, e se libertar do seguro e da vida cômoda familiar, para encontrar a sua personalidade, uma busca interior que desencadeia uma rebeldia contra as influências externas.
O processo de Sinclair é um dualismo entre as aventuras externas e a doutrina do puritanismo, ele solitário, encontra refúgio, apenas em sua imaginação. Com influências de Nietzsche, Hesse faz um retrato dos conflitos psicológicos do Ser.
As figuras de Sinclair e Demian, nada mais é que o próprio Hesse, Sinclair seria sua Infância, Demian seu ideal, como gostaria de ter sido, decisivo, dono do próprio destino. É bom que se conheça a vida de Hesse, é necessário para compreensão dos elementos. Hesse glorifica o individuo consciente de si, a natureza humana, o homem.
Ler esse livro é como um despertar, como se tirassem uma venda de nossos olhos, um livro impactante que faz rever todos os conceitos em que vivemos até agora. Até que ponto somos influenciados e o quanto somos nós mesmos? Conseguimos separar ou vivemos sem saber o que é ser um individuo único, uma pessoa que age e pensa por conta própria sem influências externas?
Quando vemos a realidade, o não encaixe na sociedade, nos libertamos, porém, ficamos trancafiados em nós mesmos, resultando em solidão e frieza.
A literatura de Hermann Hesse tem o poder dos questionamentos, sobre a existência humana que passa despercebida em meio a tantas bobagens em que somos condicionados a acreditar e a viver.
"Queria apenas tentar viver aquilo que brotava espontaneamente de mim. Porque isso me era tão difícil?"
"Não creio ser um homem que saiba. Tenho sido um homem que busca, mas já agora não busco mais nas estrelas e nos livros: começo a ouvir os ensinamentos que meu sangue murmura em mim. Não é agradável a minha história, não é suave e harmonioso como as histórias inventadas; sabe a insensatez e a confusão, a loucura e sonho, como a vida de todos os homens que já não querem mais mentir a si mesmos."
terça-feira, 13 de março de 2012
Não Tenhas Medo (No Tengas Miedo)
O filme retrata um tema de uma obscura realidade infelizmente comum. Como enfrentar e seguir em frente após sofrer abuso sexual de uma pessoa próxima.
Dirigido pelo espanhol Montxo Armendáriz, é um drama que nos deixa com um nó na garganta diante dos problemas de Silvia (Michelle Jenner), uma personagem que guarda um segredo horrível sobre sua vida, de modo que fica difícil viver de forma natural.
A história começa pelo passado, ainda criança, mostrando o relacionamento que tinha com os pais, e sua amiga Maite (Núria Gago). Nessa fase Silvia começa a conviver com os abusos de seu próprio pai, que ao olhar das pessoas era um homem comum. Sua mãe (Bélen Rueda) uma egoísta, nem se dava conta do que estava acontecendo, pois nem olhava para a menina, os problemas não existiam. Em sua fase adulta, é uma mulher confusa com seus sentimentos, a passividade dela chega a irritar. Pensamos o seguinte: Porque ela não fala para alguém, denuncia ou simplesmente o chuta, mas as coisas nem sempre são simples, para uma menina que cresceu ao lado do pai que demonstrava afeto, e de repente virava um monstro, a dificuldade de fazer algo é maior.
Os sentimentos se confundem, ódio, tristeza, amor, pois seu pai foi seu primeiro amante e como lidar com isso? É uma vida destruída. Michelle Jenner como Silvia é o destaque, sua dor transparece no rosto e ninguém a percebe, ela a libera em jogos de azar, e acaba se envolvendo com um rapaz, porém o envolvimento deles é estranho. As cenas dela tocando violoncelo, e sua amiga Maite tocando piano são lindas, deveriam ter inserido mais cenas assim. Lluis Homar que interpreta o pai, é um homem frio, sem caráter e um personagem sem profundidade, a mãe é uma pessoa que vela os problemas, e se afasta quando as coisas se complicam, é angustiante. Mas todos os personagens são importantes para a construção da personalidade e do temperamento de Silvia, uma garota retraída e enclausurada em seu próprio ser, pronta para explodir a qualquer momento.
A busca para se livrar dos traumas vividos, essa é a proposta do filme. Depois de tantos danos causados a solução não é esquecer, e sim enfrentar e saber lidar, esse é o caminho. Passar uma borracha no passado e encontrar pessoas com quem possa desabafar, é uma maneira de recomeçar. Para quem não gosta de dramas intensos, se afaste deste longa.
sábado, 10 de março de 2012
Tudo Pelo Poder (The Ides Of March)
George Clooney é um candidato democrata, liberalista, pró aborto, contra a pena de morte, jovem, moderno, atualizado. Ou seja, tudo o que povoa os pesadelos do conservadorismo americano, republicano ou não. Embora pleno de qualidades, o governador Mike Morris não está livre dos pecados e desvios de conduta, presentes em todos os ramos, mas imperdoáveis no tal jogo político. Por trás de Mike Morris e de todas as articulações para torná-lo o candidato democrata à presidência americana, estão dois estrategistas, interpretados por Phillip Seymour Hoffman e Ryan Gosling. O primeiro se encarrega do molho caricatural, é a velha raposa que já viu e viveu de tudo e sabe que honra e dignidade, quando perdidas na política, não podem ser recuperadas; o segundo bem apessoado, articulado, perto dos 30 anos de idade, o produto bem acabado das universidades americanas na década de 90. As regras do jogo são muito simples, e "Tudo Pelo Poder" investiga como cada um desses jogadores atua quando tudo está prestes a desmoronar. Nada advém da bondade dos aliados. É preciso prometer cargos e vantagens, estabelecer compromissos. Em termos simples, se vender. E nunca, jamais, em tempo algum, dormir com a estagiária. O roteiro de Clooney, co-escrito por seu parceiro e produtor Grant Heslov e pelo dramaturgo Beau Willimon, examina o que exatamente leva, até mesmo o mais liberal e honrado dos políticos, a meter a mão no esgoto para se eleger. E se corromper.
O verdadeiro protagonista é Stephen Meyers (Ryan Gosling) o assessor de campanha de Morris e um de seus homens de confiança na reta final das primarias presidenciais, uma espécie de pré-eleição, que decide qual candidato do partido vai concorrer à presidência. A corrida está acirrada entre Morris e o senador Pullman (Michael Mantell), e é praticamente certo que o vencedor do estado de Ohio será ele. Para isso, Paul Zara (Philip Seymour Hoffman), outro assessor de Morris, tenta conseguir o apoio do senador Thompson (Jeffrey Wright) para que esse use sua influência a seu favor. Enquanto isso, Meyers passa a ser sondado por Tom Duffy (Paul Giamatti), assessor de Pullman, que enxerga o talento do garoto e quer fazê-lo mudar de lado. Porém o jovem está casado com a campanha, e não esconde em nenhum momento a admiração que tem por Morris, o que faz com que seu trabalho não seja uma obrigação, mas uma luta pessoal por um mundo melhor. Como um fã em frente ao seu ídolo, o carismático Ryan Gosling é bem sucedido ao dar um ar inocente e juvenil que o papel requer. Apesar de experiente, o seu Meyers não tem a vivência que seus colegas têm e não parece compreender direito como gira aquele mundo, em certo momento ele questiona uma repórter (Marisa Tomei) que está prestes a publicar uma matéria que pode prejudicá-lo "Eu pensei que nós fossemos amigos", sem entender a relação de co-dependência estabelecida entre os dois. E quando um escândalo sexual ameaça vir à tona, as máscaras começam a cair.
Curiosamente, a medida que entramos junto com o protagonista no submundo da política, o longa toma um ar muito similar aos filmes de máfia. Os assessores se tornam a família e fazem de tudo para se protegerem, enquanto os oponentes exploram cada ponto fraco dos seus inimigos. É um ótimo filme pra quem gosta de politica, e ver todos os estratagemas que as pessoas precisam fazer quando a coisa aperta, onde cada um sobrevive por si só, disfarçando que estão todos juntos até o final, depois que tudo deu certo, aí cada um age à sua maneira.
Talvez o processo politico muito particular dos Estados Unidos cause um certo distanciamento no público brasileiro, mas sem dúvidas o que prevalece nesse longa são os personagens muito bem construídos, todos, sem exceção.
terça-feira, 6 de março de 2012
Apenas Uma Vez (Once)
Gravado em Dublin em cerca de duas semanas, o filme traz uma trama de amor simplória, "essencialmente um diálogo" - como o próprio Carney definiu. Hansard vive um talentoso músico que ganha a vida com seu violão nas ruas de Dublin e ajuda o pai em uma loja de aspiradores de pó. Markéta Irglová (outra cantora e multi-instrumentista profissional a entrar no projeto) interpreta uma tcheca que anda pelas mesmas ruas, vendendo rosas para sustentar sua família, e tem como hobby tocar piano. O acaso fez com eles se encontrassem, e a paixão pela música fará com que vivam uma experiência intensa e inesquecível.
John Carney sempre pensou em um filme que, apesar de não ser um musical tradicional, que empregassem canções para contar uma história de amor. A química entre os dois personagens, que não possuem nomes na história, é muito boa e toda a trama é complementada por essas belíssimas canções que não queremos mais parar de ouvir. Carney queria achar um cenário e um cordão de história simples que pudessem utilizar canções de forma que os espectadores atuais aceitassem bem essa proposta. Dessa forma, ele pediu a Glen Hansard (vocalista da banda The Frames) para escrever algumas canções. Após meses trocando ideias, Carney e Hansard criaram dez canções. O resultado disso tudo foi um filme original, com uma história de amor realista e moderna.
Diferentemente dos musicais vindos de Hollywood, nos quais predominam músicas espalhafatosas com personagens um tanto caricatos, as melodias aqui são bem mais intimistas, verdadeiras, passando sentimentos e contando uma história bacana em figuras reais e carismáticas. Assim, além de fazer parte do filme como principal elo entre os protagonistas, principalmente no que concerne à amizade crível, que aos poucos vai desenvolvendo-se e conquistando o espectador, as letras, com sua devida carga poética, funcionam quase como um ser vivo. Por ser a ação propriamente dita, as canções ditam como aquele singelo romance envolve os personagens e, consequentemente, o público.
A vida é carregada de escolhas, onde muitas vezes a razão sobrepõe a emoção, o que pode soar óbvio em um filme clichê de comédia romântica, neste é mais realista e os fatores da vida interferem nas grandes esperanças e nos caminhos a seguir. Algumas curiosidades tornam “Apenas uma Vez” ainda mais interessante.
É uma obra independente, talvez isso tenha ajudado a ser tão desprendida dos padrões do gênero. Mais genial do que a forma como o filme é apresentado, é saber que os dois protagonistas nem são atores, na verdade eles são cantores/músicos de verdade. O diretor do filme, John Carney, também é músico, e Markéta Irglová já trabalhou junto com Hansard no álbum The Swell Season. O cineasta e o diretor de fotografia Tim Fleming apenas acompanham de perto os atores, sem excessos, sutilmente evidenciando, câmera no ombro, detalhes da crescente conexão entre os dois. Fora tudo isso ele foi indicado a 18 prêmios, tendo vencido 14 (dentre eles o Oscar).
"Apenas uma Vez" resulta não em um longa que usa a música apenas como linguagem, mas um que a emprega também como tema. E há poucas coisas que se tornam tão românticas e verdadeiras quanto este filme. Ele com seu violão delirante, ela dedilhando um lírico piano, faz com que nos inebriemos diante as apaixonantes canções.
Como descrever o elemento que faz com que você se apaixone por algo ou alguém?
segunda-feira, 5 de março de 2012
Coco Antes de Chanel (Coco Avant Chanel)
O filme como o próprio título sugere, precede os anos em que a estilista entrou no mercado da moda.
Dirigido por Anne Fontaine, traz de modo muito suave a polêmica história dessa mulher que impôs estilo e atitudes em uma época onde os homens estavam à frente.
Criada em um orfanato, cantava em bordéis com sua irmã, e trabalhava como costureira, aos poucos foi se especializando no mundo da costura, indo contra os padrões de moda que as mulheres vestiam, foi aperfeiçoando sua marca. Também nos conta sobre os relacionamentos amorosos com grandes aristocratas franceses.
O filme deixa de lado os pontos polêmicos dessa mulher à frente de seu tempo, como sua colaboração com o terceiro Reich, sua prisão e fuga após o término da segunda guerra e seu exílio na suíça. Outro ponto é as criações de Coco, os trajes simples inspirados nas roupas masculinas, a introdução da ideia do pretinho básico, sua marca que é o cabelo cortado curto, os chapéus, o conhecido perfume N° 5, deixam a desejar por não serem tão explorados.
As criações são apenas panos de fundo, suas relações amorosas são o centro da atenção, por incrível que pareça, pois ela era conhecida por não acreditar em romances. Talvez, por ter perdido seu grande amor em um acidente, escolhesse permanecer só pelo resto da vida.
Audrey Tautou com classe e elegância ficou perfeita interpretando Coco Chanel, é maravilhoso ver suas expressões mudarem conforme a história se desenvolve.
Uma história leve, sem exageros, tudo muito organizado, mostrou uma mulher que impunha suas ideias perante uma sociedade arrogante do inicio do século XX. Seria mais interessante ter mostrado os conflitos onde a imagem de mulher durona, porém elegante se definisse na cabeça de quem não conhece a história da estilista.
De forma romanceada Coco liberta as mulheres do sufocante espartilho, das plumas, penas, verdadeiras alegorias em cima de suas cabeças. O melhor é ver ela cortando gravatas, transformando camisas masculinas e vestindo-as, mas tudo isso sem afetação e sem promover uma emancipação feminina.
Audrey Tautou encarna a personagem de forma magistral, sua postura, o modo de andar e os trejeitos, como o cigarro caído no canto da boca, sua soberba e orgulho. O visual é um espetáculo a parte, é belíssimo, os ambientes sociais, cenários, figurinos, tudo muito encantador.
Um filme extremamente bonito, mas que pecou pelo excesso de adoração, quase santificando Coco Chanel, mas vale a pena entender o antes dessa mulher que mudou tanto o estilo como a atitude do mundo todo.
"Inigualável e insuperável Coco Chanel mudou a década de 20" |
"O melhor do amor é fazer amor, pena que para isso precisa-se de um homem"
sexta-feira, 2 de março de 2012
A Insustentável Leveza do Ser (The Unbearable Lightness of Being)
Na Tchecoslováquia de 1968 três personagens principais experimentam a vida e seus acasos, como pano de fundo a invasão russa, o que torna crucial o destino destas pessoas. Tomas (Daniel Day-Lewis), um jovem sedutor médico que busca apenas o prazer, alheio a qualquer envolvimento emocional. Ao encontrar Tereza (Juliette Binoche) suas convicções são colocadas em questão, por uma série de situações os dois se encontram e se envolvem, Tomas não consegue se desvencilhar da delicada Tereza como faz com as outras, diante disso ele deixa-se levar pelo peso do relacionamento amoroso, mas não consegue abandonar sua vida de aventuras sexuais, o que traz tantos questionamentos sobre a natureza do amor. Tomas tem Sabina (Lena Olin), sua amante e confidente, com ela o amor carnal se sobrepõe, justamente pela leveza que isso causa em ambos, em Sabina pela compulsão que acredita ter em trair, começar e terminar relacionamentos por conta da traição e em Tomas pela busca de algo. Há também Franz (Derek De Lint), amante de Sabina, um personagem não tão recorrente no filme e pouco explorado, tem apenas a decisão de deixar a mulher para ficar com Sabina, e quando o faz, ela o abandona.
As ideias acabam se perdendo um pouco, e não dá pra colocar toda a densidade que o livro tem para um filme. Não tem como comparar a obra de Kundera com a história que Kaufman nos traz, são distintas, apesar de ser a mesma. Há muito mais filosofia no livro, ele possui uma força de reflexão que somos capazes de ler e reler muitas vezes e sempre com mais afinco do que antes, é preciso ler para assistir, para ter a compreensão exata e mergulhar nessas camadas de vida. Sou apaixonada pelo livro, está entre os melhores que li, e gostei muito do filme, tem uma fotografia bonita e uma trilha sonora incrível, merece ter o reconhecimento de um bom trabalho feito.
Uma história sedutora envolvendo questões políticas, os personagens são bem construídos e tem uma ótima química entre eles, cada um com suas peculiaridades nos mostra em visões diferentes o aspecto de não liberdade que a época traz, tudo é colocado de maneira muito delicada. É muito difícil colocar em palavras o que principalmente o livro causa, é uma torrente de ideias e sensações. Na vida não temos uma segunda chance, não temos como voltar no passado e ver quais decisões estavam certas ou não, a vida acontece apenas uma vez e tem que ser vivida para saber, não tem como prever o que nos irá acontecer após uma escolha feita.
Tudo que se escolhe apenas pela leveza que nos causa acaba acarretando um fardo mais tarde. Há muito o que se pensar sobre essa história.
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