terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Kauwboy

"Kauwboy" (2012) dirigido pelo holandês Boudewijn Koole é daquelas histórias despretensiosas, simples, mas que ao final nos revela uma grandiosidade especial. Com muita sensibilidade e destreza o filme nos conta sobre Jojo ( Rick Lens), um garoto de 10 anos, que um dia traz um filhote de gralha para casa, mas o esconde de seu pai, que não quer animais nem plantas. Jojo pretende surpreender a mãe com o pássaro, no dia do aniversário dela. Mas seu pai prefere não comemorar a data, haja vista ela não ser muito presente em suas vidas. Jojo tem muito tato ao lidar com o pai, devido às suas violentas mudanças de humor, fazendo de tudo para que se aproximem.
Jojo é um garoto sozinho, esperto que sabe lidar muito bem com sua vida pacata numa cidade do interior, e seu pai que alterna de humor frequentemente. Sua preocupação inicialmente é apenas com os treinos de pólo aquático, mas no decorrer percebemos algo mais profundo, o que explica muito sobre sua personalidade. A mãe é uma cantora de música country, que segundo ele está em turnê (descobrimos seu paradeiro apenas no final), e constantemente o vemos falar pelo telefone dizendo a ela que está tudo bem. Jojo adquire uma maturidade precoce por cuidar de si ainda tão pequeno, mas isso não elimina a inocência do universo pré-adolescente, que consiste numa fase repleta de descobertas.
Em um dia retornando para sua casa encontra um filhote de gralha, tenta devolvê-lo a mãe em cima da árvore, mas não adianta. Ele a leva para casa mesmo sabendo que seu pai não admite animais. Jojo se torna uma espécie de mãe para a gralha, a alimenta frequentemente, a protege e dá carinho. Essa relação é imensamente interessante, a ave realmente se torna uma personagem, é curioso como ela presta atenção no garoto, numa das cenas a gralha se interessa pela música tocada no rádio, que inclusive é da mãe de Jojo. Participamos da evolução da ave, as cenas em que ela voa livremente são emocionantes. Nesse caminho ele divide seu segredo com uma menina que vive mascando um chiclete azul, essa relação aos poucos revela o mágico primeiro amor e através deste a transformação.
Na fase em que ele se encontra com a menina são mostradas cenas tranquilas, das quais a evolução vem por si só, sentimentos crescem de acordo com o tempo. Visualizamos passeios em meio a lugares fantásticos, momentos em que apenas estão um do lado do outro. E a gralha também aparece dando voos que simbolizam uma liberdade encantadora. A fotografia é um esplendor, assim como a trilha sonora.

Geralmente a mudança acontece quando algo ruim se aproxima, ou lidamos de frente, ou escondemos fingindo que nada mudou. Para Jojo a transformação veio por meio da gralha, que após ser descoberta pelo pai, a liberta. Não é fácil para uma criança lidar com certos aspectos da vida, elas têm uma visão muito particular, e quando não há suporte de um adulto, no caso o pai de Jojo também não estava preparado para tal situação, acabou se afastando e deixando o menino à mercê de suas próprias emoções e conclusões.
A gralha é uma metáfora belíssima para entender tudo o que lhe aconteceu, e isso se dá de forma natural, assim como na vida real. As coisas ruins geralmente acontecem bruscamente, não esperamos por elas. Jojo toma consciência sobre sua mãe e se liberta de um sentimento que não apenas fazia mal para ele, mas também para seu pai. Ao final quando eles se abraçam é um sinal de que uma relação nova pode surgir, pois ali nunca faltou amor, mas devido as circunstâncias fez com que se afastassem.

A última cena é a evidente aceitação de Jojo, quando mostra a sua amiga o acender e o apagar do fósforo que seu pai lhe ensinou. Uma bela metáfora de vida e morte.
Uma coisa também que o filme traz é que quando adultos perdemos a visão de vida que tínhamos na infância, amadurecer não significa castrar a beleza das sutilezas, afinal são elas que dão sentido a tudo isso que nos rodeia.
"Kauwboy" ganhou diversos prêmios e está entre os filmes mais lindos de 2012, e não é à toa, pois combina elementos simples que envolvem e emocionam.

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