segunda-feira, 21 de abril de 2014
Ventre (Womb)
"Ventre" (2010) do diretor húngaro Benedek Fliegauf (Apenas o Vento - 2012) é um filme desconhecido que retrata um assunto polêmico, incômodo, e que assusta a maioria das pessoas.
A história segue Rebecca (Eva Green) que ao passar algumas semanas na casa de seu avô, num lugar estonteantemente lindo, se apaixona por Thomas (Matt Smith). As duas crianças parecem se encontrar uma na outra, entre brincadeiras e olhares criam um forte laço, mas Rebecca precisa ir embora, ela e sua mãe vão morar em Tóquio. Doze anos se passam, então ela retorna ao lugar em busca de Thomas, o reencontro é estranho e silencioso. Atualmente Rebecca trabalha com software e Thomas é um ativista ambiental, bem maluquinho, cheio de ideias e sonhador. Matt Smith caiu como uma luva para o seu personagem, assim como Eva Green para o seu, que já pende para um lado misterioso, quieto, mas que expressa pelo olhar sentimentos intensos e inquietantes. Nada acontece entre eles, apenas conversas, Thomas concorda em levar Rebecca a uma manifestação da qual ele é um dos líderes, porém na viagem ocorre um acidente indiretamente provocado por Rebecca, e ele morre.
Isso tudo pode parecer um spoiler imenso, mas é só o começo. Rebecca consumida pelo amor, pela culpa e por todos os fatores que permearam a sua relação com Thomas, tem a ideia de fazer uma fertilização a partir do DNA do seu amado, gerando um clone. Para isso ela precisa da autorização dos pais dele, a mãe é irredutível, já o pai é simpatizante. O fato é que ela faz essa fertilização e nove meses depois nasce o bebê, seu filho. É supostamente assim que deveria ser segundo a ética, a moral, e a religião. Mas para Rebecca...
O filme não discute sobre a clonagem, algumas coisas são jogadas, como as crianças da escola que têm preconceito de uma menina que é clone da mãe de sua mãe, mas não é explorado, apenas fatos são expostos, pois é um assunto delicado e tabu na sociedade. Thomas não sabe que é um clone, sua mãe conta sobre o acidente, sobre seu pai, mas nada além disso.
Já com doze anos, a situação vai ficando tensa e indecifrável. A relação mãe/filho começa a ser questionada por nós espectadores, brincadeiras, um banho, há algo embutido em Thomas, um sentimento por sua mãe que nem ele mesmo entende, e Rebecca demonstra em seu olhar, que o deseja. No início do filme, quando pequena ela tinha o hábito de olhar Thomas dormindo, passava os olhos pelo seu corpo, isso se repete quando ela olha seu filho na banheira, enquanto o garoto declama uma poesia.
O filme é muito complexo por não ser tão explícito em diálogos, ou se focar em algo fortemente, portanto pode se tornar chato e confuso, mas é preciso assisti-lo com atenção para ler nas entrelinhas os desejos de Rebecca, que desde o início demonstra sua obsessiva paixão por Thomas. Ela queria uma segunda chance, já que seu amor não foi consumado, o destino, ou seja lá o quê não deixou que acontecesse, e a medicina estando tão avançada em relação a clonagem, não pensou duas vezes em brincar de "Deus", e desse modo poder reviver algo tão latente quanto era o seu amor por Thomas.
O problema é quando Thomas se torna homem e começa a namorar, a situação vai ficando tensa ao extremo. Os olhares de Rebecca se tornam muito estranhos. Vale ressaltar que ela se isola com o filho ainda pequeno. O lugar é dominado pelo vento e a solidão. O intuito é ser apenas ela e ele no mundo.
A fotografia é outro ponto importante, toda trabalhada em tons de azul, ela entra completamente em harmonia com o roteiro e o ritmo da narrativa. Dá um clima de incertezas e cria uma agonia em quem o assiste. A única ressalva é que a personagem não envelhece na história, passam-se os anos e continua a mesma.
Thomas vai percebendo algo diferente na relação, pois nunca existiu sentimentos maternos ali, por exemplo, quando chega perto de Rebecca sente que ela fica estremecida, e ele também sente desejos, a confusão o toma já que não sabe que é uma cópia. Um dos momentos mais polêmicos é quando acontece o que Rebecca sempre quis, acredito que a maioria que o assiste se perde e não consegue analisar que quando eles se unem, se amam, ela perde a virgindade. Por fim, Thomas vai embora, afinal lidar com tais circunstâncias seria enlouquecedor.
Apesar de toda a loucura envolvida em relação ao amor que Rebecca sente, o filme nos propõe a pensar até que ponto existe o parentesco, gerar uma criança não significa ser mãe desta. É isso que está em pauta. Ela não se sentia mãe dele, apenas emprestou seu ventre para saciar seus desejos. E, então o que aconteceu entre eles pode ser considerado incesto? Também coloca em xeque o sentimento amor, que no caso dela era puro egoísmo.
É aflitivo, angustiante, incômodo, é filme para quem gosta de um cinema mais diferenciado, assista de mente aberta e se inebrie com uma fotografia arrebatadora.
"Acabou. Eu sempre vou falar com você. Não importa se você não diga nada. O fato de você já ter ido não significa que não esteja aqui."
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