terça-feira, 8 de abril de 2014

Boneca Inflável (Kûki Ningyô)

"Boneca Inflável" (2009) dirigido por Hirokazu Koreeda (O Que Eu Mais Desejo - 2011) é baseado no mangá homônimo de Yoshiie Goda. A história é sobre Nozomi (Donna Bae), uma boneca inflável comum comprada por um homem solitário para substituir o lugar de seu antigo amor. A narrativa é interessante e original. Acompanhamos os passos de Hideo (Itsuji Tao), seu cotidiano banal e sem graça que se resume a trabalhar e chegar em casa para saciar seus desejos com a boneca interpretada de forma muito doce pela atriz Donna Bae.
Hideo, na verdade se sente só e busca mais do que satisfazer seus impulsos sexuais, ele trata Nozomi como se fosse real, lhe dá banho, penteia seus cabelos, compra roupas e conversa sobre como foi seu dia no trabalho. Um dia, acontece o inesperado e a boneca ganha consciência e um coração, deslumbrada com tudo ao redor decide sair e explorar, dessa maneira percebe que a maioria dos seres humanos são sozinhos e vazios. Nozomi é ingênua e para ela tudo tem brilho, primeiro descobre a fala, depois o significado das coisas, cai nas aflições humanas, e por fim o amor. Muitos podem achar a história maluca, a premissa passa essa ideia, porém conforme o filme se desenrola percebemos metáforas profundas sobre a maneira que vivemos e nos comportamos na sociedade.
Nozomi consegue um emprego em uma videolocadora e consequentemente se apaixona pelo atendente Junichi, em meio a esse universo dos filmes, que não deixa de ser uma homenagem à sétima arte, Nozomi percebe o vazio que habita nas pessoas, e então acha que existem outros como ela. A insatisfação, a solidão e a rapidez com que tudo flui é o principal agravante para a vida se tornar triste, já não há tempo ou paciência para olhar ao lado e quem sabe encontrar um alguém interessante, cada um existe e se isola em seu próprio mundinho. A maior desculpa hoje em dia é o "não tenho tempo", mas não se permita acreditar neste pensamento, quando o interesse existe, há sempre tempo.
O filme tem uma beleza peculiar e o que o ajuda é a maravilhosa interpretação de Donna Bae, sua transformação acontece como num conto de fadas, seus olhos diante ao mundo sempre estão arregalados e curiosos. Os efeitos especiais são simples e naturais, basicamente são jogos de câmera e maquiagem. É bom se apegar aos detalhes e nos diálogos que Nozomi estabelece com outros personagens, eles vão crescendo aos poucos e ganhando forma.

Nozomi ao final das contas se torna mais humana do que a maioria das pessoas, e inclusive percebe que ter um coração não é nada fácil. Numa das cenas ela encontra o lugar de onde veio e conversa com seu criador. Uma outra cena lindíssima é quando se encontra com um idoso solitário que passa todos os dias sentado no banco do parque. A conversa entre eles é magnífica e chega a ser filosófica. O velho diz: "Diga, conhece um inseto chamado efêmera? A efêmera morre um ou dois dias após dar à luz. Seu corpo é vazio. Ao invés de estômago ou intestino é apenas preenchido por ovos. É uma criatura que nasce apenas visando a procriação. Humanos não são muito diferentes."
Nozomi entende que pode haver outros como ela, bonecas que se transformaram, diariamente vê uma trabalhadora com uma meia que se assemelha a "cicatriz" que tampa todos os dias, e até lhe dá a maquiagem que usa, a mulher acha que esse gesto é por causa de sua aparência, pois está obcecada com a possível demissão no trabalho por uma moça mais nova.
Essa interação com outros personagens dá abertura para vários questionamentos, como solidão, individualismo, compulsão, e valores que se tornaram verdades absolutas e que as pessoas incansavelmente buscam, o padrão de beleza, por exemplo, ou o ato de consumir sem necessidade.

"Boneca Inflável" é um ótimo filme, traz uma importante mensagem de forma lírica e fantasiosa, é triste e doce ao mesmo tempo. As cenas iniciais principalmente tem uma aura de inocência, Nozomi ao se transformar e sentir a vontade de sair, começa a imitar os gestos das pessoas, como andar sempre apressada. Ela observa e absorve um pouco de cada um, aprende e se insere nos moldes da sociedade. Tudo isso para descobrir que todos assim como ela, são esvaziados. O sentido de humanidade está perdendo-se, uma vez que os vínculos estão se tornando mais frouxos e efêmeros.
É filme para se pensar nos valores que ditam as regras da sociedade, valores que só servem para nos deixar insatisfeitos e solitários. De vez em quando é preciso se inflar de vida para que as possibilidades apareçam e enxerguemos as belezas cotidianas.

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