terça-feira, 23 de abril de 2013

Arca Russa (Russkiy Kovcheg)

"Arca Russa" (2002) é um filme magnífico, de uma beleza inqualificável, mas para entendê-lo é necessário saber um pouco da história da Rússia, ou pelo menos conhecer alguns personagens históricos, pois o filme no seu desenrolar passeia entre eles. Sem dúvidas "Arca Russa" é um marco do cinema, filmado em um único plano-sequência, sem cortes, que dura 97 minutos e atravessa 35 salas do museu, transformando a tela do cinema em um quadro vivo por onde desfilam personagens importantes da história da Rússia: Pedro, o Grande; Catarina, a Grande; Catarina II; Nicolau e Alexandra. O museu é como um ser vivo, uma entidade que respira e tem personalidade própria. Sokurov empresta alma ao colossal palacete do Hermitage, em São Petersburgo, um dos maiores museus do mundo. Simbiose perfeita de cinema, História e artes plásticas, "Arca Russa" é uma experiência visual única e inesquecível.
O cineasta Aleksandr Sokurov (Moloch - 1999, Taurus - 2001 e Solntse - 2005) é um dos diretores mais cultuados e sua "Arca Russa" é um filme erudito, para os mais desentendidos passará batido e até sem sentido, é uma viagem esplendorosa na história da Rússia dentro de um magnânimo museu. O Hermitage é o ex-palácio dos czares, onde os quadros e três décadas da história da Rússia convivem em melancólica harmonia. O todo é envolvido pela questão sobre a identidade russa. Seria um país oriental, eslavo, ou um país europeu?
Perfeccionista, o diretor exigiu que nenhum ruído fosse feito durante a gravação. Marcou as posições dos atores com o rigor de um coreógrafo de balé. Distorções sonorafs e visuais foram corrigidas por computador depois da filmagem e o material captado em vídeo foi transposto para película. A opção de um filme sem cortes é para manter um fluxo contínuo que permite a interação entre tempos distintos. São mais de 300 anos de Rússia sintetizados no Hermitage.

Há dois narradores, um é invisível e russo. O outro visível é europeu. Ambos andam diante dos quadros como se fossem fantasmas. O primeiro narrador, cuja única referência é a sua voz, parece defender a originalidade dos feitos russos, sempre contestando as afirmações do segundo narrador, este que tenta encontrar respostas sobre a sua própria história e o motivo para estarem no museu. Como não sou expert sobre a Rússia fiquei cansada em algumas partes, mas o filme é bem movimentado por personagens, então a monotonia é quebrada logo. Glorificar o filme apenas pelo fator plano-sequência e seu apuro técnico é errado, claro que é uma ousadia imensa e um trabalho otimamente executado, porém há diversas coisas que podem ser visualizadas além disso. Sokurov faz de sua "Arca Russa" um clássico que será lembrado eternamente.

Uma das cenas mais expressivas é a do baile, a nostalgia realmente acontece e a insegurança do futuro são reproduzidas. A identidade daquele país é repleto de dúvidas e ao final do longa vemos o horizonte sombrio, onde o filme volta para um futuro sem grandes expectativas, os fantasmas do palácio desaparecem e tudo silencia-se.
É um filme intelectual, com todos os aspectos políticos da Rússia. Impecável, pomposo e elegante. Para alguns soa pretensioso e soberbo, já para outros um deleite visual e uma obra única e refinada. "Arca Russa" é um filme audacioso e que só poderia ter saído da mente de Sokurov.

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