terça-feira, 12 de junho de 2018
A Infância de Um Líder (The Childhood of a Leader)
"A Infância de Um Líder" (2015) dirigido pelo ator Brady Corbet (Mistérios da Carne - 2004) é um drama sombrio que como o próprio título revela retrata a infância de uma criança que se tornará um líder fascista, é uma história interessante e que traz o terror sob uma perspectiva realmente surpreendente, aparentemente não há nada que se encaixe no gênero, porém o horror é trabalhado em pequenas doses e com total originalidade, até porque acompanhar o pequeno protagonista e seu difícil desenvolvimento durante o período final da primeira guerra é perturbador, sua personalidade vai sendo moldada a partir de eventos complexos e uma estranha relação com os pais.
1918. Prescott (Tom Sweet), um garoto americano passa a morar na França, já que seu pai (Liam Cunningham) é convidado pelo governo americano para trabalhar na criação do Tratado de Versalhes. Juntamente com a mãe (Bérénice Bejo) se instalam num imenso casarão em um lugarejo onde o fanatismo religioso impera. A abertura estonteante e ao mesmo tempo aterradora faz questão de evidenciar e nos fazer imergir neste cenário. A imagem e o som se complementam de maneira assustadora durante toda a história chegando ao ápice de modo ameaçador e vertiginoso. Acompanhamos os personagens com ansiedade e observamos tudo pelo olhar da criança que se molda a partir do desafeto da mãe, da autoridade exacerbada do pai, do fanatismo religioso, da infelicidade, opressão e as incertezas que pairam no ar.
As sensações que a história provoca são incômodas e a cada cena nos deslumbramos com o requinte visual e narrativo, seu desenvolvimento faz questão de expor com cuidado cada detalhe, a movimentação de câmera suave e a lentidão inicial só faz ficar ainda mais interessante, pois a tensão vem de forma crescente a partir do momento em que a criança se torna incontrolável, a mãe coloca a educação nas mãos da jovem professora de francês e o pouco de singeleza advém da cozinheira, já o restante é pura opressão e desamor, o ambiente contribui para a melancolia e vazio, as obrigações religiosas e o pai que administra com mãos de ferro a família, assim como faz em seu trabalho complementa arruinando a personalidade de Prescott. Impressionante a composição de personagem de Tom Sweet, seus olhares e comportamentos vão nos levando ao que se tornaria no futuro, diante de tudo que estava vivendo e dentro do contexto histórico não poderia dar em outra coisa: a empatia com ideias fascistas.
A atmosfera do filme atinge em cheio e exemplifica que o terror é um gênero que pode ser trabalhado sob variadas vertentes, os elementos transmitem uma espécie de mau agouro, tempos ruins que se aproximam, a sensação de sufoco vai ficando cada vez mais forte e o real terror acontece num final apoteótico.
A narrativa é dividida em capítulos que demonstram Prescott cometendo travessuras e fazendo birras, no início ele joga pedras nos outros depois do ensaio de uma peça na igreja, a mãe o força a pedir desculpas para todos e isso o faz ficar mais revoltado, o menino tem personalidade forte e uma de suas características físicas, o cabelo comprido, é alvo de perguntas e chacotas e sempre é confundido por menina, o que o deixa realmente nervoso. O relacionamento com a mãe é difícil e distante, não há afeto e há algo não esclarecido ali no ambiente familiar, pois ela é uma mulher frustrada e fria, muito do menino é com certeza vindo dela e do tratamento que destina a ele, já o pai se torna violento por não saber mais lidar e tudo culmina num rompante de raiva num jantar na casa deles em que estão comemorando o encerramento da Primeira Guerra.
"A Infância de Um Líder" inspirado vagamente num conto homônimo de Sartre retrata com primor a ascensão de um líder fascista, mas contudo não explora as questões políticas, mas sim as psicológicas, do como os traços inatos da personalidade somado a acontecimentos conturbados são capazes de formarem monstros; o vazio e o mal se solidificando remete ao filme "A Fita de Branca" (2009) que também carrega um tom de pesadelo progressivo. É um filme sombrio, instigante e singular que tem na sua ambientação e na sua trilha sonora uma força descomunal. Poderoso!
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A comparação com o ótimo "A Fita Branca" me deixou curioso.
ResponderExcluirMais um filme que eu não conhecia.
Abraço