quinta-feira, 19 de junho de 2014

A Porta (Die Tür)

"A Porta" (2009) de Anno Saul é um filme que traz o tema viagem no tempo, este ao contrário dos hollywoodianos que têm a mesma premissa, pontua bem o drama do personagem Mads Mikkelsen, que está em evidência graças a seu ótimo trabalho na série "Hannibal" e também no filme "A Caça". Não dá para negar que Mads Mikkelsen carrega o filme nas costas, pois o roteiro lá pelo final dá uma bela caída, transformando no que era pra ser uma proposta séria em algo exagerado.
A história é sobre um bem-sucedido pintor, David, que perdeu o controle de sua vida após ter sido, através de uma decisão fatal, o responsável pela morte de sua filha de 7 anos. Depois de cinco anos, ele descobre uma porta que lhe dará a oportunidade de começar tudo novamente. Entretanto, o que inicialmente aparenta ser uma ótima chance para um novo início, logo se revela um verdadeiro cenário de horror, pois nem tudo no passado é realmente o que parece.
Após perder sua filha por puro descuido, ele enfrenta o inferno em vida, não consegue seguir em frente por causa da culpa que carrega e da qual jamais conseguirá se livrar. Prestes a tentar o suicídio, David descobre uma porta que lhe dará a chance de recomeçar. Ao transpassá-la volta cinco anos atrás e vê que pode contornar o passado, desse modo consegue salvar sua filha do acidente, mas esta é uma realidade paralela, portanto, terá de lidar com seu eu de cinco anos atrás. Em um encontro com seu duplo acaba o matando, e daí passa a viver aquela realidade. O que David não sabe é que existem outros que também encontraram a porta.
Adaptado da novela de Akif Pirinçci, "A Porta" claramente lembra o filme "Efeito Borboleta", o longa consegue manter a tensão no espectador e produzir a sensação de que se pode consertar o passado, o alívio em voltar e poder resolver as coisas com mais maturidade. No que mais tarde vemos que isso é pura ilusão e completamente destrutivo. Para tudo existe uma consequência, para cada ato, cada decisão, não há perfeição em ser, tudo é um aprendizado para o amadurecimento. Assim é a vida. O filme caminha por essa linha, pontuando o drama do personagem em perder a filha e a oportunidade em consertar e vivenciar o passado com a maturidade adquirida por aquela tragédia.

É inevitável, o tema seduz o espectador, o desenrolar nos faz pensar e refletir sobre como reagiríamos se nos fosse dada tal oportunidade. Mas infelizmente o desfecho do filme deu uma exagerada em reviravoltas, existem cenas que seriam desnecessárias. A força com que o filme começou se desfez e a resolução final foi abrupta. A indicação é pelo fato de que mesmo com alguns furos, ele foge dos parâmetros que conhecemos, a fantasia é um complemento para um assunto existencial.
A questão é que nos preocupamos muito com o que fizemos e o como fomos, não nos importamos em ser. Parece que o presente é sempre difícil e constantemente precisamos fugir e lembrar do passado com a ideia de que se tivéssemos reagido de tal forma, o agora seria diferente. Mas lembre-se, vive-se uma vez só e o que foi feito está feito. Não existe nenhum portal, a não ser o da nossa consciência. Parafraseando Milan Kundera sobre o mito do eterno retorno no livro "A Insustentável Leveza do Ser". "Nós só podemos viver uma só vez, e sem repetições, portanto, nunca poderemos comparar uma situação com outra."

Mads Mikkelsen é um ator muito versátil, a cada filme que assisto com ele percebo o quão talentoso é. Deixo como dica alguns filmes: "Depois do Casamento", "Praga", "Coco Chanel & Stravinsky", "O Guerreiro Silencioso", "O Amante da Rainha", entre outros. Deem uma olhada em sua filmografia.
"A Porta" é o tipo de filme que dá vontade de sentar e ficar conversando sobre as possibilidades que ele abrange, abre-se um leque de ideias. Por essas e outras questões vale a pena assisti-lo.

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