segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013
Motores Sagrados (Holy Motors)
"Holy Motors" (2012) é um filme inicialmente confuso, mas para olhos atentos ele contém críticas, pensamentos e uma porção de simbolismos. Após 13 anos sem dirigir um longa-metragem, o francês Leos Carax retorna às telas com um filme feito especialmente para quem não quer se acostumar com o mais do mesmo, para aqueles que buscam um cinema diferenciado e recheado de "porquês". O título na tradução literal é "Motores Sagrados" e reverencia o cinema por aquilo que faz dele uma arte: a reprodução mecânica do movimento da vida.
A trama não segue padrões de começo, meio e fim, mas propõe uma sucessão de histórias que tem como fio condutor o incrível ator Denis Lavant. Numa limusine que circula por Paris, o milionário Monsieur Oscar troca de roupas, de disfarces, tornando-se ora uma velha mendiga, ora um assassino brutal, ora um amante nostálgico, ora um pai melancólico. As imagens dão o tom de mistério, nos instiga a saber sobre aquele homem que troca de roupa e de rosto toda vez que entra em sua limusine. O filme inicia com o próprio diretor Leos Carax. Ele caminha por um quarto com um papel de parede de uma floresta, ao fundo ouvem-se animais e pássaros. Na cena seguinte, somos levados a uma sala de cinema onde os espectadores dormem enquanto assistem a uma projeção na tela. Isso tudo representa a banalização do cinema, somos conduzidos a ver sempre o mesmo, um show de efeitos especiais que não querem dizer absolutamente nada. Já as produções que querem dizer algo, geralmente levam a maioria ao mais profundo sono, é como se o artista não precisasse mais ter o dom, mas sim uma bela imagem artificial que chame o público. Parece que a arte de fazer surpreender não existe mais, o deslumbrar-se diante a uma imagem. E é isso que "Holy Motors" simbolicamente critica. Mas a minha visão preferida do filme é a de que usamos máscaras no nosso dia a dia para nos relacionar com diferentes pessoas, pois não falamos e não agimos da mesma forma com todos. Para cada um existe uma máscara, um código, e no fim nem sabemos mais quem somos na essência. Oscar se despe de si mesmo para interpretar, somos levados a diversos lugares, onde ele representa seus papéis para conseguir cumprir suas missões. A bordo da limusine podemos ver ele como realmente é, em seus intervalos conversando com sua motorista vemos que ela também consegue ser ela mesma, onde expõe suas lembranças e ideias, pois no final ela coloca uma máscara ao sair da limusine, para o mundo ela se fecha e esconde-se, já a bordo ela é quem é.
Em uma dessas missões Sr. Oscar representa um tipo esquisito que come flores e passeia pelos esgotos da cidade, (sim, vemos Paris completamente diferente), ele acaba saindo em um cemitério, onde está havendo um ensaio fotográfico, lá a modelo apenas posa, sem nenhuma expressão facial, de repente ele a sequestra e a leva para um lugar onde desconstrói sua beleza e come dinheiro. Uma crítica clara a esse mercado que mecaniza as pessoas e as tornam fúteis, a ostentação por dinheiro e o fingimento de que não existe mais nada além daquilo. Ali naquele submundo a criatura estranha equipara-se a modelo, quando destrói a imagem dela criada pela beleza estereotipada. Sem dúvidas essa é uma das melhores cenas.
O filme nos dá aquele chacoalho, pois não podemos nos acomodar, nos acostumar com que nos é dado em demasia, e isso reflete tanto ao cinema com os filmes que são jogados aos montes, e a nossa própria vida. Quanto de nós realmente é nosso? Será que estamos sendo honestos conosco? O pior é viver a vida inteira trocando de máscaras para sermos aceitos, deixamos-nos ser conduzidos pelos outros, sem nem ao menos nos perguntar aonde estamos indo na verdade.
"Holy Motors" causa diversas impressões, é um filme completamente abrangente e cada vez que se pensa nele as possibilidades aumentam. É genialidade na melhor forma. A estética inova em cada cena, uma das mais lindas é um tipo de balé, onde duas pessoas cobertas por luzinhas no mais completo breu interagem numa espécie de êxtase, num sexo virtual. Kyle Minogue faz uma ponta no filme e canta melancolicamente, numa das cenas que o protagonista faz ele mesmo. Pode ser interpretado como surreal, mas é impossível ficar indiferente, é preciso assisti-lo diversas vezes para captar toda sua abrangência. Difícil falar deste longa, mas é super recomendado e uma experiência única a se levar para vida toda.
"Holy Motors" passeia por vários caminhos e nos instiga, ele vai muito além do gostar ou não. Está além de adjetivos que o qualifiquem, ou rótulos como pseudo-cult, pretensioso e afins, está a frente disso tudo. E não demora muito para perceber o quão amplo pode ser, basta ter a mente aberta e absorvê-lo, tirar a venda dos olhos, desconstruir nosso olhar perante o cinema e buscar a essência do deslumbramento, e os questionamentos diante a vida.
Somos repletos de clichês e os utilizamos a nosso próprio benefício. A sociedade robotizada é explicitada de tal forma que há uma cena em que ele simula uma volta ao lar e abraça macacos, como se dissesse que precisamos voltar ao primitivo, que falta humanidade, e a beleza dos atos já não funcionam mais. Há também a visão de que os atores podem viver a vida que quiserem dentro do cinema, é uma das inúmeras possibilidades que o filme aborda, mas se apegar a uma é se fechar para tantas outras. "Holy Motors" pode ser considerado um dos melhores filmes da atualidade. Livre-se de preconceitos, rótulos, clichês, todas as predefinições e mergulhe de cabeça nesta obra tão singular e abrangente.
A trama não segue padrões de começo, meio e fim, mas propõe uma sucessão de histórias que tem como fio condutor o incrível ator Denis Lavant. Numa limusine que circula por Paris, o milionário Monsieur Oscar troca de roupas, de disfarces, tornando-se ora uma velha mendiga, ora um assassino brutal, ora um amante nostálgico, ora um pai melancólico. As imagens dão o tom de mistério, nos instiga a saber sobre aquele homem que troca de roupa e de rosto toda vez que entra em sua limusine. O filme inicia com o próprio diretor Leos Carax. Ele caminha por um quarto com um papel de parede de uma floresta, ao fundo ouvem-se animais e pássaros. Na cena seguinte, somos levados a uma sala de cinema onde os espectadores dormem enquanto assistem a uma projeção na tela. Isso tudo representa a banalização do cinema, somos conduzidos a ver sempre o mesmo, um show de efeitos especiais que não querem dizer absolutamente nada. Já as produções que querem dizer algo, geralmente levam a maioria ao mais profundo sono, é como se o artista não precisasse mais ter o dom, mas sim uma bela imagem artificial que chame o público. Parece que a arte de fazer surpreender não existe mais, o deslumbrar-se diante a uma imagem. E é isso que "Holy Motors" simbolicamente critica. Mas a minha visão preferida do filme é a de que usamos máscaras no nosso dia a dia para nos relacionar com diferentes pessoas, pois não falamos e não agimos da mesma forma com todos. Para cada um existe uma máscara, um código, e no fim nem sabemos mais quem somos na essência. Oscar se despe de si mesmo para interpretar, somos levados a diversos lugares, onde ele representa seus papéis para conseguir cumprir suas missões. A bordo da limusine podemos ver ele como realmente é, em seus intervalos conversando com sua motorista vemos que ela também consegue ser ela mesma, onde expõe suas lembranças e ideias, pois no final ela coloca uma máscara ao sair da limusine, para o mundo ela se fecha e esconde-se, já a bordo ela é quem é.
Em uma dessas missões Sr. Oscar representa um tipo esquisito que come flores e passeia pelos esgotos da cidade, (sim, vemos Paris completamente diferente), ele acaba saindo em um cemitério, onde está havendo um ensaio fotográfico, lá a modelo apenas posa, sem nenhuma expressão facial, de repente ele a sequestra e a leva para um lugar onde desconstrói sua beleza e come dinheiro. Uma crítica clara a esse mercado que mecaniza as pessoas e as tornam fúteis, a ostentação por dinheiro e o fingimento de que não existe mais nada além daquilo. Ali naquele submundo a criatura estranha equipara-se a modelo, quando destrói a imagem dela criada pela beleza estereotipada. Sem dúvidas essa é uma das melhores cenas.
O filme nos dá aquele chacoalho, pois não podemos nos acomodar, nos acostumar com que nos é dado em demasia, e isso reflete tanto ao cinema com os filmes que são jogados aos montes, e a nossa própria vida. Quanto de nós realmente é nosso? Será que estamos sendo honestos conosco? O pior é viver a vida inteira trocando de máscaras para sermos aceitos, deixamos-nos ser conduzidos pelos outros, sem nem ao menos nos perguntar aonde estamos indo na verdade.
"Holy Motors" causa diversas impressões, é um filme completamente abrangente e cada vez que se pensa nele as possibilidades aumentam. É genialidade na melhor forma. A estética inova em cada cena, uma das mais lindas é um tipo de balé, onde duas pessoas cobertas por luzinhas no mais completo breu interagem numa espécie de êxtase, num sexo virtual. Kyle Minogue faz uma ponta no filme e canta melancolicamente, numa das cenas que o protagonista faz ele mesmo. Pode ser interpretado como surreal, mas é impossível ficar indiferente, é preciso assisti-lo diversas vezes para captar toda sua abrangência. Difícil falar deste longa, mas é super recomendado e uma experiência única a se levar para vida toda.
"Holy Motors" passeia por vários caminhos e nos instiga, ele vai muito além do gostar ou não. Está além de adjetivos que o qualifiquem, ou rótulos como pseudo-cult, pretensioso e afins, está a frente disso tudo. E não demora muito para perceber o quão amplo pode ser, basta ter a mente aberta e absorvê-lo, tirar a venda dos olhos, desconstruir nosso olhar perante o cinema e buscar a essência do deslumbramento, e os questionamentos diante a vida.
Somos repletos de clichês e os utilizamos a nosso próprio benefício. A sociedade robotizada é explicitada de tal forma que há uma cena em que ele simula uma volta ao lar e abraça macacos, como se dissesse que precisamos voltar ao primitivo, que falta humanidade, e a beleza dos atos já não funcionam mais. Há também a visão de que os atores podem viver a vida que quiserem dentro do cinema, é uma das inúmeras possibilidades que o filme aborda, mas se apegar a uma é se fechar para tantas outras. "Holy Motors" pode ser considerado um dos melhores filmes da atualidade. Livre-se de preconceitos, rótulos, clichês, todas as predefinições e mergulhe de cabeça nesta obra tão singular e abrangente.
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