"Café com Canela" (2017) dirigido por Ary Rosa e Glenda Nicácio (Ilha - 2018) é uma preciosidade do cinema nacional, um filme que acalanta e que desperta sentimentos bons, há choro e sorrisos, dilemas, dores e muito amor, disserta sobre a perda, a empatia, o cotidiano e encontros afetuosos regados a boas xícaras de café.
Margarida (Valdinéia Soriano) vive em São Félix, isolada pela dor da perda do filho. Violeta (Aline Brunne) segue a vida em Cachoeira, entre adversidades do dia a dia e traumas do passado. Quando Violeta reencontra Margarida inicia-se um processo de transformação, marcado por visitas, faxinas e cafés com canela, capazes de despertar novos amigos e antigos amores.
É puramente o cotidiano comum que acompanhamos, a vida de pessoas que se encontram e se reencontram, mas o filme possui linguagens interessantes, dinâmicas e até inusitadas, além de fazer com que o espectador se sinta parte da obra. A história se passa em Salvador e é protagonizado por duas mulheres negras de diferentes gerações, vemos em duas linhas temporais um churrasco entre amigos e uma festa de aniversário infantil simulando uma gravação de fita VHS, nos introduz dessa maneira no presente em que Margarida devastada pela morte do filho se vê inerte diante a vida, sua rotina é totalmente baseada na tristeza desde o momento em que acorda ao momento em que se deita para dormir, vive a tomar cafés requentados e mal se alimenta, sofre de surtos psicológicos e não consegue de forma alguma superar a morte do pequeno. Já Violeta é uma jovem vivaz que possui sua família e se divide em diversas tarefas, vende coxinhas, cuida de sua avó, vai de lá para cá sempre com um sorriso no rosto cumprimentando as pessoas e se mantendo firme quando surgem adversidades, sua generosidade é genuína e encantadora, quando reencontra Margarida, que foi sua professora e da qual teve uma importância imensa na construção de sua identidade, resolve que não irá deixá-la se afundar e persiste nos encontros mesmo sendo expulsa da casa, segue todos os dias enviando uma rosa vermelha e também a conquista pelo seu delicioso café com canela. Outro personagem que lida com a dor do luto é Ivan (Babu Santana), que se vê sozinho e perdido quando perde seu marido. Cada um tem seu desenvolvimento próprio e lida com suas dores de maneira própria, mas em determinado momento se entrelaçam transformando seus mundos interiores e assim fazendo do mundo exterior um lugar mais afetuoso.
É um filme primoroso nas imagens, nos seus movimentos, na força da cultura afro-brasileira, nas sequências surreais simbolizando o luto e a dor, na beleza dos pequenos gestos cotidianos, dos diálogos íntimos e da sua proximidade sincera conosco.
É um filme primoroso nas imagens, nos seus movimentos, na força da cultura afro-brasileira, nas sequências surreais simbolizando o luto e a dor, na beleza dos pequenos gestos cotidianos, dos diálogos íntimos e da sua proximidade sincera conosco.
"Um brinde à vida que mesmo toda desencontrada e cheia de loucura oferece pra gente os mais lindos encontros e inacreditáveis reencontros, saúde."
"Café com Canela" apesar de refletir sobre a ausência e a solidão que o luto causa traz boas doses de humor e afeto, a transformação por meio do amor, do como a cura de uma dor pode acontecer através de um olhar, palavras e ações ternas e, justamente por isso, se faz um filme imprescindível, já que as relações no cotidiano estão cada vez mais frias e cresce a falta de empatia, ele tem a capacidade de resgatar sentimentos inertes, como a gentileza, e demonstrar que xícaras de café podem conter abraços aconchegantes e transformadores.