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quarta-feira, 4 de julho de 2012

Abutres (Carancho)

"Abutres" (2010) de Pablo Trapero é um drama urbano, uma denúncia social, a inteligência do longa surpreende e demonstra mais uma vez que o cinema argentino esbanja vitalidade.
Acompanhamos Sosa (Ricardo Darín), um advogado, cuja licença fora caçada, que vive de explorar a miséria dos outros. Sosa faz plantão em hospitais à espreita de potenciais processos e indenizações de seguradoras. É em uma dessas tocaias que conhece a médica Lújan (Martina Gúsman). Sosa se apaixona e, então, sua rotina passa a ser um obstáculo monstruoso. Trapero concilia com vigor os gêneros a que se propõe trabalhar, produzindo um filme de extrema eficiência dramática, com profundo respaldo social (a legislação argentina sobre indenizações por acidentes foi modificada após o lançamento do longa), e invejável fôlego romântico. No limiar, a história de amor que Trapero queria contar é que dá sustentação à trama. E é pelo desfecho desta história que o espectador irá suspirar.
A violência do trânsito é vista de uma maneira diferenciada. Não apenas as colisões são violentas, mas todo o cenário que envolve as cenas de batidas e atropelamentos. Uma das cenas mais fortes é quando mostra a preparação da simulação de um atropelamento, quando Sosa quebra a perna de um amigo com uma marreta. Pessoas morrem, outras ficam incapacitadas. E ao redor delas, gira muito dinheiro. Seja através da estrutura de socorro, de ambulâncias até hospitais, seja por fundações e profissionais que correm atrás de indenizações para as vítimas e seus familiares. É uma história intricada, violenta, cheia de nuances, sordidez e algo de romance e esperança.
Sosa não só segue ambulâncias que vão socorrer vítimas de acidentes de trânsito, como simula atropelamentos para embolsar indenizações. O título do filme não poderia ser mais correto. A metáfora aos necrófagos que aguardam a carniça de animais mortos para deles se alimentarem.
Insatisfeitos com suas vidas e carreiras, Sosa e Lújan buscam se fortalecer juntos, para poder enfrentar o sistema de corrupção dos abutres (amparado pela própria polícia) e tentar uma nova vida. A última sequência é corajosa ao mostrar a busca pela sobrevivência. E ainda que o horizonte pareça cada vez mais complicado, o espectador segue com eles na busca por uma alternativa. Com um ritmo ágil, um roteiro bem amarrado e uma direção atenta aos melhores ângulos, "Abutres" revela mais um grande trabalho do ator Ricardo Darín.

A crítica ao sistema securitário é aguda, e "Abutres" mostra-se um filme sério, forte, tenso e intrigante. 
Advogados inescrupulosos se aproveitam de um sistema corrupto para prosperar literalmente com mortes e mutilações, ficando com a maior parcela e deixando as vítimas com muito pouco. Um grande filme para se respeitar, seus personagens se desenvolvem em uma situação crítica e desesperadora, e causa um certo espanto observar que pessoas lucram diante da desgraça alheia. De forma nua e crua retrata esse problema atroz. É um longa de extrema valia.

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