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quarta-feira, 16 de julho de 2014

O Mágico (L'illusionniste)

"O Mágico" (2010) de Sylvain Chomet (As Bicicletas de Belleville - 2003, "Attila Marcel - 2013) resgata um roteiro escrito em 1956 por Jacques Tati, o Charlie Chaplin francês, e compõe uma obra de extrema beleza.
A história se passa no final dos anos 50 e segue um mágico decadente, um homem alto e desengonçado, um raro exemplar da arte que está dando lugar a outras formas de entretenimento, suas apresentações carecem de público, as pessoas já não se interessam por algo tão ingênuo. Sua carreira corre o risco de extinção se não adaptá-la ao gosto atual, ele segue se apresentando em teatros franceses e ingleses, infelizmente sem sucesso, até que vê uma possibilidade ao ser convidado por um bêbado escocês num casamento do qual fez uma breve apresentação. Então, ele parte para uma pequena cidade da Escócia e conhece Alice, uma doce menina que é a única a se encantar com a magia. Ele inicialmente a presenteia com um par de sapatos, a partir daí ela pensa que tudo na vida poderia ser mudado com um passe de mágica. Ao ir embora do local a garota o segue, o mágico não diz nada e cede a cada pedido de Alice, ela vai recebendo os presentes de forma lúdica e acaba não percebendo a melancolia e a decadência que toma o lugar em que eles moram. O hotel é repleto de tipos circenses, um ventríloquo, três equilibristas, e um palhaço, todos em total desespero pela falta de emprego.
É realmente triste pensar que a classe artística, aquela que buscava a alegria genuína de seu público se foi, pessoas simples que não se importavam com o quanto ganhavam, mas que tinham a necessidade de expor a arte da qual aperfeiçoavam com tanto carinho. Imensamente agradável assistir esta obra, a figura de Jacques Tati está presente a todo instante no personagem, seja nos trejeitos, na forma de lidar com as situações que vão aparecendo, e claro, na bela sequência do cinema, quando o mágico entra na sala e nos deparamos com um filme em imagem real de Tati.
Alice se transforma, sua inocência dá lugar à independência, torna-se consumista e deseja ser como as outras moças, enquanto o mágico lida com a dificuldade emocional e financeira, ela não para de pedir roupas e sapatos, para agradá-la ele se sujeita a empregos dos quais nada tem a ver com ele.

Os traços do desenho, as cores, o cenário e a história em si tem um ar nostálgico e melancólico. Essa é uma das melhores animações destinada ao mundo adulto, ela disserta sobre valores com uma sutileza ímpar, nos levando ao riso e ao choro. Quase sem falas "O Mágico" se baseia em expressões, gestuais, e também em incríveis piadinhas visuais.
O novo sempre surgirá, é natural, para Alice há lugar, porém para o mágico não. É bonito ver um artista do passado e é uma pena que não exista um encaixe, infelizmente torna-se fora de moda, pois já não atrai a atenção do público. O estopim acontece quando é contratado por uma loja para realizar truques diante de uma vitrine, onde consumidores aplaudem desenfreadamente, desmoralizado se sente incapaz de continuar em algo que já não lhe dá um retorno sincero. Ele decide partir, mas antes deixa um bilhete a Alice, que diz: "A mágica não existe". 
O mundo acaba engolindo tudo o que é bom e verdadeiro, não tem como recuperar o sentimento de deslumbramento perante a certas coisas, o mágico percebe isso e simplesmente aceita.

O filme é melancólico e traz muitas questões ao espectador, como o embate entre o velho e o novo, o consumismo, e os artistas genuínos. Sylvain Chomet nos encanta com um cinema charmoso e delicado, em meio a uma enxurrada de animações em 3D, "O Mágico" é um respiro maravilhoso e uma chance de contemplar o que essencialmente é belo.

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