"O Pintassilgo" (2019) dirigido por John Crowley (Brooklin - 2015) é a adaptação do romance homônimo da escritora Donna Tartt, ganhador do prêmio Pulitzer de 2014, uma obra cuja narrativa intriga e exala melancolia com seus personagens enredados pelas casualidades do destino, as experiências vividas estimulam pensamentos sobre o como os acontecimentos vão nos moldando e nos transportando para lugares que nunca havíamos pensado estar. A adaptação para o cinema causou uma divisão de opiniões e muitos o têm classificado como um filme de estilo clássico com ótimos elementos, mas que não soube atrair a atenção como um todo, soa confuso e arrastado, além de ser a maior bomba de bilheteria do ano, isso tudo não significa que o longa seja ruim, existe uma clara falta de interesse no mercado de adaptações literárias, o calhamaço de Donna Tartt possui uma história reflexiva, não linear e triste, sua escrita aparentemente complexa estimula com tantos detalhes e sentimentos esmiuçados, um clássico instantâneo que atinge um bom bocado de pessoas, mas não o suficiente para o tornar tão popular.
"O Pintassilgo" é uma história que retrata traumas, perdas, tristeza, culpa, memórias, redenção e também amor, um acontecimento trágico marca a vida do pequeno Theo e suas decisões nesse instante o moldará dali para frente, as pequenas camadas vão sutilmente sendo apresentadas e mergulhamos profundo em suas emoções. Um atentado terrorista no Metropolitan Museum of Art, em Nova York, modifica para sempre a vida do jovem Theodore Decker (Oakes Fegley). Além de sua mãe falecer no evento, ele é incentivado por um desconhecido a levar consigo um quadro lá exposto, O Pintassilgo, além de um anel com o brasão de sua família. Nos dias seguintes Theo recebe o abrigo da sra. Barbour (Nicole Kidman) e, ao pesquisar sobre o brasão, conhece Hobie (Jeffrey Wright), um vendedor de antiguidades que agora é o tutor de Pippa (Aimee Laurence), filha do homem desconhecido, que também estava no museu no momento do atentado. Tal encontro modifica para sempre a vida do garoto, seja por seu interesse no mercado de antiguidades ou mesmo pela paixão que nutre pela jovem.
Completamente fiel ao livro, tanto na narrativa como na ambientação melancólica e cenários reproduzidos, assim como a caracterização dos personagens e a intensidade das relações e suas sutilezas, como olhares e gestos, também a fotografia e trilha sonora somam para intensificar as sensações, não é simples adaptar uma obra que passeia por várias fases da vida, ainda mais de forma não tradicional, é um longa que soube valorizar a narrativa e extrair o máximo de detalhes importantes de todo o contexto, claro que obviamente só lendo para perceber a grandiosidade, mas a essência está presente.
Muitas partes marcam e ficam ecoando, vamos acompanhando toda a trajetória de Theo, a perda da mãe, a culpa o corroendo, o quadro que guarda e mantém em segredo - uma forma de resgatar a memória da mãe, a adaptação na casa dos Barbour, o aprendizado com Hobie, que o faz se apaixonar por antiguidades, o amor por Pippa o enredando nisso tudo; o retorno do pai, a ida para o Texas, a amizade com Boris - ponto crucial de sua formação de caráter, seu vício em drogas e as reviravoltas da vida que vão o tragando para um lugar decadente e solitário.
"Não escolhemos o nosso coração. Não podemos obrigar-nos a querer o que é bom para nós ou o que é bom para as outras pessoas. Não escolhemos a pessoa que somos."
Há bastante drama, porém o suspense permeia por todo o desenrolar, afinal o quadro, o Pintassilgo do artista holandês Carel Fabritius, que faleceu numa explosão aos 32 anos e cuja pintura foi uma das doze que sobreviveram a esse evento faz um paralelo e conversa com a história de Theo intermeando pensamentos acerca da arte e vida num conjunto de reflexões filosóficas muito bonitas.
"O Pintassilgo" é um filme requintado de atmosfera misteriosa e narrativamente denso, promove um olhar sensível para a construção de caráter e amadurecimento do protagonista guiando-nos por caminhos tortuosos, conflitantes e apaixonantes.
"Que a vida - para além do mais que possa ser - é curta. Que o destino é cruel e talvez não aleatório. Que a Natureza (ou seja, a Morte) ganha sempre, mas isso não quer dizer que tenhamos de lhe baixar a cabeça e a bajular..."
Mais um filme para a lista.
ResponderExcluirAbraço