"O Tempo e o Vento" (2006) dirigido por Reha Erdem (Kosmos - 2010, Jîn - 2013) é um retrato duro e poético sobre o rito de passagem de três crianças numa pequena aldeia do noroeste da Turquia, escondidas entre montanhas e colinas elas vão se confrontando cada vez mais com uma realidade preestabelecida, assim como o ciclo da passagem das estações e a alternância entre noite e dia, o amadurecimento e a transformação vêm com peso e responsabilidade de repetir o mesmo trajeto das gerações anteriores.
Em um pequeno vilarejo do interior da Turquia, um grupo de crianças tenta sobreviver às dificuldades do cotidiano por meio da imaginação e da integração com a natureza e suas estações do ano. A história é bastante fluída, não há exatamente algo específico, simplesmente o cotidiano tedioso do local sendo exposto com lirismo e a natureza se mesclando à mudança das crianças, talvez o personagem que mais se destaque seja Ömer (Özkan Özen), que a maior parte do tempo dá asas a sua imaginação e cria planos para matar seu pai, o imã da aldeia, o motivo seria por causa que o pai destine todo seu carinho e admiração ao irmão mais novo, que sempre está com um sorriso no rosto respondendo as perguntas do pai, ele passa os dias andando e subindo as montanhas com seu amigo Yakup (Ali Bey Kayali), este que nutre uma paixão secreta por sua professora, ele é aplicado e sempre está às voltas dela, Yakup com o decorrer vai percebendo seu pai e o tratamento humilhante que recebe do avô, isso reflete no respeito que sentia por ele. Yildiz (Elit Iscan) é apegada mais ao pai e não entende o porquê a mãe nunca fica do seu lado, ela fica confusa e brava quando escuta os pais fazendo sexo, pois isso pode gerar mais responsabilidade, um novo bebê para ela cuidar, a obrigação surge ao mesmo tempo que eles amadurecem, não há espaço para desejos pessoais, o ciclo geracional está entranhado. Exemplificando de maneira poética surgem as paisagens naturais que se fundem perfeitamente ao rito de passagem, há cenas em que as crianças são mostradas deitadas imóveis junto a folhas e galhos ou cobertas de terra, pode-se pensar que elas estão apenas dormindo ou que o tédio as domine, mas pode-se deduzir que seja um tipo de metamorfose para a chegada da vida adulta, conforme vão percebendo que estão andando nos mesmos caminhos tortuosos dos pais que também foram percorridos por gerações anteriores, vão aderindo as mesmas dores e frustrações, percebem que por mais que estudem e que a modernidade seja chamativa, nada realmente muda ali, uma certa melancolia invade as crianças por terem noção que seus pais estão reproduzindo o que seus pais lhe fizeram e que foi sempre assim.
O ambiente árido também conversa com o tipo de tratamento que os pais oferecem aos filhos, poucas são as demonstrações de afeto, a autoridade para impôr respeito é o que determina tudo, Yakup em dado momento observa seu pai sendo humilhado pelo avô, que diz que é um inútil e que não serve nem para levantar um muro, Yakup o vê chorando e toda a imagem que tinha dele se desfaz, é a tristeza de perceber que o pai reproduziu exatamente o mesmo com ele. O amadurecimento vem repleto de fardos e um amontoado de gerações sobre as costas. Tudo se repete.
Encantador como a natureza nos filmes de Reha Erdem é filmada se tornando personagem, um misto de fascinação e angústia, neste a natureza é majestosa e apesar da amplitude e infinitude a sensação é de aprisionamento e opressão. A trilha sonora imponente de Arvo Pärt eleva e hipnotiza, reflete-se variadas coisas, principalmente se é possível quebrar ciclos geracionais permeados de fortes tradições e cultura religiosa.
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