"Relatos Selvagens" (2014) do diretor Damián Szifron é mais uma ótima amostra do grande potencial do cinema argentino em trazer histórias inteligentes contendo reflexões e críticas, mas que que não deixam de dialogar com o grande público. A soma de qualidade narrativa e entretenimento já virou a marca do cinema dos hermanos.
As seis crônicas urbanas são recheadas de vingança, humor negro, e há muita paixão no modo com que são expostas. Não tem como ficar indiferente a elas, mesmo que uma ou outra seja menos interessante ou impactante, a fórmula utilizada é sem dúvidas envolvente e o filme realmente merece muitos elogios. Como o título sugere a trama oferece relatos de selvageria humana, explosões de raiva, desejo de vingança, ações um tanto questionáveis permeadas por um humor cáustico.
Antes dos créditos de abertura é retratado o relato "Pasternak", do qual ocorre dentro de uma viagem de avião, uma conversa comum acontece entre a modelo Isabel (Maria Marull) e Salgado (Dario Grandinetti), mas de repente um nome vem à tona, Gabriel Pasternak, um antigo namorado da moça; então outros ao ouvir tal nome dizem conhecer o rapaz e descobrem ser ele o piloto, a coincidência de estarem no mesmo voo impressiona, e daí para a tragédia é rápido. Carregado no humor negro o filme se inicia de forma surpreendente.
A segunda história que vemos tem o título de "As Ratas" e se passa num bar. Em uma noite chuvosa, a atendente (Julieta Zylberberg) descobre que o seu único cliente (Cesar Bordon), um influente empresário e agora candidato à prefeito foi o homem que destruiu sua família fazendo com que seu pai se suicidasse. Muito nervosa ela conta para a cozinheira (Rita Cortese), esta lhe propõe algo inusitado. Em seguida vem "O Mais Forte", que mostra o quanto o ser humano se modifica atrás do volante, talvez um dos momentos em que seu instinto violento mais se revele. Esse se aproxima da realidade e faz com que muitos se identifiquem, o relato é exagerado exatamente para criticar o comportamento abissal que se passa no trânsito. O executivo Diego (Leonardo Sbaraglia) dirige seu carro importado pela estrada e xinga um motorista (Walter Donado), que dificulta sua passagem, só que mais adiante o pneu do carro do magnata fura e é obrigado a sair de seu conforto e tentar trocá-lo, tempo suficiente para o cara do carro velho alcançá-lo. O que se segue é algo ridículo e lembra desenhos animados tamanha surrealidade que chega a crueldade.
"Bombita", a quarta história traz Ricardo Darín, que vive o engenheiro Simon, um especialista em demolição. Ele começa a ter alguns problemas com a fiscalização de trânsito argentina, reclama por ter seu carro guinchado e pela multa abusiva sendo que no local não havia nenhum tipo de aviso indicando que não poderia estacionar, as multas injustas e a burocracia que se inicia juntamente com o descaso é impressionante, não há opção, ou você paga, ou paga; e então ele faz o que todos gostaríamos de fazer...
O quinto relato, "A Proposta", retrata o como as pessoas com grande poder se sentem privilegiadas a ponto de distorcer e moldar a realidade como quiserem, pois segundo elas todos têm seu preço. Um jovem, filho de um importante milionário (Oscar Martínez), acaba atropelando a matando uma mulher grávida ao dirigir bêbado, e claro não prestou socorro. O advogado da família dá a ideia de colocar a culpa no caseiro (Gérman de Silva), que trabalha anos e anos lá. Histórias deste tipo acontecem aos montes e esse é o único segmento que se utiliza de um desfecho diferente.
A última história "Até que a Morte nos Separe", conta sobre uma festa de casamento um tanto quanto inusitada. Seu início se dá de forma completamente normal, pessoas bebendo e dançando, entre abraços e felicitações a noiva Romina (Érica Rivas), descobre que seu noivo Ariel (Diego Gentile) está de caso com uma mulher de seu trabalho, daí o melodrama e a vingança entram em cena.
Raiva, revolta, desespero, o que se é capaz de fazer em momentos que o limite é testado?
Várias situações no cotidiano que são desencadeadas por estresse emocional acabam por se tornar cômicas. "Relatos Selvagens" tem um humor negro de primeira, um roteiro crítico, ácido e eficaz, todas as histórias são ótimas, tem atuações impecáveis e a trilha sonora complementa perfeitamente.
Uma obra para ser apreciada e elogiada, discute sobre temas sociais, além de evidenciar do que o ser humano é capaz quando deixa seu lado animal sair.
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