"Nic" (1998) dirigido pela polonesa Dorota Kedzierzawska é uma pequena obra de arte. É um retrato em tons pálidos da vida de Hela, uma mãe que vive em uma cidade grande com poucos recursos e muitas crianças. Neste cotidiano vamos acompanhando onde a bruta realidade e o sonho se entrecortam em meio aos gritos e silêncios.
Dorota Kedzierzawska entrou para minha lista de diretores preferidos, seus filmes são sensíveis, e retratam sempre as tragédias sociais, problemas que acometem as pessoas mais simples. Não tem como não se emocionar, ou ficar comovido com as histórias que sempre estão envolvidas em uma fotografia e narrativa diferenciada.
Meu primeiro contato com o cinema de Dorota foi em "Eu Existo" (2005), que acompanha a busca de identidade de um menino que não tem ninguém e que tenta achar-se diante ao mundo onde só o que importa é a condição financeira e superficialidades. A delicadeza deste filme é imensa e consequentemente nos toca, afinal todos nós buscamos nos encaixar na sociedade e em si mesmos. Um outro filme belíssimo de Dorota é "Hora de Morrer" (2007), neste é retratado a velhice e fala do inevitável, a morte. A fotografia em preto e branco só ressalta o tom de solidão. É muito realista em mostrar a velhice e todos os fatores e consequências que a rodeia.
Em "Nic" que na tradução literal significa Nada, acompanhamos Hela, uma jovem e bela mulher que está afogada em uma vida sem perspectivas, com três filhos e um homem que lhe trata mal. Quando engravida novamente seu desespero aumenta, pois não quer contar ao seu marido por medo de sua reação, afinal a situação financeira é bem decadente. Ela tenta de todas as formas abortar, mas as questões morais e religiosas aparecem. Até que não tendo o que fazer acaba por ter o bebê escondida no banheiro e medidas extremas são tomadas. Hela é um ser humano perdido que busca um pouco de amor em qualquer possibilidade que encontra, mas toda vez é maltratada, seus olhos sempre estão olhando para dentro de si mesma e refletem apenas desamor, desilusão e desencaixe. Para esta mulher já não há esperanças, então perde a vontade e desejos, a dor assume e tudo que lhe acontece já não importa mais.
É um filme amargo, sufocante, angustiante. Nos faz refletir sobre ter direitos em relação ao querer e o não querer, principalmente no que se diz respeito a gravidez.
Não é fácil pra ninguém, para as mulheres então, é bem comum encontrarmos histórias semelhantes, moças jovens com vários filhos sem ter condições de criá-los e até de amá-los, e cujos maridos são ausentes, ou violentos. Imagina o ser humano que essas crianças se tornarão, no mínimo serão esvaziadas de amor e perspectivas. Essas histórias existem aos montes. Diante desta situação se perde a esperança e o amor à vida.
Em meio há tanto sofrimento existe beleza, e ela é intensificada por causa da fotografia em tons pastéis, que mais parece uma sucessão de quadros. É realmente uma pequena obra de arte.
É belo, contido, sensível. Um retrato do oprimido e da perda do amor. Os filmes de Dorota reproduzem de maneira real aspectos da vida que o cinema pouco explora. São delicados, emocionantes e indispensáveis, além de podermos nos embebedar em suas belas fotografias.