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quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Faroeste Caboclo

A epopeia de João de Santo Cristo foi adaptada pelo diretor estreante René Sampaio, que conseguiu captar todos os aspectos da música, porém também tomou a liberdade de criação. René merece aplausos, pois mesmo não sendo totalmente fiel à canção fez um filme bonito e realista.
João deixa Santo Cristo em busca de uma vida melhor em Brasília. Ele quer deixar o passado repleto de tragédias para trás. Lá, conta com apoio do primo traficante Pablo, com quem passa a trabalhar. Já conhecido como João de Santo Cristo, o jovem se envolve com o tráfico de drogas, ao mesmo tempo em que mantém um emprego como carpinteiro. Em meio a tudo isso, conhece a bela e inquieta Maria Lúcia, filha de um senador, por quem se apaixona loucamente. Os dois começam uma relação marcada pela paixão e pelo romance, mas logo se verá em meio a uma guerra com o playboy e traficante Jeremias, que coloca tudo a perder.
O início é rapidamente mostrado, não há perda de tempo, a passagem se dá de forma sutil, como a bela cena em que João busca água no poço com a mãe e quando retira o balde já está mais velho, ou a entrada e saída do reformatório e sua chegada a Brasília. A história começa de fato quando ele encontra Pablo (César Troncoso), seu primo distante, um peruano que vivia na Bolívia e que muitas coisas trazia de lá, João de Santo Cristo (Fabrício Boliveira) começa a trabalhar em uma carpintaria, mas faz serviços para Pablo e um dia em que vai entregar a droga termina fugindo da polícia e encontra Maria Lúcia (Ísis Valverde), uma menina rica e enfadada com a vida que leva. João e Maria tem mais destaque no filme, seus personagens são muito bem explorados, apesar de não seguir à risca a música. Com o relacionamento muitos problemas surgem, Jeremias (Felipe Abib), o traficante playboy apaixonado por Maria Lúcia vê em João seu rival no mundo das drogas, no que desencadeia a grande cena final, o duelo.
Todo o contexto está presente, mas a liberdade de criar em cima de uma letra tão amada faz de "Faroeste Caboclo" uma obra ousada e acertada.
Fabrício Boliveira dá vida a João de Santo Cristo e o faz com maestria, seu personagem é humano e real, pois ele é tanto movido pelo ódio como pelo amor. Seus olhos mesmo que a maioria das vezes expressem ódio, no fundo há uma certa inocência, o que nos aproxima muito dele. Os outros atores também são ótimos, Ísis Valverde faz uma Maria Lúcia silenciosa, apaixonada e perdida. Felipe Abib como Jeremias soma bastante, seu personagem poderia soar caricato, mas ao contrário, ele exibe exatamente o perfil de traficante playboy que por se sentir fraco é viciado em cocaína. César Troncoso (ator uruguaio) como Pablo é um personagem carismático mesmo sendo um traficante que não perdoa. Antonio Calloni, o  policial corrupto consegue dosar perversidade e humor. Todos esses personagens são bem explorados sem ser exagerados.

A crítica sobre o preconceito social e racial é discutido e o romance é ampliado, há bastante cenas de paixão com direito a muito sexo. O filme é ambientado na década de 80, fica evidente pela caracterização dos personagens, carros, cenários e pela trilha sonora que mescla punk rock, rock nacional, música disco, além das músicas tradicionais de faroeste. O clima de faroeste é evidenciado quando Jeremias e João se estranham, o close nos olhos, a andada e a parada, o clima todo foi bem trabalhado. Um dos méritos é não poupar a violência, a cena em que João mata o policial sem hesitar é incrível. É a violência real e não coreografada.
Um belo exemplo de criatividade e cinema autoral, também não deixa de ser um bom entretenimento a todos que gostam de prestigiar o cinema nacional. O filme tem diversas qualidades.

"Faroeste Caboclo" é uma adaptação, portanto é necessário se desprender do conceito fidelidade. O diretor tomou liberdade poética, enxugou a trama e também acrescentou ou evidenciou outras coisas, como a cena final, por exemplo, que ao contrário da música ninguém estava lá para assistir. Um desfecho coerente para o filme. A canção tema está sempre presente, seja na melodia ou na música em si nos créditos finais.
É o cinema nacional mostrando que tem capacidade de ser elaborado e conduzido sem cair em clichês que surgem aos montes nos filmes mais comerciais.

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