Marina Abramovic é uma performer que começou sua carreira no início dos anos 70. Ativa por três décadas, ela recentemente começou a se descrever como a "avó da arte da performance". O seu trabalho explora a relação entre o performer e o público, os limites do corpo, e as possibilidades da mente.
O documentário começa mostrando o frenesi do dia de abertura da exposição "The Artist Is Present", uma retrospectiva dos quarenta anos de sua carreira, que inclui intervenções, peças sonoras, obras em vídeo, instalações fotográficas, performances solo e coletivas tudo feito por jovens artistas no Museu de Arte Moderna (MOMA) de NY. Depois disso, o filme regride seis meses e nós encontramos Marina Abramovic em seu escritório, uma mulher elegante, mas comum. O contraste imposto pelo diretor Matthew Akers é marcante: Marina, a mulher que quase morreu asfixiada pela fumaça em uma apresentação que resumia-se em ficar no meio de um pentagrama em chamas, é mostrada em sua intimidade nas mais variadas atividades.
A aparição de Ulay é um dos grandes pontos do documentário, cujo há depoimentos sobre ela, Ulay foi seu parceiro em todos os quesitos, ele desenvolveu uma intensa colaboração artística, mostrando suas performances na batalha dos sexos. A relação durou 12 anos, e depois passaram mais de 23 anos distantes, até que se encontram novamente na exposição, onde Ulay oferece sua experiência do relacionamento. O documentário começa a nos emocionar quando mostra Marina junto ao público em uma performance que se desenrola por 3 meses, que consiste em estar sentada estática e olhar fixamente para quem se senta à sua frente, canais de comunicação são abertos para que a artista se torne próxima das pessoas.
No começo da carreira Marina disse ter escutado muito durante a suas entrevistas se tudo aquilo era arte mesmo, e nós compartilhamos dessa ideia no início, e de fato é de se estranhar, porém a resposta de que tudo que Marina se dispõe a fazer, vem de uma maneira arrebatadora. Difícil colocar em palavras o sentimento que causa ao assisti-la lá parada concentrada expondo o seu eu perante as pessoas, não dá para afirmar que está representando, é uma linha muito tênue que nos confunde e emociona. É incrível como cada uma das pessoas que se senta à sua frente sente um tipo de sensação, alguns choram, outros sorriem, outros ficam curiosos, interrogativos, ou tentam persuadi-la, mas todos de alguma forma se sentem vulneráveis diante dela.
As pessoas estão distantes umas das outras hoje em dia, pouco se vê gentilezas e gestos de carinho para com o outro, através dessa performance vemos o quanto somos carentes de atenção e que um único olhar é capaz de nos desmanchar e aliviar de um grande peso. As pessoas se despem diante ao seu olhar, vemos dor, alegria, raiva, desespero, curiosidade, mas ninguém sai imune a essa experiência. Quando Ulay senta-se e Marina levanta a sua cabeça e o olha, sem dúvida é o momento mais emocionante, vemos pelos olhares tantas coisas, saudade dos tempos vividos, o amor em comum pela arte, também ternura, respeito e perdão. O gesto de tocar as mãos é dotado de uma sensibilidade gigantesca.
O sacrifício de Marina ao ficar sentada por tanto tempo sem se mover dá a conotação de mártir, o cansaço físico é tanto que é preciso uma certa abstração, mas ela precisa estar presente, se ela sumir e seu olhar se tornar distante as pessoas perceberão. Isso tudo é incrível, Marina Abramovic é um ser humano diferenciado, teve seus problemas na infância, mas tudo colaborou para que se tornasse essa pessoa maravilhosa e única.
Há algo que incomoda, a idolatria, vemos pessoas se desesperando, suportando filas, dormindo na porta do museu, tudo por um número que os levará a se sentarem diante a sua deusa, isso chega a desmanchar a aura da arte, irritante essa glorificação, eles não pensam no absurdo em que estão fazendo, claro que o artista merece reconhecimento quando seu trabalho é bem feito, digno de aplausos e lágrimas como o de Marina, só que esta coisa de fazer tudo por um ídolo (o que um artista não deve se tornar), quebra o encanto, realmente estraga e se torna fútil. A arte em si termina em segundo plano.
É fato que qualquer esquisitice pode ser denominada como arte, exemplos não faltam, até cocô enlatado é arte, vide "Merda d'Artista" do italiano Piero Manzoni, a nós meros mortais resta admirar ou se abster de tudo isso, a arte tem que provocar e comover, que não se torne efêmera, e que acrescente.
"Eu tenho 63 anos, e não quero mais ser alternativa", diz Marina Abramovic. Foi só depois dos quarenta anos de carreira, com muito do seu tempo dedicado a administração e ao marketing, que conquistou com o auxílio de ampla cobertura da mídia, o status de estrela do universo artístico. A performance segundo Marina Abramovic é uma abordagem direta e emocional, inferior apenas a música.
É raro alguém olhar pra você, quando digo olhar, é no sentido mais amplo da palavra, aquele olhar que dá atenção, aquele que te acalma e te respeita. No momento em que sentam e olham para Marina, alguns se enxergam como um autorretrato, sentem que estão a olhar a sua individualidade como se ela fosse um espelho e, por isso a maioria chora.
O documentário é uma experiência fantástica, nos leva a tantos pensamentos, a rever tantas atitudes, e se isso não for arte, não sei o que pode ser.
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