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quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Gritos e Sussurros (Viskningar Och Rop)

A história é sobre três irmãs que habitam uma casa de campo no século XIX. Agnes (Harriet Andersson), Karin (Ingrid Thulin) e Maria (Liv Ullmann), elas são o retrato do desamparo e do desencanto, traduzido em olhares perdidos, choros incontidos e gestos extremos. A primeira está muito doente e carece de cuidados especiais, ainda que, no atual estágio de sua enfermidade, eles sejam apenas paliativos. As outras duas são confrontadas com a dor da existência em um alto grau ao lidar com essa situação difícil. Ao se deparar com a agonia dos últimos dias de Agnes, Karin e Maria também refletem sobre suas próprias vidas, seus matrimônios, suas inseguranças e infelicidades. E a morte de Agnes acaba aproximando as vidas separadas de suas irmãs.
Ingmar Bergman, diretor de "Gritos e Sussurros" é conhecedor da alma humana e imprime de maneira desconcertante isso em seus filmes, ele é adorado e respeitado pelo público e ícone do cinema arte. Nesse o clima é tenso e desconfortante, as mulheres revelam desesperos contidos, amarguras, tristezas, e isso tudo é exprimido pelos rostos em close, marca de Bergman. A cena em que Maria tem seu rosto analisado diante do espelho (identificado à câmera, para a qual ela olha) por seu amante (o médico interpretado por Erland Josephson) é de uma agressividade e um sadismo incríveis: ele associa cada vinco e cada ruga de Maria ou a um defeito dela ou a um percalço vivido. Tudo em sua mise en scène é questão de coreografia, decoro, posicionamento e movimentação de corpos em um espaço minuciosamente arquitetado. A cor vermelha sempre presente é a dor que permeia o espaço, e aquelas mulheres. Também a cor do sangue, da paixão e o da própria alma. As mulheres enigmáticas e fantasmagóricas vagueiam em vestidos e camisolas de um branco atordoante. A relação entre Agnes e Anna, a empregada que perdeu sua filha recentemente é carinhosa e muito maternal. Muitas vezes ela a pega como se fosse um bebê, a sua dedicação é incansável.
Há sequências de sonhos e flashbacks que estabelecem como o passado e o presente se sobrepõem, ao mesmo tempo que oferecem uma explicação para a evidente paralisia emocional. Bergman, porém, raramente contemplou um mundo sem esperança e o filme termina com um doce sorriso. "Fomos até dar uma pequena caminhada. Foi um acontecimento e tanto (...). Toda a minha dor foi embora. As pessoas de quem eu mais gosto estão comigo (...). Pensei: Isto é realmente a felicidade."
O ser humano guarda muitos segredos consigo mesmo, e como a alma é complexa, somos capazes de ser cruéis conosco, nos mutilamos interiormente, cultivamos ódio, uma espécie de amargura que só tende a crescer, e eis o vazio existencial. Velamos ele no dia a dia, damos nossos sorrisos forçados, olhamos de forma cínica quase sempre ironizando a vida. É incrível, pois a alegria está na nossa frente e quase nunca a enxergamos, está em pequenos momentos que deveriam ser a alavanca que nos impulsiona e que nos faz respirar a vida novamente. 

"Gritos e Sussurros" é uma experiência sensorial, ele se desenvolve nas entrelinhas, e cada um interpreta à sua maneira, mas é inevitável não nos colocar por vezes na situação dessas personagens, que entre gritos e sussurros apresentam seus fantasmas interiores.
Acima de tudo propõe que pensemos ao menos um pouco, que viver vale a pena, mesmo que seja em um breve momento de alegria e paz, pois a morte é como um jogo de xadrez, cuja única opção que temos é adiar a derrota.
O filme se traduz em emoção, em cada olhar, expressão, maneira de andar, são os detalhes que nos faz compreender aquelas mulheres. O longa deve ser admirado da mesma forma que se aprecia um quadro, com precisão e profundidade. São sentimentos traduzidos em imagens, que por vezes gritam e que por vezes são silenciosas.

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