segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Bacurau

"Bacurau" (2019) dirigido por Juliano Dornelles e Kleber Mendonça Filho (Aquarius - 2016) é um filme instigante e essencial, sua mescla de gêneros aguça nossa curiosidade e imprime força a cada cena e diálogo, traz a representatividade nordestina, a cultura de um povo forte que jamais cede ou retrocede, a palavra que mais o resume é resistência. 
Pouco após a morte de dona Carmelita, aos 94 anos, os moradores de um pequeno povoado localizado no sertão brasileiro, chamado Bacurau, descobrem que a comunidade não consta mais em qualquer mapa. Aos poucos, percebem algo estranho na região: enquanto drones passeiam pelos céus, estrangeiros chegam à cidade pela primeira vez. Quando carros se tornam vítimas de tiros e cadáveres começam a aparecer, Teresa (Bárbara Colen), Domingas (Sônia Braga), Acácio (Thomas Aquino), Plínio (Wilson Rabelo), Lunga (Silvero Pereira) e outros habitantes chegam à conclusão de que estão sendo atacados. Falta identificar o inimigo e criar coletivamente um meio de defesa.
O filme aos poucos revela seus personagens, não há protagonismo, todos possuem seu espaço e importância, assim como o próprio lugar, Bacurau, cujo nome vem de um pássaro noturno, de repente, a cidade não se encontra mais no mapa e o único jeito de ensinar as crianças é utilizando um mapa confeccionado por eles próprios, algumas coisas estranhas vão acontecendo e a população já acostumada com a vida difícil como a questão da água acabam dando seu jeito, pois não há qualquer amparo do governo, unidas seguem suas vidas rejeitando o prefeito que quando aparece fazem questão de deixá-lo falando sozinho.
O clima do filme é de puro suspense e se desenvolve para um faroeste à la cangaço, além de flertar com a ficção científica, uma distopia nem tão distópica assim já que muito do que é mostrado revela não só da atualidade em que vivemos, mas sobre o como sempre foi com seu ciclo de injustiças, corrupção e violência, onde se aniquila o mais pobre e o considerado ignorante, as mazelas expostas são realistas e explícitas e, por isso, tão incômodas; o caos é familiar. Potente em sua mensagem e certeiro como entretenimento, um longa completo e brilhante em todos os sentidos, uma história que representa o país, há símbolos e metáforas pelo decorrer que vamos descobrindo juntamente com nuances de surrealismo, possui diálogos que enfrentam e marcam, certamente Bacurau veio na hora certa para nos fazer refletir o Brasil como um todo e tentar entendê-lo sem referências externas e preconceitos.

É um filme com um imenso poder de despertar pensamentos, mas isso não quer dizer que seja difícil de assistir, ao contrário, é um ótimo entretenimento, conversa e brinca conosco o tempo todo, os alívios cômicos são espontâneos e provocantes, inúmeras vezes se coloca em evidência clichês utilizados pelo brasileiro, por exemplo, que por morar em determinada parte do país se considere quase um europeu e despreza quem vive em regiões menos favorecidas, subestimam o diferente, uma clara falta de conhecimento em não saber da própria história, além de querer que o país copie o modelo estrangeiro enquanto eles riem, usufruem, apoderam-se e aniquilam.

O levante da população, a união em preservar a cultura e pelo embate começar de dentro da escola se faz intenso e impactante, quem não se arrepiar pela força e coragem dos habitantes de Bacurau está morto por dentro, é imensamente essencial para cada vez mais trabalharmos nossa lucidez nesses tempos tão obscuros e de estreitamento de ideias.
"Bacurau" pulsa resistência e representatividade, é força e emoção, uma obra bonita, provocante e alegórica. 

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