segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Bacurau

"Bacurau" (2019) dirigido por Juliano Dornelles e Kleber Mendonça Filho (Aquarius - 2016) é um filme instigante e essencial, sua mescla de gêneros aguça nossa curiosidade e imprime força a cada cena e diálogo, traz a representatividade nordestina, a cultura de um povo forte que jamais cede ou retrocede, a palavra que mais o resume é resistência. 
Pouco após a morte de dona Carmelita, aos 94 anos, os moradores de um pequeno povoado localizado no sertão brasileiro, chamado Bacurau, descobrem que a comunidade não consta mais em qualquer mapa. Aos poucos, percebem algo estranho na região: enquanto drones passeiam pelos céus, estrangeiros chegam à cidade pela primeira vez. Quando carros se tornam vítimas de tiros e cadáveres começam a aparecer, Teresa (Bárbara Colen), Domingas (Sônia Braga), Acácio (Thomas Aquino), Plínio (Wilson Rabelo), Lunga (Silvero Pereira) e outros habitantes chegam à conclusão de que estão sendo atacados. Falta identificar o inimigo e criar coletivamente um meio de defesa.
O filme aos poucos revela seus personagens, não há protagonismo, todos possuem seu espaço e importância, assim como o próprio lugar, Bacurau, cujo nome vem de um pássaro noturno, de repente, a cidade não se encontra mais no mapa e o único jeito de ensinar as crianças é utilizando um mapa confeccionado por eles próprios, algumas coisas estranhas vão acontecendo e a população já acostumada com a vida difícil como a questão da água acabam dando seu jeito, pois não há qualquer amparo do governo, unidas seguem suas vidas rejeitando o prefeito que quando aparece fazem questão de deixá-lo falando sozinho.
O clima do filme é de puro suspense e se desenvolve para um faroeste à la cangaço, além de flertar com a ficção científica, uma distopia nem tão distópica assim já que muito do que é mostrado revela não só da atualidade em que vivemos, mas sobre o como sempre foi com seu ciclo de injustiças, corrupção e violência, onde se aniquila o mais pobre e o considerado ignorante, as mazelas expostas são realistas e explícitas e, por isso, tão incômodas; o caos é familiar. Potente em sua mensagem e certeiro como entretenimento, um longa completo e brilhante em todos os sentidos, uma história que representa o país, há símbolos e metáforas pelo decorrer que vamos descobrindo juntamente com nuances de surrealismo, possui diálogos que enfrentam e marcam, certamente Bacurau veio na hora certa para nos fazer refletir o Brasil como um todo e tentar entendê-lo sem referências externas e preconceitos.

É um filme com um imenso poder de despertar pensamentos, mas isso não quer dizer que seja difícil de assistir, ao contrário, é um ótimo entretenimento, conversa e brinca conosco o tempo todo, os alívios cômicos são espontâneos e provocantes, inúmeras vezes se coloca em evidência clichês utilizados pelo brasileiro, por exemplo, que por morar em determinada parte do país se considere quase um europeu e despreza quem vive em regiões menos favorecidas, subestimam o diferente, uma clara falta de conhecimento em não saber da própria história, além de querer que o país copie o modelo estrangeiro enquanto eles riem, usufruem, apoderam-se e aniquilam.

O levante da população, a união em preservar a cultura e pelo embate começar de dentro da escola se faz intenso e impactante, quem não se arrepiar pela força e coragem dos habitantes de Bacurau está morto por dentro, é imensamente essencial para cada vez mais trabalharmos nossa lucidez nesses tempos tão obscuros e de estreitamento de ideias.
"Bacurau" pulsa resistência e representatividade, é força e emoção, uma obra bonita, provocante e alegórica. 

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

O Tradutor (Un Traductor)

"O Tradutor" (2018) dirigido por Sebastián Barriuso e Rodrigo Barriuso conta a história real do professor universitário cubano Malin, na verdade, Manuel Barriuso Andino, que vê sua vida transformada quando é designado para ser o tradutor numa ala infantil de um hospital destinado às vitimas do desastre nuclear de Chernobyl. Ambientado em 1989, as primeiras imagens são de Fidel Castro recebendo Gorbachev, Cuba necessita muito da ajuda da URSS, mas devido ao colapso e, por conseguinte, à sua ruína, as coisas começam a mudar no país, inicialmente as aulas de literatura russa são canceladas e novas funções são designadas aos professores, Malin vivido visceralmente por Rodrigo Santoro se vê obrigado a trabalhar num hospital que recebe vítimas do desastre de Chernobyl, especificamente a ala infantil, o sofrimento acaba sendo uma constante em sua vida ao ponto de sugar toda a sua energia, o sistema de saúde de Cuba reconhecido como um dos melhores do mundo recebia essas crianças para o tratamento, mas a comunicação era difícil e, portanto, Malin com ordem do governo inicia esse trabalho. 
Acompanhamos todo o cenário político da época e as suas transformações juntamente com as transformações pessoais do protagonista, sua vida até então boa e sem preocupações passa a ser um fardo, pois o peso de conviver com crianças em estados críticos e terminais deprime e o significado das coisas se modificam, por conta desse dia a dia o casamento se desfaz, não há diálogos e tudo parece pequeno para Malin, sua esposa é curadora de uma galeria de arte e por causa de sua experiência com as crianças que lutam pela vida não consegue entender os problemas dela em relação ao trabalho e as responsabilidades de resolver sozinha as situações cotidianas, grávida do segundo filho resolve deixar a casa e ir morar por uns tempos com seus pais, Malin também se distancia da vida do filho e vemos o como o pequeno é afetado por essa ausência, não é fácil a rotina no hospital, ter que ser o interlocutor de notícias desagradáveis aos pais das crianças, nesse ambiente sufocante ele então inicia formas de suavizar, ou seja, introduz histórias e interação uns com os outros, ouve e percebe o como cada um se sente, o carinho e a compreensão faz total diferença e é aí que o filme nos toca profundamente, é bonito ver o como Malin se dedica a amenizar o sofrimento promovendo leitura, aprendizado e diálogo, o completo oposto em sua casa, mas ali ele faz o possível para o lugar ser menos pesado. A enfermeira Gladys (Maricel Álvarez), ajuda nesse processo, pois possui empatia e sua dedicação também impressiona.

O filme não se aprofunda nas questões políticas, mas a realidade do país socialista é retratada de acordo com as vivências de Malin, observamos vários eventos importantes, como a queda do muro de Berlim e a crise econômica que assolou Cuba devido o colapso da União Soviética, são cenas marcantes e em sua maioria emocionantes, destaque para a ambientação com todos os detalhes que nos transportam para a época. E, claro, a linda dedicação de Rodrigo Santoro ao personagem, percebe-se que deu alma e muita vida para interpretá-lo, brilhante execução.

"O Tradutor" é uma obra que emociona, mas não apela em momento algum para excessos, o desenvolvimento e a transformação vem de forma natural, as vivências do protagonista inspiram muitas reflexões sobre as alternativas de se ajudar os outros em situações críticas, diz como a educação sempre é o melhor caminho fortalecendo assim a empatia, o afeto e olhares diversos, além de colocar tudo em paralelo com o conturbado cenário político.

*O filme foi dirigido pelos filhos de Malin, que na realidade se chama Manuel Barriuso Andino.
*O russo impecável de Santoro se deu por uma imersão na língua durante quatro semanas, estudou e tomou aulas para acertar o ritmo e trabalhou na memorização não apenas de suas falas, mas na de seus colegas de elenco também.

terça-feira, 24 de setembro de 2019

In Fabric

"In Fabric" (2018) dirigido por Peter Strickland (Berberian Sound Studio - 2012) é um filme que transmite nostalgia por causa de sua estética retrô nos remetendo aos clássicos Giallos, uma combinação excêntrica de comédia e terror que o torna numa espécie de conto de fadas sombrio permeado por fortes elementos, como o elegante e estranho vestido cuja cor é denominada como "vermelho artéria", quem o experimenta começa a sofrer terríveis consequências, pois existe uma bizarra maldição envolta nele, a atmosfera de pesadelo e surrealidade é recorrente e seus tons exuberantes quase sempre nos banha em um vermelho extremamente vivo.
Em uma Londres sombria acompanhamos Sheila (Marianne Jean-Baptiste), uma mulher divorciada que divide seu tempo entre escutar desaforos de sua nora Gwen (Gwendoline Christie) e as reclamações de seu chefe no banco, solitária ela tenta encontros, mas sempre insatisfatórios, tudo começa a mudar quando entra numa loja de departamentos e com a ajuda de uma estranha vendedora compra um vestido para se sentir melhor e chamar a atenção, esse vestido de tamanho 36 se adapta ao corpo de quem o veste e encantada e seduzida pelas palavras da vendedora termina levando. Neste ponto é fácil perceber uma crítica ao consumismo que se aproveita das frustrações das pessoas para vender, se falta em Sheila um apelo sexual um vestido ousado seria a solução, mas essa satisfação inclui consequências estranhas advindas de uma maldição, o ritual, um jogo erótico excêntrico e obscuro que os funcionários da loja fazem incluindo manequins com as partes íntimas aparentemente reais são os momentos mais intrigantes, a vendedora Miss Luckmoore vivida por Fatma Mohamed hipnotiza com seu estilo gótico e diálogos e ações enigmáticas. Depois que Sheila usa o vestido a maldição começa a se manifestar, enquanto dormem ele se arrasta pela casa e acaba criando situações de perigo, a imagem dele flutuando em cima de Sheila enquanto dorme realmente causa um desconforto, pois a atmosfera surreal se parece muito com um pesadelo, não há lógica, mas todos os sentidos estão alertas.

O desenvolvimento prende a atenção, se faz interessante e sinistro com suas cores vibrantes e estilo retrô, realmente parece um filme dos anos 70, o único ponto a se questionar é quando a trama envolvendo Sheila termina de forma rápida e logo somos jogados na vida de Reg (Leo Bill), especialista no reparo de máquinas de lavar roupas e que acaba usando o vestido em sua despedida de solteiro e depois o leva para casa e sua noiva o usa também, ou seja, a maldição joga tanto com um tanto com o outro.

"In Fabric" é um exemplar de horror peculiar que não possui uma lógica clara, as situações funcionam como numa estrutura de sonho/pesadelo, gera uma sensação particular a cada espectador e justamente por essa liberdade e originalidade merece a nossa atenção, certamente uma obra que já nasceu cult, o clima criado é fascinante!

sexta-feira, 20 de setembro de 2019

23 Filmes de Júri/Tribunal (23 Jury/Court Movies)

Segue uma lista de filmes que se passam em tribunal de júri ou que em determinado momento pendem para esse tema, são histórias interessantes e que agregam bastante para quem curte o gênero. Confira:

"A Condenação" (Conviction - 2010) EUA
Betty Anne (Hilary Swank) e Kenny (Sam Rockwell) são irmãos muito unidos desde a infância. Já adultos, Kenny passa a ser perseguido pela polícia local por já ter ficha suja. Desta forma sempre que há algum crime acontecendo na cidade ele é detido para averiguações, mesmo que não haja o menor indício de sua participação. A situação se complica quando ele é preso ao ser acusado de ter cometido o assassinato de uma jovem. O caso vai a tribunal e, com vários depoimentos contra si, Kenny é condenado à prisão perpétua. Betty Anne sempre acreditou em sua inocência e jamais se conformou com a sentença, buscando meios de recorrer. Sem dinheiro para pagar um advogado de renome, ela decide voltar a estudar para se formar em Direito. O projeto leva anos até ser concluído, de forma que possa assumir ela mesma a defesa do irmão em uma tentativa de recorrer da pena.

 "A Qualquer Preço" (A Civil Action - 1998) EUA
Jan Schlittman (John Travolta) é um advogado que, junto com seus sócios, não procura vencer causas mas sim entrar em lucrativos acordos financeiros. Mas tudo muda quando ele concorda em representar oito famílias cujas crianças morreram em virtude de duas empresas terem despejado produtos tóxicos na água que abastece Woburn, Massachusetts. O caso se prolonga, fazendo a firma ficar em sérias dificuldades financeiras, tanto que os sócios de Schlittman o abandonam enquanto ele marcha para o suicídio financeiro e profissional.

 "A Firma" (The Firm - 1993) EUA
Mitch McDeere (Tom Cruise) é um jovem advogado que vai trabalhar com um alto salário e diversas vantagens em uma firma em Memphis. Porém, logo descobre que a empresa onde trabalha está envolvida com lavagem de dinheiro da Máfia e que todos os advogados que saíram ou tentaram sair da firma morreram precocemente, de forma misteriosa. O filme questiona o código de ética, que mantêm em sigilo da relação do advogado com o cliente, que proíbe por toda a vida que um crime cometido por um cliente seja revelado por seu advogado.

 "Em Nome do Pai" (In The Name Of The Father - 1993) Irlanda
Na década de 70, um atentado do IRA mata cinco pessoas num pub de Guildford, cidade próxima à Londres. Gerry Conlon (Daniel Day-Lewis) é um jovem rebelde irlandês que acaba sendo injustamente acusado pelo crime, e pega prisão perpétua junto com outros três amigos. Giuseppe Conlon (Pete Postlethwaite), seu pai, tenta ajudá-lo, mas é condenado também. Enquanto Gerry tem que desenterrar suas forças mais profundas para lidar com a injustiça de estar preso, ele consegue a ajuda da advogada Gareth Peirce (Emma Thompson), que passa a investigar as irregularidades do caso.

 "Advogado do Diabo" (The Devil's Advocate - 1997) EUA
Kevin Lomax (Keanu Reeves) é um homem de sucesso dentro e fora do tribunal. Um jovem advogado de defesa que nunca perdeu uma causa, por pior que seja o crime cometido por seus clientes. John Milton (Al Pacino) é o misterioso e brilhante presidente de uma poderosa firma de advocacia com interesses e clientes no mundo inteiro. O que há de comum entre esses dois homens? Uma tentadora oferta de trabalho, a chance de alcançar o sucesso de uma vez por todas e um segredo que irá transformar a vida de Kevin em uma viagem ao inferno.

 "O Júri" (Runaway Jury - 2003) EUA


Após considerar que uma grande empresa é a culpada pela morte de seu marido, uma viúva decide entrar com um processo na justiça, pedindo uma indenização milionária. Para defendê-la ela contrata o advogado Wendell Fohr (Dustin Hoffman). Porém Fohr precisará enfrentar Rankin Fitch (Gene Hackman), um especialista em selecionar os jurados de forma a garantir de antemão sua vitória no julgamento. Porém o que Fohr e Fitch não contavam é que um dos jurados, Nicholas Easter (John Cusack), tem seus planos para manipular o júri. E, com o apoio de Marlee (Rachel Weisz), passa a chantagear a dupla avisando que o veredicto desejado sairá bastante caro.

 "Sob Custódia" (Custody - 2016) EUA
Uma emblemática juíza do tribunal de família com um casamento atormentado. Uma recém-graduada em direito que resolve trabalhar em um caso de custódia. E uma mãe solteira, no centro da ação, que corre o risco de perder seus dois filhos. As vidas dessas três mulheres são inesperadamente mudadas quando se cruzam na corte da família em Nova York.

 "Um Ato de Esperança" (The Children Act - 2017) EUA
Fiona Maye (Emma Thompson) é uma eminente juíza da Alta Corte, que preside casos eticamente complexos do direito familiar. Com o serviço pesado, sua carga horária acaba exigindo um desgaste pessoal de Fiona. Em meio ao seu precário relacionamento com um professor (Stanley Tucci), ela precisa decidir sobre o caso de Adam (Fionn Whitehead), um garoto brilhante diagnosticado com câncer que se recusa em fazer a transfusão de sangue que salvará sua vida.

"Terra Fria" (North Country - 2005) EUA
Após um casamento fracassado, Josey Aimes (Charlize Theron) retorna à sua cidade natal, no Minnesota, em busca de emprego. Mãe solteira e com dois filhos para sustentar, ela é contratada pela principal fonte de empregos da região: as minas de ferro, que sustentam a cidade há gerações. O trabalho é duro mas o salário é bom, o que compensa o esforço. Aos poucos as amizades conquistadas no trabalho passam a fazer parte do dia-a-dia de Josey, aproximando famílias e vizinhos. Incentivada por Glory (Frances McDormand), uma das poucas mulheres da cidade que trabalha nas minas, Josey passa a trabalhar no grupo daqueles que penam para arrancar o minério das pedreiras. Ela está preparada para o trabalho duro e, às vezes, perigoso, mas o que não esperava era sofrer com o assédio dos seus colegas de trabalho. Como ao reclamar do tratamento recebido é ignorada, ela decide levar à justiça o caso.

"Suprema" (On The Basis Of Sex - 2018) EUA
Ruth Bader Ginsburg (Felicity Jones) se formou em direito nas instituições mais prestigiosas do país: Harvard e Columbia, sempre como primeira aluna de sua turma. Mesmo assim, ela enfrentou o machismo dos anos 1950 e 1960 quando tentou encontrar emprego, sendo recusada pelos principais escritórios de advocacia. Na função de professora, ela se especializou em direito relacionado ao gênero, decidindo atacar o Estado norte-americano para derrubar centenas de leis que permitem a discriminação às mulheres.

"O Terceiro Assassinato" (Sandome no Satsujin - 2017) Japão
O advogado Shigemori (Masaharu Fukuyama) é obrigado a pegar um caso de assassinato na defesa de Misumi (Koji Yakusho), que tem um registro criminal que aconteceu há 30 anos. Mesmo Misumi confessando a autoria do homicídio, enfrentando a sentença de morte, Shigemori tem dúvidas sobre a culpa dele no caso.

"Lemon Tree" (Etz Limon - 2008) Israel
Salma (Hiam Abbass), uma viúva Palestina, vê sua plantação ser ameaçada quando seu novo vizinho, o Ministro de Defesa de Israel (Doron Tavory), se muda para a casa ao lado. A Força de Segurança Israelense logo declara que os limoeiros de Salma colocam em risco a segurança do ministro e por isso precisam ser derrubados. Salma leva o caso à Suprema Corte de Israel para tentar salvar a plantação. Saiba+

"Você Desapareceu" (Du Forsvinder - 2017) Dinamarca
Professora, Mia (Trine Dyrholm) é casada com Frederik (Nikolaj Lie Kaas), um diretor bem-sucedido que é pego roubando da sua própria escola. Na dúvida se o marido fez isso por vontade própria ou devido ao tumor que cresce no cérebro dele, ela está desesperada para solucionar o caso e descobrir com que tipo de homem está casada. Enquanto pagava um advogado para defendê-lo, ela é forçada a se deparar com estudos de neurociência para repensar quem é Frederik. Saiba+

"O Julgamento de Viviane Amsalem" (Gett - 2014) Alemanha/França/Israel
Em Israel, somente os rabinos tem o poder de firmar ou dissolver um casamento. Mas esta última opção só se concretizará se houver total consentimento do marido. Viviane Amsalem (Ronit Elkabetz) está pedindo um divórcio há três anos, mas seu marido, Elisha (Simon Abkarian), nega. A intransigência do marido e a determinação de Viviane em lutar por sua liberdade dão o contorno deste processo.

"Em Pedaços" (Aus Dem Nichts - 2017) Alemanha
Após cumprir pena por tráfico de drogas, o turco Nuri Sekerci (Numan Acar) leva uma vida amorosa e tranquila com a esposa Katja Sekerci (Diane Kruger) e o filho Rocco na Alemanha. Certo dia ele e o menino estão no escritório e morrem vítimas de uma explosão criminosa, tragédia que deixa Katja sem chão. Ela batalha na justiça pela punição dos culpados, um casal neonazista, e, insatisfeita com o desenrolar do caso, decide pela vingança com as próprias mãos. Saiba+

"Novo Julgamento" (Jaesim  - 2017) Coreia do Sul
Hyun-Woo é a unica testemunha no caso do assassinato do motorista de táxi, depois de ser falsamente acusado de assassinar o motorista por uma investigação criminal opressiva, ele passou 10 anos na cadeia. Joon-Young é um advogado que está ciente do caso de Hyun-Woo. Sua intuição diz que esse caso seria uma ótima oportunidade de avançar em sua carreira. Depois que Joon-Young conhece Hyun-Woo, ele torna-se impulsionado por um sentimento de justiça e Hyun-Woo ganha esperanças.

"Tribunal" (Court - 2014) Índia
O filme investiga o mundo da magistratura indiana. O cadáver de um homem que trabalha nos esgotos é encontrado em um bueiro de Mumbai. Um cantor folk é chamado para depor no tribunal por favorecimento ao suicídio. Ele é acusado de tocar uma música que levou o trabalhador a cometer o gesto de loucura. Como se desenvolve o processo e a vida pessoal dos advogados e do juiz envolvido é o que interessa ao olhar deste jovem diretor indiano. 

"O Advogado" (Byeon-ho-in - 2013) Coreia do Sul
Apenas com um diploma de ensino médio, o advogado Song Woo-suk ( Song Kang-ho) é uma espécie de peixe fora d’água na sociedade de Busan. Determinado em crescer economicamente de qualquer forma, ele aceita casos que os seus colegas rejeitam, e com sua perspicácia para os negócios e sede por dinheiro, constrói uma bem-sucedida carreira profissional ao se especializar na área de registro de imóveis e de tributos. Mas Song logo começa a questionar seus valores ao se envolver no caso de um grupo de estudantes detidos pela polícia sob a acusação de serem comunistas. Um deles é Park Jin-Woo (Yim Si-wan), filho de Choi Soon-ae (Kim Yung-ae), o dono de um restaurante que Woo-suk tem dividas pendentes. Quando Woo-Suk descobre que Jin-Woo foi torturado por interrogadores, ele decide pegar o caso.

"The Tokyo Trial" (Dong Jing Shen Pan - 2006) China
Baseado nos acontecimentos do Tribunal de Tóquio, que julgou os crimes de guerra cometidos pelo Japão durante a Segunda Guerra. Um juiz chinês é encarregado de julgar as arbitrariedades dos oficiais.

"A Corte" (L'hermine - 2015) França
Michel Racine (Fabrice Luchini) é um juiz rígido e impiedoso, conhecido pela atitude extremamente profissional nos tribunais. Isso muda quando a jurada de um de seus casos é Ditte Lorensen-Cotteret (Sidse Babett Knudsen), uma mulher por quem foi perdidamente apaixonado muitos anos atrás, mas que o abandonou.

"12 Homens e Uma Sentença" (12 Angry Men - 1957) EUA
O filme gira em torno de um julgamento, onde um jovem porto-riquenho é acusado de ter matado o próprio pai. Os 12 jurados se reúnem para decidir a sentença, com a orientação de que o réu deve ser considerado inocente até que se prove o contrário. Onze deles, cada um com sua razão, votam pela condenação. Henry Fonda faz o papel do único que acredita na inocência do garoto. Enquanto ele tenta convencer os outros a repensarem a sentença, o filme vai revelando sobre cada um dos jurados, mostrando as convicções pessoais que os levaram a considerar o garoto culpado e fazendo com que examinem seus próprios preconceitos. Saiba+

"12 Jurados e Uma Sentença" (12 - 2007) Rússia
Doze jurados reúnem-se para decidir o veredicto de um jovem checheno de 18 anos, acusado do assassinato de seu padrasto, um oficial do Exército Russo. O tribunal é improvisado no ginásio de esportes de uma velha escola, onde os jurados ficarão confinados por dias. Em nome de um veredicto justo, eles precisarão aprender a ouvir uns aos outros e a respeitar suas diferenças. Saiba+

"Eu Não Sou Madame Bovary" (Wo Bu Shi Pan Jin Lian - 2016) China

Uma mulher do interior considera que foi enganada pelo marido em um 'falso' divórcio combinado pelos dois. Ela então, decide se mudar para poder se defender em um tribunal superior, saindo de sua pequena cidade rumo à capital Pequim. Os anos passam e, ela continua a processar o Estado por não reconhecer suas demandas. Ela aborda juízes nas ruas, lança-se na frente de seus carros e até mesmo procura cúmplices para ajudá-la a matar todos eles.

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

O Bar Luva Dourada (Der Goldene Handschuh)

"O Bar Luva Dourada" (2019) dirigido por Fatih Akin (Atravessando a Ponte: O Som de Istambul - 2005, Em Pedaços - 2017) baseia-se na história real do serial killer alemão Fritz Honka que escolhia suas vítimas em um bar e as matava brutalmente em seu apartamento, sua feição asquerosa juntamente com seu estilo de vida degradante surte um efeito repulsivo no espectador e consegue emanar com potência seu cheiro putrefato.
A trama se passa em Hamburgo, 1970. Fritz Honka (Jonas Dassler) é um homem fracassado com o rosto deformado, que vagueia pelas noites de um bairro boêmio ao redor de outras almas perdidas. Ninguém desconfia que, na verdade, Fritz é um serial killer. Ele persegue mulheres mais velhas e solitárias que conhece no Luva Dourada, seu bar favorito, e as esquarteja em seu apartamento. Quando os jornais começam a noticiar o desaparecimento sucessivo de várias mulheres, o medo e o caos se instalam na cidade. 
Acompanhamos a rotina de Fritz, que se resume em trabalhar e gastar seu dinheiro em bebida no bar Luva Dourada, um local cujos frequentadores são em sua maioria velhos briguentos e prostitutas idosas, o dono do bar faz questão de tampar as janelas para que os fregueses não enxerguem a luz do sol para não irem embora e encherem a cara de Schnapps, uma espécie de água ardente, todos possuem apelidos curiosos e é nesse ambiente que Fritz escolhe suas vítimas, sempre prostitutas velhas que não titubeiam em aceitar bebidas, algumas recusam por não suportar olhar no rosto de Fritz, mas a maioria por estarem em estados lamentáveis aceitam e acabam parando em seu apartamento, Honka é extremamente violento e possui uma raiva especial para com as mulheres, a brutalidade é exposta principalmente através dos barulhos, a respiração e os sons que produz são horrorosos, todo o processo em separar as partes do corpo e depois locomovê-los, a sujeira faz parte desse cenário e não nos poupa em nada, o fedor atravessa a tela. Fritz se desfaz de algumas partes, mas guarda em seu apartamento outras e isso faz com que o lugar já sujo se torne repulsivo, todos que entram reclamam do fedor, ele responde que o cheiro é da sopa que os gregos cozinham no andar de baixo, e como sempre a maioria das mulheres estão em níveis de embriaguez extrema não se importam, aliás a bebida é um gatilho para Honka, há um momento que ele decide parar e iniciar um novo trabalho, existe um controle por estar consciente, mas logo isso se quebra e sua misoginia novamente grita. O filme não faz questão de explicar ou de dar detalhes sobre a vida anterior ou as causas de sua personalidade violenta, as curiosidades também foram deixadas de lado e a história se preocupa em colocar em cena de forma perturbadora a degradação do ser humano.

É incrível a ambientação e todo o design de produção, seja no pequeno apartamento atulhado de sujeira com fotos de mulheres nuas grudadas na parede, restos de comida, bitucas de cigarro e garrafas e mais garrafas de bebidas, ou o bar que assim como seus fregueses se encontram numa situação deplorável, o asco permeia desde as mais pequenas situações, a violência é chocante e incômoda, mas sem dúvidas o que mais promove os sentimentos de repulsa é sua estética, o retrato da degradação dos personagens, a parte em que Fritz vomita ao abrir o local onde amontoa os pedaços dos corpos causa ânsia, a podridão ultrapassa a tela.

Obviamente o trabalho de maquiagem feito no ator Jonas Dassler de apenas 23 anos é primoroso, e sua performance ganha todos os méritos possíveis, desde seu modo de andar ao seu sorriso deforme, todos os outros impressionam também, estão sempre com fraturas e feridas, dentes saltando pela boca, pele gordurosa e alterados pela bebida.
"O Bar Luva Dourada" perturba pela estética e pela forma que filma as ações, a degradação humana nesse longa é brutal, deplorável e, principalmente, fétida.

sábado, 7 de setembro de 2019

Em Pedaços/In the Fade (Aus dem Nichts)

"Em Pedaços" (2017) dirigido por Fatih Akin (The Cut - 2014) é um drama pesado e triste que retrata o preconceito, a violência e a injustiça, forte e intenso somos absorvidos em uma trama que mergulha na dor da perda e no processo de transformação da protagonista.
Após cumprir pena por tráfico de drogas, o turco Nuri Sekerci (Numan Acar) leva uma vida amorosa e tranquila com a esposa Katja Sekerci (Diane Kruger) e o filho Rocco de 6 anos na Alemanha. Certo dia ele e o menino estão no escritório e morrem vítimas de uma explosão criminosa, tragédia que deixa Katja sem chão. Ela batalha na justiça pela punição dos culpados, um casal neonazista, e, insatisfeita com o desenrolar do caso, decide pela vingança com as próprias mãos.
A história se desenrola de maneira muito sensível apesar de seu peso e tensão, certamente Diane Kruger é o grande ponto a se destacar, uma verdadeira tour de force, sua entrega é intensa e seu sofrimento transpõe a tela. Seu mundo se transforma quando perde o marido e o filho por um ato terrorista, em um minuto estava contente ao lado de seus amores e no minuto seguinte está desolada e perdida com a notícia da morte deles. Acompanhamos de perto a sua lenta e dolorosa transformação, ela passa por todas as fases do luto e ao mesmo tempo precisa ter força para ir as audiências.
No começo há dúvidas sobre quem teria colocado a bomba e os motivos, pois Nuri já tinha sido preso, tudo parece ir contra e todos a sua volta começam a produzir dúvidas sobre o caráter de seu marido, Katja então coloca a mãe e os sogros para fora de sua casa e agradece a amiga pelo apoio, ela deseja ficar sozinha com sua dor, são momentos difíceis e as certezas vão se escoando até que o advogado e também grande amigo lhe dá a notícia de que encontraram os autores da explosão e que ela estava correta ao afirmar que eram neonazistas. Agora seu objetivo e motivação é vê-los na cadeia e para isso seu advogado fará o melhor, é bastante óbvio a culpa do casal, porém existem álibis plantados e brechas que gerarão dúvidas, se trata de uma rede de neonazistas, mas a lei é deveras complexa e Katja vai ao chão com a decisão do juiz.

A história seca e incômoda revela muito da atualidade, mas em momento algum discorre sobre política e se aprofunda nas questões, mas vemos que a intolerância e o ódio são construídos em formas circulares e por isso nunca terminará e a injustiça permanecerá; o desespero de Katja se acelera a cada nova audiência, esses instantes possuem diálogos potentes, principalmente, quando o pai do acusado depõe. A sensação de falta de ar é constante, permanecer junto da protagonista produz sentimentos de tristeza, raiva e angústia, e a sua vingança ao final destrói.

"Em Pedaços" é um filme que nos absorve por completo, coloca em cena a injustiça de atos de terrorismo por xenofobia, a violência perpetrada por ideologias extremamente conservadoras e ignorantes, reflete a dor e as fases do luto de maneira orgânica, forte e sensível, e ainda possui uma atuação grandiosa de Diane Kruger, impossível sair ileso. 

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Gwen

"Gwen" (2018) roteirizado e dirigido por William McGregor é um drama melancólico aterrador ambientado no País de Gales, primoroso em sua atmosfera somos inseridos no século XIX e pela perspectiva da protagonista adentramos em um mundo dominado por homens gananciosos e inescrupulosos, a sobrevivência de uma família em que as mulheres estão por si só, pois o marido está longe por causa da guerra e, talvez, esteja morto, então os especuladores estrategicamente lançam histórias sobre elas com intenção de obterem o território.
Nas montanhas da Snowdonia do século XIX, Gwen (Eleanor Worthington-Cox) vive em uma fazenda com sua mãe e sua irmã mais nova. Com seu pai fora na guerra, sua mãe repentinamente caindo doente e a fazenda sofrendo com estranhas ocorrências, Gwen tem que lidar com a dificuldade de manter seu lar funcionando enquanto uma profunda escuridão parece rondar sua família.
Escura, lamacenta e desesperançosa é a encosta em que vive Elen (Maxine Peake) e suas duas filhas, a adolescente Gwen, que possui uma relação de amor e ódio com ela e a caçula Mari (Jodie Innes), quando surge um surto de cólera na vizinhança e as batatas começam apodrecer a situação delas fica insustentável, na miséria e com Elen adoecendo cada vez mais Gwen precisa tomar as rédeas e amadurecer rapidamente, elas perdem o meio de sustento, os animais amanhecem mortos e os poucos legumes que possuem tentam vendê-los, mas as pessoas não querem nada vindo de lá, pois o padre lança boatos, parece não haver chances de se livrar dessa maldição e a terra que parece não oferecer nada é ambicionada por esses homens que tentarão de tudo para consegui-la. 
O filme possui bastante sutileza e é minucioso, são pequenas atitudes e diálogos pontuais que exemplificam a maldade em torno delas, a tristeza de Gwen aumenta a cada novo entendimento de como esse mundo em que vive funciona. O terror não é caracterizado pelo medo de fantasmas e do sobrenatural que muitas vezes Gwen sente, na verdade, está contido em coisas reais, como na atmosfera desoladora e a sensação do vento cortando, a religião que prega visões distorcidas de bem e mal e o pensamento patriarcal e machista que domina e destrói. Os elementos são utilizados com destreza e gera sensação de angústia, a injustiça cometida contra elas penetra.

A atmosfera ameaçadora e pesada joga com a ambiguidade cruel, nada é revelado totalmente e a tristeza e a sensação de alucinação permeia por todo o desenrolar. Essas características remetem muito ao filme "A Bruxa" - 2015, e também ao "Hagazussa" - 2017, onde a narrativa prima por um mistério que provoca e assombra nas entrelinhas.

"Gwen" é um ótimo exemplar de horror que retrata com maestria a opressão e a perseguição às mulheres por parte de religiosos, o terror está no drama real, no silêncio da escuridão que evoca uma tristeza poética.